segunda-feira, 29 de março de 2010

Myra Poole: Um voz dissonante que obriga à reflexão!


Porque este é um blog a ver e a utilizar por livres pensadores, deixo uma nota sobre uma notícia cujo teor obriga à reflexão.
Myra Poole, teóloga feminista, defende a ideia de que Deus criou as pessoas, em liberdade, e que, por isso, não lhes definiu nenhuma orientação sexual específica. Afirma também que todas se devem poder casar, incluindo homossexuais e padres. E, por fim, diz que acredita que Cristo era gay. A teóloga falou sobre o assunto por ocasião de uma conferência em Lisboa, para a qual foi convidada pelo grupo português do movimento internacional Nós Somos Igreja. Onde afirmou ainda que: «Se as pessoas são homossexuais, é porque Deus as fez assim, está certo. Quem sou eu para dizer que Deus fez toda a gente heterossexual? Deus pode fazer o que quiser». «Concordo com [o músico] Elton John. Penso que Cristo era gay. Porque era da natureza de Cristo escolher aquilo que seria mais difícil quando se tornou humano. E ser gay é, para um homem, uma das orientações mais difíceis de assumir». Esta é a opinião de uma teóloga conhecida pelas críticas ao Papado e à hierarquia eclesiástica, activista pela ordenação de mulheres há mais de 20 anos e há mais de 50 integrada na congregação de irmãs Notre Dame de Namur. A liberdade com que se exprime deve-se, segundo a própria, a que, nas suas palavras: «Já não me podem tocar, no passado já me queimaram na fogueira. É preciso pessoas na linha da frente, para dar coragem a todas as outras». A posição desta teóloga que começou por ser anglicana, se devotou ao catolicismo já na universidade, e se dedicou à educação de jovens mulheres gerindo duas escolas, não a impede de admitir que«Há coisas tão boas na Igreja que têm sido destruídas pela forma como a liderança tem agido», embora refira que«Quanto mais olho para o actual Papa, mais sinto pena dele. Está preso numa cultura que não lhe fez bem, nem a ninguém no Vaticano, e também não fez bem às mulheres e aos homens». A polémica que causa vai ao ponto de dizer que não basta à Igreja reconhecer «o erro» nos casos de pedofilia que a têm assolado, nem condenar quem os cometeu, defendendo que bispos e Papa «deviam ir para a prisão». «É terrível o que estes homens fizeram, mas a responsabilidade é dos bispos e do Papa», que «deviam ir para a prisão com eles», porque este tipo de abusos resulta de «uma cultura aceite pela Igreja», qualificando como um «disparate» as tentativas de relacionar o celibato com a pedofilia: «Não é o celibato, é a cultura do catolicismo e a ausência de mulheres [nos cargos eclesiásticos]». A teóloga que se tem destacado pela ordenação de mulheres vai mais longe e pede a resignação de Bento XVI: «Acredito e vou ser muito radical agora que o Papa devia resignar. Não tenho qualquer dúvida». E reconhecendo o risco de ser «linchada», diz que vai defender estas posições quando o Papa visitar Inglaterra.
«Reconheceram o erro, ok. Mas a desculpa do Papa é um pouco tardia. Como cardeal Ratzinger, sabia o que se passava. E se não soubesse, não estava a fazer o seu trabalho. Não há desculpa. Não são líderes capazes, não deviam estar nestes papéis». E exige uma reacção mais vigorosa aos escândalos de pedofilia por parte da hierarquia. Defendendo que é preciso haver «uma rebelião na Igreja» Myra Poole diz que toda a comunidade católica deve «ter algo a dizer sobre a próxima forma de Papado» e sustenta que «o problema é que não há democracia na Igreja».
Longe vão os tempos da Inquisição, e, para mim, as vozes dissonantes, ainda quando o são ou precisamente por o serem, não são para, conveniente e prudentemente, se votarem ao ostracismo. A História ensina-nos que as minorias nem sempre tão minoritárias quanto isso. E, independentemente de se concordar com o seu conteúdo, reconhece-se uma revolta latente na voz desta cristã. É uma teóloga, pelo que não será por falta de conhecimento que se manifesta. Quando muito, será por quebra de fé, e se a perdeu, há que reflectir porquê. A única resposta que se lhe pode dar, no momento, é a de que a sua voz vale, pelo menos tanto quanto as outras. E que, tal como as outras, obriga à reflexão.