quarta-feira, 3 de março de 2010

Racismo e Sexismo + Faro Político: uma combinação de sucesso!

Quando os observadores norte-americanos observaram a campanha pré-eleitoral de Hillary Clinton e Barack Obama, algo lhes parecia óbvio: ambos partilhavam o palco político com dificuldades muito semelhantes, um, vítima de sexismo e outro de racismo. Uma aliada de Hillary, a ex-candidata a vice-presidente Geraldine Ferraro, disse: "Se Obama fosse um homem branco, não estaria onde está actualmente (...) e se fosse uma mulher, independentemente da sua raça, não estaria onde está. Tem muita sorte de ser quem é". Ao justificar os comentários, Ferraro acusou Obama de "jogar a carta do racismo" e de a sua equipa ter deliberadamente criado a polémica. Antes de cortar relações com Geraldine Ferraro, que integrava a equipa responsável pelas finanças de Hillary, assessores da ex-primeira-dama recordaram comentários sexistas de certos aliados de Obama. O general Merrill McPeak, um militar da reserva que se comprometeu com a campanha de Obama, justificou a sua escolha afirmando que o seu candidato não tinha por hábito "ir à televisão e romper em lágrimas", referindo-se ao facto de Hillary tentar esconder o choro na véspera da sua vitória nas primárias de New Hampshire. Alguns analistas, como a escritora "pós-feminista" Camille Paglia, criticaram o facto de Hillary se fazer de vítima. "Hillary perde jogando, mas os seus assessores descobriram que muitas mulheres pareciam receptivas", lamentou Paglia na revista US. Já Ferraro afirma que Obama conseguiu muitas das suas vitórias eleitorais no sul do país graças ao voto negro, como no Mississippi, onde recebeu 91% dos votos dos negros e apenas 30% dos votos dos brancos. Outros destacam que as origens mestiças de Obama são um elemento essencial do seu apelo, assim como a possibilidade de se tornar o primeiro presidente negro dos Estados Unidos. O académico Ron Walter ressaltou que Obama se esforçou até agora para "levar por diante uma campanha neutra do ponto de vista da raça" e foi isto que permitiu as suas vitórias em estados que não possuem grande população negra, como o Iowa. Bruce Ranson, da Universidade Clemson na Carolina do Sul, afirma que, dando espaço para polémicas sobre o racismo, a campanha de Hillary comporta-se como se desejasse "colocar Obama na categoria de candidato negro, com a meta de restringir o poder de sedução que ele pode ter além do eleitorado negro". Obama distanciou-se do discurso de um pastor da sua igreja, que afirmou que os negros deveriam dizer "Deus condene os Estados Unidos" pelo tratamento dado aos afro-descendentes. O líder da maioria democrata na Câmara de Representantes, Steny Hoyer, tentou acalmar o ambiente. "Temos dois candidatos que representam segmentos essenciais do campo democrata e quando se atacam um ao outro é sentido de modo mais pessoal", explicou ao Washington Post.

Em Set/2008, a gaffe do momento na campanha das renhidas primárias do Partido Democrata para a nomeação à Casa Branca partiu de uma colaboradora de Barack Obama que chamou “monstro” a Hillary Clinton. “Ela agarra-se a tudo para conseguir votos. É um monstro. Olha-se para ela e pensa-se: ‘Ergh’”, disse Samantha Power, pensando que o comentário não estava a ser gravado. Enganou-se e foi mesmo publicado. Obama ficou furioso e foi firme quando disse que não admitia deslizes verbais do género em relação a Hillary ou seja a quem fosse. “O senador Obama condena vivamente este tipo de caracterizações pessoais”, referiu Bill Burton, porta-voz do pré-candidato democrata.

Em Dez/08, Barack Obama confirmou oficialmente o nome de Hillary Clinton como a nova secretária de Estado. Quase um ano depois de Obama ter chegado à Casa Branca, muito foi escrito sobre a forma como o primeiro negro chegou à Casa Branca. Mas a CBS contou mais uma história de campanha, no 60 Minutes, em que revelou como Hillary Clinton quase recusou a proposta para ser secretária de Estado do antigo adversário nas primárias democratas. "Há um problema, o meu marido", terá exclamado a ex-primeira dama quando Obama a convidou para chefiar a diplomacia. E acrescentou: "Já viste como ele é, se eu aceitar este trabalho isto vai ser um circo". Durante a campanha para as presidenciais, Bill Clinton foi uma figura muito activa nos comícios da mulher. Mas os analistas acabaram convencidos que as suas intervenções - numa das quais afirmou que a candidatura de Obama era um "conto de fadas" sem hipóteses de vencer - tiveram um efeito negativo. Confrontado com a resposta de Hillary, Obama não desistiu. E explicou-lhe: "Tendo em conta a crise financeira e tudo o que tenho para resolver, preciso de ti".

A demonstrar o inequívoco faro político para captar cumplicidades de adversários que lhe podiam ser fatais, Obama chamou para o seu lado a rival, conseguindo, de uma só vez, levar a luta do anti-racismo e do anti-sexismo ao pódio da Casa Branca, inteligência política confirmada pelas sondagem da Gallup, segundo a qual, 62% dos americanos têm uma opinião favorável da secretária de Estado norte-americana - mais 6% pontos do que as opiniões positivas sobre o próprio Presidente Obama, a atravessar uma quebra de popularidade. Em Janeiro, mês em que tomou posse, o inquilino da Casa Branca registava 78% de opiniões favoráveis. De então para cá, caiu 22 pontos. No mesmo período, a popularidade de Hillary só baixou três. Racismo e sexismo por terra e faro político (qual Santo Humberto - o cão com o melhor faro do mundo!), uma combinação fatal para o sucesso de uma dupla que deixará marcas na política dos USA.