terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Uma nova perspectiva da violência doméstica - o relatório do Projecto Rebeca!


A Associação Portuguesa de Mulheres Juristas, no âmbito do "Projecto Rebeca", analisou a tramitação de 30 processos-crime em que foram ofendidas mulheres acolhidas em casas abrigo para vítimas de violência doméstica.
Muito embora se reconheça que os dados recolhidos não reúnem os requisitos suficientes para uma análise estatística, por a amostra ser demasiado pequena, estes tornam possível a identificação de algumas "tendências" e podem servir de guia ou de um manual de boas práticas, para ser usado por quem leva esta questão a peito - que devemos ser todos.
A relação entre paredes, num casal, quando atinge níveis de desajustamento e toca a agressividade verbal ou física é uma questão social e não, como infelizmente se entendeu demasiado tempo, uma questão do foro intímo do casal.
Aqui se deixam alguns apontamentos a propósito retirados das conclusões do relatório apresentado em Outubro/09 e que só agora se analisou aprofundadamente.
1º Caracterização da ofendida e do arguido: As vítimas são mulheres (à excepção de um caso em que houve concomitante denúncia), cujas idades variam entre os 22 e os 48 anos, com nacionalidade portuguesa (tirando 2 casos). Os agressores têm entre 24 e 51 anos e são todos portugueses. Na sua maior parte são casados entre si (14 casos) e noutros vivem em união de facto. Em todos os casos há filhos em comum (apenas num caso os filhos eram maiores). Em 10 casos há apenas 1 filho e em 2 casos as vítimas encontravam-se grávidas de um 2º filho quando foram acolhidas em casa abrigo. A esmagadora maioria tem profissões não qualificadas: trabalham na construção civil (eles) e em serviços domésticos (elas). Em apenas 3 casos a vítima tinha outra profissão: uma cozinheira, uma operária fabril e uma vendedora numa loja. Quanto aos agressores, em apenas 6 casos a profissão era outra: motorista, jardineiro, serralheiro, metalúrgico, militar e técnico de informática.
2º Tempo de Inquérito: quase sempre excede os 10 meses. Em 8 dos processos foi superior a 14 meses e em apenas 1 foi de 4 meses. O que significa, em muitos casos, novas agressões ou tentativas de agressão no decurso desse tempo (a partir do momento em que o agressor sabe que a vítima reagiu e ocorreu denúncia dos factos, as agressões tornam-se mais violentas, o ciclo da violência fecha-se mais e é nessa altura que a vítima corre maior risco de vida). Mesmo afastada do agressor, acolhida em casa abrigo, as tentativas de contacto, ameaças, injúrias e perseguições persistem. A Lei n.º 112/2009 de 16 de Setembro trouxe algumas inovações quanto aos processos por crime de violência doméstica, que passam agora a ter natureza urgente – cfr. artigos 28º e n.º 2 do 103º nº 2 do CPC.
3º Em nenhum dos processos analisados foi utilizada, na fase do inquérito, a possibilidade de tomar declarações para memória futura (artigo 271º do CPP, também aplicável às testemunhas especialmente vulneráveis por força do disposto no artigo 28º da Lei de Protecção de Testemunha - Lei n.º 93/99). Nalguns casos, a gravação foi fundamental para a condenação, reafirmando o seu papel de instrumento de preservação da prova, sobretudo para evitar a vitimização secundária das testemunhas.
4º Não se recorreu à Lei de Protecção de Testemunhas, constatando-se que, nalguns casos, a perseguição a testemunhas familiares da vítima deu azo a processos judiciais autónomos destas contra o agressor. Também aqui a Lei n.º112/20 09 estabelece um direito de protecção (artigo 20º) - já constante da Lei de Protecção de testemunhas.
5º Meios de prova utilizados: em todos os casos houve perícias médico-legais e em todos os casos foram ouvidas testemunhas. A ofendida foi ouvida em sede de inquérito pelo menos 1 vez, sendo que em 3 casos foi ouvida 2 vezes e em 5 casos foi mais de 3 vezes. E o arguido apenas não foi ouvido num caso, por se encontrar desaparecido. Os arguidos ouvidos nunca confessam a prática de qualquer facto que os possa incriminar na prática do crime de violência doméstica e negam aquilo que as ofendidas denunciaram. As testemunhas apresentadas são os filhos (quase sempre menores) ou outros familiares próximos e, nalguns casos vizinhos, colegas de trabalho ou patrões. Quanto a outras provas, realça-se o envio de relatórios sociais da vítima pela casa abrigo que a acolheu em 3 casos. Num caso a requerimento do Ministério Público, nos outros 2 espontaneamente enviado pela equipa técnica da casa abrigo.
6º Ficha de Avaliação de Risco - nem sempre é preenchida pelas autoridades policiais e o relatório apenas foi utilizado em 3 casos, sendo que num deles foi requerido pelo Ministério Público e elaborado pelo respectivo órgão de polícia criminal depois da denúncia (servindo o relatório de suporte para a aplicação da medida de coacção de afastamento), mas as forças policiais, em todos os processos, encaminharam as vítimas para a linha 144, ou qualquer outro apoio disponível.
7º Auto de denúncia padrão: foi o utilizado em quase todos os casos. A incriminação legal feita pelas forças policiais é sempre de Violência Doméstica/ Maus tratos, quando aplica o auto de denúncia padrão. Nos 3 únicos casos em que não foi utilizado o auto de denúncia padrão a incriminação foi, ainda assim, a de maus tratos.
8º Em 5 dos casos analisados havia denúncias/ inquéritos anteriores já arquivados. Em todos, a causa de arquivamento foi a desistência de queixa - o que se afigura um paradoxo, face à natureza pública do crime de maus tratos/ crime de violência doméstica, nas sucessivas redacções do art. 152º do Código Penal dos últimos anos. A explicação será talvez a de seguir a vontade manifestada pela vítima. Para arquivar os Autos por desistência de queixa, o Ministério Público qualifica o/os factos como factos isolados não subsumíveis ao tipo legal “maus tratos” ou “violência doméstica” e antes subsumindo-os a tipos legais que sendo considerados crimes semi-públicos ou particulares admitem a desistência. o que apenas se compreende pelo facto de a falta de vontade da vítima em avançar com o processo levar a que não seja carreada prova para os autos. Mas já não se compreende porque nestes casos não se aplica antes a suspensão provisória do processo, com aplicação de injunções, ou não se averigua a causa da vontade de desistir. Muitas vezes é por medo, pelas ameaças recebidas, por continuar a existir um convívio “forçado” entre vítima e agressor.
9º Promoção e aplicação de medidas de coacção - A única medida aplicada na fase de Inquérito na maioria dos casos (13) foi o Termo de Identidade e Residência - obrigatório nos termos da Lei Processual Penal - artigo 196º do CPP, só num caso foi aplicada uma medida de apresentação periódica, e, nos restantes 6, uma medida de afastamento, com excepção de um único caso, a medida de coacção de afastamento só foi promovida aquando da dedução da acusação.
Na generalidade dos casos em que se aplicou uma medida de afastamento e de proibição de contacto (artigo 200º do CPP), esta foi imposta sem qualquer cominação para o seu não cumprimento, mas nunca se sugeriu que, sendo aquela medida de coacção uma ordem judicial, uma vez que não seja cumprida incorresse o arguido em crime de desobediência (o que, para além de o sujeitar ao agravamento da medida de coacção decorrente da Lei Processual Penal (artigo 203º do CPP), faria com que fosse julgado em processo sumário por crime de desobediência).
Num dos casos, a vítima foi, por várias vezes, perseguida durante o decurso do Inquérito, e teve de mudar de local de trabalho e de casa abrigo. Também aqui a nova Lei n.º 112/2009 de 16 de Setembro poderá trazer novas boas práticas até aqui não verificadas. Nos termos do art. 31º, o Tribunal deve ponderar a aplicação, após a constituição de arguido por crime de violência doméstica, de uma medida de coacção de entre as elencadas no próprio artigo 31º ou no CPP, no prazo máximo de 48 horas.
10º Da denúncia à constituição de arguido, passaram-se, em média, 90 dias. Uma correcta aplicação do artigo 31º da Lei n.º 112/2009 vai certamente resolver esta dificuldade encontrada na promoção de medidas de coacção antes da dedução da acusação.
11º Apoio judiciário: em apenas 2 dos casos não foi requerido pela vítima, que optou por não se constituir assistente. Nalguns processos, o requerimento de apoio judiciário ainda era feito ao abrigo da antiga lei de acesso ao direito e aos tribunais, tendo a mulher tido a possibilidade de escolher a sua/seu defensora/ defensor oficiosa/oficioso.
12º Intervenção das forças policiais: regista-se um bom trabalho na fase inicial do Inquérito, com a detenção em flagrante delito e fora de flagrante delito e com a possibilidade de a vítima poder regressar a casa na companhia da Polícia para recolher bens pessoais. Na maioria dos casos analisados, a vítima apresenta a denúncia nas instalações da força policial que está mais próxima de sua casa, poucas horas depois de ter sido, mais uma vez. agredida em sua casa.
A Lei n.º 112/ 2009 veio, no artigo 21º, legitimar aquilo que as autoridades policiais já faziam em relação a esta matéria: apreender esses objectos pessoais e devolvê-los à vítima.
Em nenhum dos casos houve detenção do arguido em flagrante delito. Também aqui a nova Lei n.º 112/2009, traz novidades. O art.º 30º permite que seja efectuada detenção fora de flagrante delito por crime de violência doméstica, através de mandado do Juiz ou do Ministério Público, se houver perigo de continuação de actividade criminosa ou se tal se mostrar imprescindível à protecção da vítima. E abre, ainda, a possibilidade de as próprias autoridades policiais ordenarem essa detenção fora de flagrante delito por iniciativa própria em determinados condicionalismos (n.º 3 do art. 30º).
13º Acusação: foi deduzida ou por crime de maus tratos/violência doméstica (15 casos), ou por homicídio na forma tentada (1 caso), ou por ofensas à integridade física simples (2 casos). Em 2 casos houve arquivamento dos Autos e não foi interposto recurso hierárquico. E, em nenhum dos casos analisados, houve recurso hierárquico da decisão de arquivamento quanto a outros crimes sobre os quais incidiu o inquérito (violação, tentativa de violação, num caso; maus tratos, num outro) ou quanto ao requerimento de abertura de instrução para acusação sobre esses crimes. Em apenas 2 casos foi requerida a abertura de Instrução, sendo que, num deles, foi requerida pelo arguido.
Apenas num caso, dos 20, foi deduzida acusação particular pelo crime de injúrias e, apenas em 5, a vítima deduziu pedido de indemnização civil pelos danos sofridos (danos patrimoniais e não patrimoniais) e, num caso, o pedido de indemnização civil foi requerido pela Segurança Social, para se ressarcir das despesas que teve de suportar com os dias de baixa por doença que a vítima teve de requerer.
O relatório completo consta do site http://www.apmj.pt/, que é um precioso "instrumento de trabalho" para os advogados e juristas que lidam com estas matérias. Finalmente, o direito penal olha para este tipo de crimes com olhos de ver, sem mergulhar a cabeça na areia. Espera-se, dos advogados e juizes, a sensibilidade para olhar para a frente e de frente para o problema. Dá-se aos agredidos uma réstea de esperança e de fé no sistema. E a questão é demasiado séria para os desapontar.

A procissão dos fariseus!



A propósito da "Face Oculta", fica o comunicado do PGR, a 15-Nov-2009.
Adaptado ao relevante.
"Na sequela da divulgação pela Comunicação Social de "notícias provenientes de várias fontes sobre as escutas ocorridas no processo conhecido como "Face Oculta" e tendo em conta a contínua violação do segredo de justiça e o alarme social que esta situação está a causar", entendeu o PGR que ficasse esclarecido o seguinte:
1º A 26 de Junho e 3 de Julho a PGR recebeu duas certidões remetidas pelo DIAP, de Aveiro, entregues pelo Procurador-Geral Distrital de Coimbra e extraídas do processo "Face Oculta", anexando 23 CD's, contendo escutas;
2º Em 6 das escutas transcritas intervinha o Primeiro-Ministro;
3º No despacho do Procurador Coordenador do DIAP de Aveiro e no despacho do Juiz de Instrução Criminal sustentava-se que existiam indícios da prática de um crime de atentado ao Estado de Direito;
4º Após cuidada análise das certidões, o PGR, a 23 de Julho, apesar de considerar que não existiam indícios probatórios que levassem à instauração de procedimento criminal, remeteu ao Presidente do Supremo Tribunal de Justiça as certidões em causa, suscitando a questão da validade dos actos processuais relativos à intercepção, gravação e transcrição das referidas seis conversações/comunicações em causa;
5º A 4 de Agosto foram entregues ao Presidente do STJ essas certidões e os CD's;
6º Por despacho de 3 de Setembro de 2009, o Presidente do STJ, no exercício de competência própria e exclusiva, julgou nulo o despacho do Juiz de Instrução Criminal que autorizou e validou a extracção de cópias das gravações relativas aos produtos em causa e não validou a gravação e transcrição de tais produtos, ordenando a destruição de todos os suportes a eles respeitantes;
7º A 24 de Julho, foram recebidas mais 2 certidões acompanhadas de 10 CD's, a 10 de Setembro mais 2 certidões acompanhadas de 5 CD's, a 9 de Outubro 1 certidão com 2 CD's e a 2 de Novembro outra certidão;
8º A 2 de Novembro foram recebidas mais 4 certidões, acompanhadas de 146 CD's;
9º Por despacho de 30 de Outubro, o PGR enviou ao Procurador-Geral Distrital de Coimbra um despacho em que:
a) Se solicitava a remessa de informações e elementos complementares em relação às certidões recebidas;
b) Se remetia certidão da decisão do Presidente do STJ, solicitando-se a promoção de diligências para o cumprimento do despacho por ele proferido;
10º Em 13 de Novembro, pelas 18h 30m, o Procurador-Geral Distrital de Coimbra entregou pessoalmente ao PGR os elementos solicitados;
11º Esses elementos complementares contêm relatórios de 146 conversações/comunicações, sendo que 5 respeitam ao Primeiro-Ministro;
12º Após análise global será, até ao fim da próxima semana, proferida uma decisão;
13º Saliente-se que, contrariamente ao que alguma comunicação social tem noticiado, seguiram-se todos os procedimentos normais, sem qualquer demora (como se vê das datas referidas), e que entre o PGR e o Presidente do STJ existiu completa concordância no que respeita ao caso concreto;
14º O PGR reafirma, tal como sempre o fez, que ninguém, designadamente políticos, poderá ser beneficiado em função do cargo que ocupa, como não poderá ser prejudicado em função desse mesmo cargo, devendo a lei ser aplicada de forma igual para todos."
O despacho vem de Lisboa, proferido a 14 de Novembro de 2009 e é assinado pelo Procurador-Geral da República, Fernando José Matos Pinto Monteiro.
Cabe agora perguntar: Ainda agora vai a procissão no adro ou já teve fim a procissão dos fariseus?

As elites (as supostas elites)!


O J.A.Saraiva teve um dos seus laivos de lucidez que adjudico desde já.
Pergunta ele: Onde estão as elites? Refere-se ele à elite política.
E parte de um princípio profundamente lógico.
Única questão.
Tendo em conta que a evolução e o desenvolvimento dos países depende da capacidade dos homens que os lideram, dos que se posicionam em situação de influência nos sectores vitais da sociedade.
E quando falamos em capacidade fala-se em gente capaz, séria, competente e empreendedora (não a gente que recorre à fraude, à corrupção, à usura para alcançar os objectivos!).
E aí vem, de novo, a pergunta: Onde estão as elites?
Isto porque é sabido que, em várias áreas-chave, estamos cheios de gente que, pura e simplesmente ... não presta.
Vejamos, acompanhando o J.A.Saraiva.
Quanto ao ensino. No tempo de Salazar (de que aliás a minha família não tem qualquer boa memória!) não havia universidades privadas (excepção para a Católica, fundada em 1968, com um estatuto (já então!) especial). Depois do 25 de Abril, uma das reivindicações dos liberais foi a criação de universidades privadas, que se multiplicaram numa quantidade reprodutiva apenas igualável aos ... coelhos: Lusíada, Independente, Lusófona, Internacional, Atlântica, Moderna... Anos volvidos, eis os escândalos, também multiplicados em ... cadeia (a Moderna, a Independente, a Internacional) e, aparentemente, a primazia de um ideal - o negócio (às vezes, o negócio fraudulento).
Na banca, uma história semelhante. Antes do 25 de Abril podiam fundar-se bancos privados "embora sob a vigilância próxima do Estado (e o olhar atento de Salazar)", o que não impediu "casos" como o da herança Sommer e os conflitos com Cupertino de Miranda. Passado o período revolucionário, a banca portuguesa adquiriu novo fôlego, com as reprivatizações dos bancos (BPA, Totta, Espírito Santo) e a criação de bancos novos (BCP, BPI e outros), as aquisições e fusões em série, e estalou o escândalo do BCP (de contornos mal definidos, uma zanga entre accionistas que destapou situações que, noutras circunstâncias, seriam inconsequentes), seguido do escândalo do BPN e a este o do BPP. Em suma, escândalos que cataduparam toda a área para a suspeita. (Como sucedeu nas universidades, em que só as públicas e a Católica não passaram a ser olhadas com desconfiança, na banca, só a Caixa Geral de Depósitos não foi afectada pela hecatombe!).
Veja-se por cúmulo o futebol, sempre uma área difusa, dominada por interesses privados, acompanhada de perto pelo anterior regime. O Benfica, com o evidente apoio estatal (Salazar não deixou Eusébio emigrar!), o Sporting integrava figuras gradas do regime (o Belenenses tinha Américo Thomaz como adepto e presidente honorário). O 25 de Abril até aqui mais uma revolução, ‘completada' mais tarde por Pinto da Costa, que transfere o centro de gravidade clubístico de Lisboa para o Porto. Tal como nas duas áreas anteriores, depois de o futebol ter sido entregue a si próprio logo se começou a falar de escândalos. Do Apito Dourado, até pesadelos "justiceiros" com árbitros, dirigentes e presidentes de Câmara (José Guímaro, Pimenta Machado, Valentim Loureiro, Fátima Felgueiras, José Eduardo Simões ...).
Três sectores que fugiram ao controlo/tutela do Estado, com a sociedade civil em livre trânsito, e o resultado à vista: o descalabro (corrupção, fraudes financeiras, gestão ruinosa, associações criminosas, fugas ao fisco ...).
E isto já diz muito (ou tudo!) sobra as nossas elites (ou a falta delas!).
Em duas áreas de referência social - a universidade e a banca - e na que desencadeia maiores paixões e arrasta multidões - o futebol -, os dirigentes (ou seja, as supostas elites) falharam rotundamente.
E é este o aspecto mais preocupante da sociedade portuguesa.
Os países podem ter melhores ou piores Governos, mas só podem desenvolver-se sobre a aurea das elites (das boas elites). E, por "elites" entendemos tãosomente "gente capaz, séria, competente e empreendedora".
Aqui está o grande problema: se os portugueses funcionam bem quando estão lá fora, por que não rendem o mesmo aqui? Porque não existem elites que estimulem os cidadãos e aproveitem as potencialidades do país. Mas, estou certa que existem pessoas capazes, sérias e empreendedoras, só que existe também muita gentinha com medo de as descobrir, de as chamar à chefia, à liderança, porque as pessoas capazes de criar e sedimentar essa elite são uma ameaça aos que pretendem fazer parte - e muitos fazem parte mesmo - de uma suposta elite, que nada vale, que nada vê, que nada melhora ou desenvolve. Limita-se simplesmente a empatar o crescimento dos que podem integrar uma nova elite, por sobrevivência, porque no dia em que essa tome a liderança deste país, não haverá mais espaço para a "elite" actual.
O que é bom para o país, mas muito mau para as "ditas" elites de hoje.

Presentes (envenenados) da Justiça!



A propósito das mais recentes críticas ao Governo por parte da dita "oposição", e fico-me pelo "dita", porque infelizmente nem reúne créditos para tal, vejamos mais um "incidente" da magistratura (ou será um "acidente"?!).
Parece que estão unânimes os magistrados em se congratular com a sentença de um tribunal de l.a instância de Ponta Delgada, de 3 de Abril do corrente ano e confirmada, há dias (interpretando-a estes como um presente de Natal!), pelo Tribunal da Relação de Lisboa.
Tudo por causa do artigo que o jornalista Estêvão Gago da Câmara escreveu na véspera das eleições legislativas em 2005, no jornal Açoriano Oriental, em que aquele afirma que o então candidato a deputado do PS, Ricardo Rodrigues, “esteve envolvido com um gang internacional na qualidade de advogado, sócio e procurador de uma sociedade off-shore registada algures num paraíso fiscal e de ter sido advogado e sócio de uma mulher que está foragida no estrangeiro, acusada de ter dado um golpe de centenas de milhares de contos à agência da Caixa Geral de Depósitos na Lagoa”.
Para o jornalista Estêvão da Câmara, Ricardo Rodrigues não se devia, por isto, candidatar a deputado. Vai daí que o actual vice-líder da bancada parlamentar, Ricardo Rodrigues não gostou do texto e queixou-se criminalmente do jornalista, por entender que o jornalista questionara, com aquela atitude, a sua honra cometendo um crime de difamação.
Estêvão Gago defendeu-se pedindo que um juiz de instrução, face à prova produzida, não o sujeitasse a julgamento, proferindo o chamado despacho de não pronúncia, porque, no seu entender, "o seu texto tinha, para além da componente opinativa, uma componente factual que, embora podendo tocar na honra do queixoso, nem por isso deixava de ser legítima porque estava protegida pela liberdade de expressão, um direito constitucional que importa particularmente salvaguardar quando estão em causa afirmações que relevam do escrutínio dos titulares do poder político/público."
O juiz Pedro Soares de Albergaria encontrou um nexo de causalidade entre os juízos de valor tecidos pelo jornalista e o "tom da peça jornalística": “Nesta, o arguido exprime um juízo negativo sobre a posição político-partidária do assistente (`não deveria nunca ter enveredado pela actividade política’; ‘o seu regresso é uma insistência no erro’; `ao optar por não reintegrar o assistente (…) quis o destino e as circunstâncias que (…) nascesse um `caso’ nacional da política açoriana’, etc.) e esse é, na verdade, o valor comunicativo-jornalístico aparente daquela peça.” As opiniões (não lhes chamaria tal porque não são atitudes pessoais, mas sim atitudes públicas, e as meras opiniões são pessoais) do jornalista estariam apoiadas em imputações de facto, tais como “esteve envolvido com um gang internacional na qualidade de advogado, sócio e procurador de uma sociedade off shore registada algures num paraíso fiscal”; “advogado/sócio de uma mulher que está foragida no estrangeiro, acusada de `ter dado o golpe de centenas de milhar de contos”‘, e eram estas afirmações que permitiriam imputar ao assistente Ricardo Rodrigues comportamentos indignos ou desonrosos.
Havia, então, que apurar se existiam causas que legitimassem o texto do jornalista, isto é, se o interesse do mesmo era legítimo e se eram verdadeiros os factos em causa ou se, pelo menos, o jornalista tinha razões para, de boa-fé, os tomar como verdadeiros.
Ao contrário, no entender daquele magistrado, “a notoriedade política do assistente, a relevância dos cargos que ocupara (antigo governante regional), a sua actividade político-partidária, incluída a condição de candidato a deputado que então tinha e, finalmente, a circunstância de ter sido investigado e arguido num processo em que se apreciaram crimes de associação criminosa, infidelidade, burla qualificada e falsificação de documentos, entre outros; e bem assim, que o assistente fora além disso advogado daquela que nesse processo foi principal arguida (ao tempo foragida e mais tarde julgada em processo separado com condenação por crimes continuados de burla qualificada e falsificação de documentos)”, consubstanciavam matéria relevante "do ponto de vista jornalístico e à luz da função da imprensa numa sociedade livre". Ou seja, as “apreciações sobre a oportunidade e valor do percurso político percorrido e então a percorrer pelo assistente”. Já quanto à veracidade das afirmações do jornalista, a questão foi mais complexa: Ricardo Rodrigues, embora tivesse sido constituído arguido no processo criminal em causa, não chegara a ser acusado pelo Ministério Público, que arquivou o processo quanto a si.
Questão fundamental: Como interpretar as afirmações do jornalista de que o político tinha estado envolvido com um gang internacional? Iriam ou não, para além do que podia, de boa-fé, afirmar?Segundo o juiz Pedro Soares de Albergaria, naquele processo criminal, o M.° P.º tinha referido expressamente que, sobre Ricardo Rodrigues, tinham recaído “suspeitas de envolvimento na factualidade ilícita que trata os autos”, pelo que, o jornalista não tinha ido além do que já ficara afirmado pelo M.°P.°, donde, não teve dúvidas de que o texto de Estêvão Gago estava protegido pela liberdade de expressão pelo que proferiu despacho de não pronúncia.
E de tudo isto, retiram os seus colegas (alguns, óbvio) a conclusão de que esta é "Uma decisão que, embora proferida em Abril, podemos considerar um presente de Natal."
Lamento, mas discordo profundamente.
Já devíamos estar fartos, a esta hora, dos caprichos e devaneios exercitados a bel-prazer pelos senhores jornalistas, com graves repercussões ao nível pessoal e público na vida de quem faz política. Primeiro, porque não pertencem todos ao mesmo saco. Segundo, porque o grau de exposição é cada vez mais acentuado, e isso parece afastar - curiosamente - não os malfeitores, mas os que não o são (até porque em relação aos outros, as coisas são como são ...).
A democracia deveria ter já atingido um confortável nível de respeito e de exercício do direito de cidadania que delimitasse (não limitasse!) a possibilidade de se ferir o próximo sem um elevado grau de probabilidade na acusação e contemporizando a aplicação de sanções a quem, independentemente da sua actividade ser a jornalística ou outra, exorbita a boa-fé.
Portanto, esta decisão já - ironicamente - ou não? - de Abril não é um bom presente. Nem sequer é um presente. Muito menos de Natal.
A não ser que nestes se incluam "presentes" envenenados!

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Inteligência emocional e a arte de (bem) gerir pessoas



Arménio Rego é Professor da Universidade de Aveiro. E é simplesmente brilhante.
Devíamo-lo seguir fervorosamente.
Já vi tanta gente incrivelmente genial a tropeçar na vida porque são useiros na falta de diplomacia, na falta de tacto, na grosseria e na sobranceria. E ficam pelo caminho.
Outros, nem por isso assim tão inteligentes "sabem lidar" com os outros e isso é uma mais valia preciosa, sobretudo para quem aspira a ser líder.
É óbvio que a facilidade de criar empatias, de gerar simpatias, é mais um dom, um talento, mas tem muito de trabalho, de aplicação e de disciplina também.
Aproveitando o slogan budista de que não se "dá murros em ponta de faca", essa arte de bem conviver é uma falha de muito gente que conheço e que, embora brilhante, fica sempre, constantemente, na sombra, porque são inveterados, incuráveis, trapalhões sociais.
Vejamos porque acho que o Arménio os pode ajudar.
Explica ele a importância da inteligência emocional (IE).
Trata-se de uma capacidade, uma habilidade até, para conciliar emoções e razão: "usar as emoções para facilitar a razão, e raciocinar inteligentemente acerca das emoções." Implica que tenhamos consciência das nossas próprias emoções e das dos outros, que sejamos empáticos, que conheçamos as causas e as consequências das emoções, que saibamos reparar os estados de espírito negativos e, finalmente, que nos empenhemos a gerir todas essas emoções.
Goleman sugere que quase 90% das competências necessárias para o sucesso da liderança são de natureza emocional e social. E não sendo uma evidência científica, há fortes razões para acreditar que a IE pode ser um valioso contributo para a nossa vida.
Diz-se que os líderes emocionalmente inteligentes denotam várias capacidades:
- Sintonizam as emoções dos outros e isso motiva-os.
- Articulam a sua visão para uma organização mobilizadora dos talentos.
- Desenvolvem relações interpessoais dentro e fora da organização.
- Fomentam a criatividade dos colaboradores, compelindo à inovação.
- Reparam estados de espírito negativos, tornam-se mais perseverantes e corajosos.
- Captam as emoções "em redor", o que os habilita a escolher os momentos apropriados para tomar decisões.
Os líderes com elevados níveis de IE criam climas que geram partilha, confiança, níveis saudáveis de tomada de risco e uma (sede de) aprendizagem contínua, ao contrário dos que os não têm, que provocam medo, ansiedade, inibição de arriscar, resistência à partilha de conhecimentos e experiência.
Um líder sob estados de espírito positivos contagia os que o rodeiam e estes passam a encarar as envolventes mais positivamente. Como uma "espécie de liderança ressonante".
Se aliarmos à IE características como a integridade e as competências técnicas e conceptuais, temos um lider "em cheio".
Na nossa Administração Pública, ao invés do que acabo de dizer, a IE é pior do que a peste. Todos fogem dos que a têm e pobre de quem a tem. Num espaço onde a incompetência grassa, a sensibilidade emocional é uma enorme tragédia. Porque a primeira potencia a insegurança e esta um alheamento para o que as circunstâncias endógenas afectivas do grupo.
Infelizmente, também há gente inábil no sector provado. Igualmente porque também gente incompetente e insegura.
Poucos são os que percebem que gerir recursos humanos é gerir afectos, almas e corações. E por isso não os gerem, suportam-nos.
Se a IE pode ser aprendida ou apreendida é algo que se desconhece, mas existem já algumas conclusões interessantes.
Sabe-se que a IE tem uma componente genética, mas sabe-se também que uma adequada formação "conta". Se a formação for fundamentalmente expositiva pode ser pouco eficaz, porque se focaliza na parte errada do cérebro. Há que direccionar a sua fulcralidade para o sistema límbico - induzindo motivação no indivíduo para mudar, impelindo-o a praticar, proporcionando-lhe feedback, levando-o a observar actuações empáticas de outras pessoas. Outra condição é ter mesmo um sincero desejo de mudar e tomar a IE a peito.
De todos o modo, seria bom que treinássemos e investíssemos nesta parte menosprezada da nossa formação. Até porque se os líderes devem ser emocionalmente inteligentes, o certo é que "os colaboradores também precisam de saber gerir os seus líderes."

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

Sardinhas com chantilly

Confesso que não sou admiradora literária da Margarida Rebelo Pinto, mas admito que, de vez em quando, lhe passam laivos de uma lucidez devastadora e com os quais me ponho já em lógica de acordo. A propósito da minha tendência para ter amigos, no masculino, e poucos, no feminino, parece que afinal o mesmo ocorre com ela e que é tendencialmente mais comum. Vou conhecendo mais umas quantas que mantém "uma espécie de harém casto que é gerido com sabedoria e amizade." Mas isto só acontece com determinado tipo de mulheres. Geralmente independentes, pouco feitas à duplicidade das práticas conjugais e resistentes a impulsos e jugos masculinos. Têm uma vida profissional cheia e são pouco dadas à vocação doméstica. O harém inclui relações antigas que se foram convertendo em amizades, fraternidades e cumplicidades que nunca pisaram o risco interfronteiriço entre os sexos.
E porque será que vamos preferindo ter amigos homens? Primeiro, porque, ao contrário do que acontece com os homens," têm mais dificuldade em encontrar um grupo coeso, a irmandade da qual os homens tanto se orgulham."
Somos, ao contrário do que se diz e pensa, mais individualistas e mais competitivas em termos afectivos do que os homens, e, por isso, acabamos por sentir mais a solidão. Os homens operam pela lógica de grupo, estão mais habituados à convivência (a jogar/a ver futebol), movimentam-se em bandos e, mesmo depois constituirem família, escapam com frequência para se juntarem, de novo, à manada - o seu porto seguro. As mulheres-mães, quando os filhos chegam, arrogam o (estúpido) mito de que são melhores do que os pais, abdicam do passado, das velhas amigas e reduzem-se a esse papel. Mas é uma pena que desconheçam a importância de ter amigos-homens, tipos com quem se mantém "uma amizade límpida e reparadora. Alguém que nos conhece bem, a quem não precisamos de fazer charme, que já nos viu chorar algumas vezes, que partilha as nossas vitórias e nos oferece ombro e companhia nos momentos mais áridos das nossas vidas." E enquanto os homens procuram o conforto em conversas curtas, ali algures entre a quarta e a quinta imperial, as mulheres preferem muitas vezes uma companhia masculina que lhes explique como funciona o cérebro masculino e nos faz sentir interessantes e atraentes, sem nos porem a mão na perna. "Os bons amigos homens são tão importantes na vida de uma mulher como um bom advogado, um bom contabilista ou um bom cabeleireiro. Sem eles, a nossa vida seria infinitamente mais difícil. Mas para que essa amizade não se estrague, há que separar as águas e deixar o sexo de fora." Acredito em sólidas e perpetuáveis amizades - a preto e branco - e não caio em modas de "amizades coloridas." Confesso que acho que "o tempo tende a esbater as cores" e que "há misturas que acabam quase sempre por correr mal." "É tão arriscado como experimentar sardinhas com chantilly." Diz. Parece-me bem a analogia. Até porque bem pode ser uma questão de fel-mel, ou amargo-doce.

Os 85 anos do Mário!

Concordo com o Miguel Sousa Tavares.
Na Quinta-feira, 17 de Dez, diz-nos que leu a entrevista de Mário Soares.
Este Velho do Restelo (creiam-me no melhor dos sentidos!) fez 85 anos.
Não o conheço. Aliás, da família, conheço a Olímpia, a sua (primeira) nora - de quem gosto muito, faço questão de deizar claro.
Mas voltando ao Miguel.
Admito, como ele, que Soares é único (embora tenha um fraquinho pelo Alegre, porque é poeta, um bom homem, e porque sim), que "teve uma vida fascinante e é um notável contador de histórias.", porque "mantém, intactas, essa fabulosa alegria de viver, curiosidade e optimismo que só encontramos em raros homens do poder", como Churchill.
Olhando o percurso político, a vida, e a coerência das ideias do Mário e a - "grande verdade é que ele destoa no oceano de mediocridade envolvente."
Soares é um "homem com um pacto de vida jamais traído com a liberdade - coisa tão rara em terra onde a liberdade sempre foi tão pouco estimada."
E vai que nos pomos a ler a entrevista e a ver os posts dos leitores. Chovem insultos, calúnias reaccionárias, mistura explosiva de ódio e de muita inveja.
E não posso deixar de concordar com o Miguel, gente assim, com tanto desprezo à flor da pele, "arrepiam de nojo. Que gente é esta? Que nação é esta que produz gente assim? Que, pela frente, calam, obedecem e curvam a espinha, e, por trás caluniam, insultam, inventam, e vomitam até à náusea essa tão antiga e fatal característica portuguesa: a inveja. Mais uma vez me convenço de que esse território do anonimato e da impunidade dos blogues e redes sociais foi inventado como uma luva para satisfazer a insaciável frustração desta gente. A inveja e a cobardia escorrem por ali como o mel em terra prometida. Pois que morram de indigestão de tanto prazer solitário!"
Temos dito!

Lisboa mais bonita - vista por um inglês!

O meu amigo Alexander Ellis, embaixador britânico, tem uma visão sobre as Dez coisas que melhoraram em Portugal nos últimos 15 anos.
Os portugueses são tão pessimistas que nem isso vêem. Acompanhemo-lo.Mortalidade nas estradas; as estatísticas não mentem - o número de mortes passou de 2000 em 1993 para 776 em 2008. O vinho; já era bom. Agora há mais variedade e inovação, mais oferta, experiências agradáveis e premiados. O mesmo aconteceu com o azeite. O mar; Lisboa, em 1994, era uma cidade de costas para o mar; poucos restaurantes e bares com vista para o mar. Hoje, esplanadas e surfistas por toda a parte. A zona da Expo; era horrível em 1994, só poluição, e ruínas de velhas instalações petrolíferas. Agora é uma zona urbana, cheia de museus e edifícios culturais, ciência e ... bares. Boa cerveja (aliás com o único bar que faz degustação de cervejas). A saúde; traduzido no aumento da esperança de vida, de cerca de 74 em 1993 para 78 anos em 2008. Os parques naturais; do Gerês a Monserrate ; mais limpo, melhor sinalizado, mais agradável. O cheiro. Menos fumo e com a probabilidade de a roupa ainda ter cheiro a perfume francês ado fim do dia. A inovação; com algumas das empresas mais importantes a investir no Reino Unido ; altíssima tecnologia, quadros dinâmicos e - o mais importante de tudo - vão sem medo. O metro de Lisboa. Mais limpo, rápido e acessível. E com estações mais bonitas (compare-se com as de Londres). As cores; Portugal tem e sempre teve cores naturais bonitas. Mas a minha memória de 1994 era o aspecto visual bastante cinzento das cidades, desde a roupa até aos carros. "Hoje há mais alegria - recordo um português que me disse, talvez com tristeza, que o país estava a tornar-se mais tropical. Em termos de imagem, parece-me um elogio!"

Não é bom ter amigos fantásticos?!

Esquemas e intrigas - autoria e co-autoria

A Presidência da República afirmou domingo que o relacionamento entre o chefe de Estado, Cavaco Silva, e o primeiro-ministro, José Sócrates, é do domínio do reservado e «não alimenta intrigas montadas para desviar as atenções».
Ou seja, Cavaco Silva «não alimenta intrigas montadas».
Vejamos o que há de verdade nisto.
Tudo a propósito da ausência de Sócrates na cerimónia de posse dos conselheiros de Estado, na quarta.O que deu (voltou a dar) origem a grandes especulações.
Uns dizem (Diário Económico, de sexta-feira) que se sentia o «incómodo de Belém» por o Primeiro ter «trocado uma reunião de Estado por uma reunião partidária», informando «poucas horas antes» o Presidente da República.
Depois (Expresso, de sábado), reiterava-se o «desagrado» do PR.
Parece que isso não foi verdade, e veio o gabinete do Primeiro dizer que este «Simplesmente» não conseguiu chegar a tempo. Em São Bento (DN), diz-se que Sócrates terá sugerido o adiamento por umas horas do encontro a dois [com Cavaco Silva], o que não terá sido possível por a agenda do PR não o permitir.
Uma coisa é certa. O PR não alimenta "esquemas" montados por outros, até porque já provou que é suficientemente inteligente para montar os seus.

sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

O juiz decide ... rápido, se faz favor!

Meus caros, eis-me a falar-vos sobre a responsabilidade civil dos magistrados.
Aproveito as palavras de alguém que admiro e tempero-as como me aprouve.
Diz-se que, actualmente, ".. sempre que um juiz decide um caso relevante (ou com pessoas influentes) está a colocar em risco a sua casa, o carro, o colégio dos filhos e a sua tranquilidade. À dificuldade natural da decisão foi acrescentado um ruído desnecessário e eventualmente perturbador da mesma."
Após a entrada em vigor da Lei nº 67/2007, o juiz pode ver-se constrangido ao dever de indemnizar alguém (que "acusou") porque haverá gente que entende que ele cometeu um erro grave, que a solução podia ser outra - mais justa e adequada.
Se pego no caso, posso arranjar problemas? Quem vou chatear?
(recorde-se: o colégio, o carrito, o T4)
Se "isto é corrupção para acto lícito e já está prescrito?" "... que provas temos?" Se o Professor X acha que não temos, quem sou eu para dizer o contrário? - apesar de até o homem "médio" ver com evidência a necessidade de censura penal de uma determinada conduta?
Num caso judicial, o magistrado não esteve lá, não viu, não ouviu, limita-se às provas "possíveis" - às que lhe chegam às mãos.Imagine-se que "cristaliza" factos acusatórios. Vem o arguido com mil interpretações jurídicas, pareceres de uns e de outros, que, a preço de ouro, defendem que, às vezes, 2 e 2 são mais ou menos 4; quer dizer, admite-se que 2 e 2 sejam 4,3.
Mata-se a trabalhar para contraditar, sobrepõem-se as pilhas de processos, atrasam-se os despachos, estraga as estatísticas.
Independentemente de julgar bem ou mal, o que interessa é que decida rápido e ... bem, seja lá isso o que for, sob pena de, no final, o magistrado se ver a viver "debaixo da ponte.... só porque se armou em herói."
Mesmo que não se saiba para onde se vai, será que quer mesmo ir por aí? (Subscrevendo JOÃO MIGUEL GASPAR O CACHIMBO DE MAGRITTE)

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Maria José Nogueira Pinto - a Pierrot

Maria José Nogueira Pinto é uma mulher de classe. Definitivamente. Mas há dias ... em que parece sentir-se "da sua classe" e não simplesmente "de classe".
Habituou-nos à sagacidade, à astúcia, à inteligência nivelada por cima, tudo isto optimizado por uma educação da "mais fina flor". Não nos esqueçamos que a flor, porém, é de estufa! Ninguém a toma por uma rosa selvagem, clandestinamente nascida num qualquer lugarejo. Sabemo-la de "raízes" (independentemente de apelidos e muito menos de questões nobiliárquicas). Mas é uma florzinha sem resistência ao menor golpe de espinho.
Depois de a sabermos objecto de desavendas e dada a suscitar "elevações" de humor(es) na sua bancada e a apoquentar os poderes consolidados do seu partido, vem agora a "florzinha" encher-se de ares de zé-povinho e ser vedeta em São Bento.
Parece que a sua bancada faz pantomínias e que as outras apenas são circences.
Em política, os vernizes estalam com a maior facilidade! E o verniz estalou!
Logo, na primeira audição da Comissão Parlamentar de Saúde - como serão a segunda, a terceira e por aí fora?! - saca da arma do insulto e desce ao cais (do Sodré) beneditino. Saca da arma do insulto (ainda que um mero insultozinho, coisita de nada). O facto de chamar ao deputado socialista Ricardo Gonçalves, "palhaço" nem seria algo de que se falasse, se a Maria José não nos parecesse ultimamente tão ... nervosa.
Minha querida, se a menina - dez anos a mais que eu, note-se - perde a classe, que é feito dos da "sua classe"?!
Se o PP já legitima ensaios de galhardetes ... com o PS, das duas uma: ou quem desdenha quer comprar ou a paixão está num impasse!
Creia, Maria José, que a pantomínia do seu partido nos leva a crer aspirar a um noivado com o circo e que a menina, lascado o verniz, parece mais um pierrot.
Ou mantenha a discrição oriental das pantomínias ou vista de vez o xadrez do dito, deixe que a lágrima lhe caia pelo abaixo e ... desabafe ... chore ... se quiser!
É que o pierrot mais não é que uma figura circense, simplesmente ... triste!
Por mim, apesar de não ser grande apreciadora da arte circense, prefiro ser palhaço um só dia do que pierrot toda a vida.
Não concorda?!

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

RASGOS FEMININOS - AINDA URGEM E SE INSURGEM

Um tema sempre presente. O lugar da mulher na política. Melhor dizendo, o direito à palavra no feminino dentro do mundo político.
E aqui importa reter a imagem da República, lembrando Lisboa, regila, varina, mulher endiabrada, Severa feita som de Fado, este tornado Saudade. Aquela mulher desbravada, desgarrada, de peito entrevisto, entrecoberto, arregaçando a sua força, como da Natureza ela mesma se tratasse.
Que fez a República pelos Direitos da Mulher?
Desafiando a polémica, Carolina Beatriz Ângelo, médica, viúva e “chefe de família”, apresentou-se a votos nas primeiras eleições republicanas a 28 de Maio de 1911, fazendo valer as indefinições (omissões) da Lei. Seguindo a controvérsia provocada, faz-se aprovar, em 1913, a Lei Eleitoral da República, em que, pela primeira vez num texto legislativo, se determina expressamente a relevância do sexo para efeitos ... eleitorais: “são eleitores dos cargos políticos e administrativos todos os cidadãos portugueses do sexo masculino, maiores de 21 anos, ou que completem essa idade até ao termo das operações de recenseamento, que estejam no gozo dos seus direitos civis e políticos, saibam ler e escrever português e residam no território da República Portuguesa”.
Vai que o direito de voto foi dado às mulheres, ainda que precariamente, pela primeira vez, em 1931 sob o patrocínio legislativo do Estado Novo (lei nº 19:694 de 5 de Maio), restringido àquelas com frequência do curso dos Liceus. Em 1934 nas eleições legislativas foram eleitas pela primeira vez mulheres para a assembleia nacional: Domitília Hormizinda Miranda de Carvalho, Maria dos Santos Guardiola e Maria Cândida Pereira.
Era o princípio do fim! O fim do império masculino, aposto na cláusula de masculinidade. quando após o “incidente” Carolina Ângelo se tentou mostrar aos dirigentes da república a necessidade de clarificar algo que até aí lhes parecia por demais evidente: o carácter masculino da política portuguesa. Não que fosse preciso explicar às mulheres o lugar delas, mas já que algumas ousaram levantar a questão, era urgente esclarecê-la e, se possível, dilucidá-la (até apagá-la!). E daí que se aproveitasse a sessão inaugural da Assembleia Constituinte, em 19 de Junho de 1911, para deixar inequivoca e expressa a cláusula de masculinidade para a entrada no parlamento republicano. A partir daí, a legislação subsequente limitou-se a confirmar que as mulheres estavam excluídas do processo político, inibidas de pensar politicamente, ao menos em público.
Eis senão quando, em 1913, a República, talvez por ser mulher, se retrai, e retrocede, retirando o voto aos analfabetos e - no mesmo plano as qualificou - às mulheres.
“A República, na igualdade dos sexos, voltava sobre si mesma e à discriminação da mulher, anjo do lar”. Assim o dizem hoje João Távora e Carlos Bobone.
Mas a alma feminina é feita de rasgos e complexidade que a sintética e paragmática cabeça masculina tem dificuldades de perceber! E vai daí, outra vez, que, em 2010, quasi, as mulheres se insinuam, que esta coisa de ser mulher é muito mais séria do que os homens pensam, no poder, na política, no dinheiro, e, por fim, o tão e maior temido dos campos ancestrais de guerra: o lar! E volvidos uns tantos anos, agora que elas já votam - falta instigá-las a participar, a exporem-se, a desocuparem o segundo plano que tão (in)confortavelmente ocupavam ...
Agora que já a mulher vota, falta-lhe devotar-se à política, não por carreirismo, mas porque lhes cumpre, novamente, mudar. E, porque, para mudar, há que agir, e uma - apenas uma - dessas menifestações de mudança pode ser através da acção política.
Mudar o rumo ancestralmente traçado pelo masculino e elevar as vozes femininas ao púlpito de São Bento.
Rezemos, por isso, Senhor!
Valha-nos a República!