sexta-feira, 5 de março de 2010

Sentenças criativas/Sentenças cinzentas


Mais uma curiosidade jurídica. no blog brasileiro Lei e Ordem, em "Sentenças Inacreditáveis".
Fornecimento de um televisor com defeito.
"Tão logo (que se descobriu o defeito) foi este fornecedor notificado do defeito, deveria o mesmo ter (...) solucionado o problema do consumidor. Registe-se que se discute no caso concreto a evolução do vício para fato do produto fornecido pelos réus. No mérito, por omissão da atividade instrutória dos fornecedores, não foi produzida nenhuma prova em sentido contrário ao alegado pelo autor-consumidor. Na vida moderna, não há como negar que um aparelho televisor, presente na quase totalidade dos lares, é considerado bem essencial. Sem ele, como o autor poderia assistir as gostosas do Big Brother, ou o Jornal Nacional, ou um jogo do Americano x Macaé, ou principalmente jogo do Flamengo, do qual o autor se declarou torcedor? Se o autor fosse torcedor do Fluminense ou do Vasco, não haveria a necessidade de haver televisor, já que para sofrer não se precisa de televisão. Este Juizado, com endosso do Conselho, tem entendido que, excedido prazo razoável para a entrega de produto adquirido no mercado de consumo, há lesão de sentimento. Considerando a extensão da lesão, a situação pessoal das partes neste conflito, a pujança econômica do réu, o cuidado de se afastar o enriquecimento sem causa e a decisão judicial que em nada repercute na esfera jurídica da entidade agressora, justo e lícito parece que os danos morais sejam compensados com a quantia de R$ 6.000,00. Posto isto, na forma do art. 269, I, Julgo parcialmente procedente o pedido, resolvendo seu mérito, para condenar a empresa ré a pagar ao autor, pelos danos morais experimentados, a quantia de R$ 6.000,00 (seis mil reais), monetariamente corrigida a partir da publicação deste julgado e com juros moratórios a contar da data do evento danoso, tendo em vista a natureza absoluta do ilícito civil.”
Furto de duas melancias.
‘Trata-se de auto de prisão em flagrante de Saul Rodrigues Rocha e Hagamenon Rodrigues Rocha, que foram detidos em virtude do suposto roubo de duas (2) melancias. Instado a se manifestar, o Sr. Promotor de Justiça opinou pela manutenção dos indiciados na prisão. Para conceder a liberdade aos indiciados, eu poderia invocar inúmeros fundamentos: os ensinamentos de Jesus Cristo, Buda e Gandhi, o Direito Natural, o princípio da insignificância ou bagatela, o princípio da intervenção mínima, os princípios do chamado Direito Alternativo, o furto famélico, a injustiça da prisão de um lavrador e de um auxiliar de serviços gerais em contraposição à liberdade dos engravatados e dos políticos do mensalão deste governo, que sonegam milhões dos cofres públicos, o risco de se colocar os indiciados na Universidade do Crime (o sistema penitenciário nacional)… Poderia sustentar que duas melancias não enriquecem nem empobrecem ninguém. Poderia aproveitar para fazer um discurso contra a situação econômica brasileira, que mantém 95% da população sobrevivendo com o mínimo necessário, apesar da promessa deste Presidente que muito fala, nada sabe e pouco faz. Poderia brandir minha ira contra os neo-liberais, o consenso de Washington, a cartilha demagógica da esquerda, a utopia do socialismo, a colonização européia… Poderia dizer que George Bush joga bilhões de dólares em bombas na cabeça dos iraquianos, enquanto bilhões de seres humanos passam fome pela Terra… E aí? Cadê a Justiça nesse mundo? Poderia mesmo admitir minha mediocridade por não saber argumentar diante de tamanha obviedade.Tantas são as possibilidades que ousarei agir em total desprezo às normas técnicas. Não vou apontar nenhum desses fundamentos como razão de decidir… Simplesmente mandarei soltar os indiciados … quem quiser que escolha o motivo!"
Filosofia.
Nietzsche serviu de inspiração à sentença exarada pelo juiz Fausto De Sanctis no caso do banqueiro Daniel Dantas, que citou o folósofo "Sem hesitar, acredita no dinheiro, não como instrumento legítimo para a circulação de bens, mas como algo determinante para suas ações ou omissões, bem como de todas as pessoas que passam pelo seu caminho. Inverte, pois, a máxima: o instrumento passa a ser ente e o ente instrumento. Nítida a contradição entre o que faz e diz acreditar. Parafraseando Friederich Nietzche, tornou-se aquilo que verdadeiramente é. Revela-se pois de personalidade desajustada”. O texto integra a sentença de 312 páginas com a qual o dito condenou banqueiro a 10 anos de prisão por corrupção ativa e a pagamento de R$ 12 milhões em multas, por tentar subornar com US$ 1 milhão um delegado da Polícia Federal (PF) com o intuito de barrar a Operação Satiagraha, da PF, que chegou a prendê-los duas vezes.
Criatividade na aplicação do Direito, porque o cinzentismo (que tanto se propaga como apanágio essencial na personalidade do juiz) nem sempre equivale à bondade da sentença!