terça-feira, 30 de novembro de 2010

O silêncio dos intelectuais e a sociedade bárbara, segundo Francesco Alberoni

“Começo a estar cansado de ver apontar publicamente como modelos multimilionários que ostentam a sua riqueza, aldrabões que vivem de intrigas, analfabetos que as pessoas tomam como exemplos de saber e bom senso, políticos que só sabem lamentar-se, incapazes que são de analisar de forma rigorosa a realidade político-social. E além disso tenho saudades de ouvir falar com profundidade e saber os grandes estudiosos, os grandes intelectuais.
Ainda há não muito tempo as pessoas tinham respeito pela alta cultura, pelos grandes filósofos, pelos grandes cientistas. Nos anos 70, portanto há relativamente pouco tempo, qualquer licenciado lia e era capaz de citar filósofos como Kant ou Hegel, sociólogos como Weber ou Pareto, psicólogos como Freud ou Jung. Quase todos os políticos da Primeira República italiana eram pessoas muito cultas, muitos deles professores universitários. Na mesma época havia empresários, como Olivetti ou Pietro Barilla, que se rodeavam de homens de cultura, de grandes artistas, o que não os impedia de criar empresas internacionais de envergadura. As grandes figuras da cultura apareciam nos jornais, na rádio, na televisão.
Hoje as coisas já não são assim. Há um círculo mediático que é formado por pessoas que se convidam umas às outras, que se elogiam entre elas, que fazem a festa sem precisar de ajudas de fora. Pensemos no luto por Pietro Taricone, o actor do "Big Brother" italiano morto recentemente. Mas quem fez na televisão a homenagem a personalidades como Alessandro Bausani, Norberto Bobbio, Lucio Colletti, Franco Modigliani, Mario Luzi, Sergio Cotta, Elémire Zolla, Pietro Cascella, Giò Pomodoro? Em Itália há uma grande criatividade e uma oferta imensa de livros, filmes e espectáculos, mas falta o sentido da ordem, da hierarquia, da avaliação equilibrada das personalidades e dos valores. As escolhas são superficiais, resultantes de um marketing grosseiro e muitas vezes da corrupção.
As elites do saber renunciaram a educar o público, a reflectir e a escolher. A cultura, a ciência, o estudo da alma humana exigem tranquilidade, profundidade, o reconhecimento dos próprios erros e qualidades como o respeito e a humildade.
No entanto, hoje já não estamos acostumados à reflexão e à argumentação rigorosa; preferimos a conversa fiada e as piadas fáceis. Tudo desencoraja a alta cultura, os projectos ambiciosos a longo prazo, a verdadeira vida do espírito. Estou convencido de que, se a sociedade enfrenta dificuldades, isso acontece também em resultado desta perda de espessura, de moral e de seriedade intelectual. Parece-me que está na altura de as elites culturais de esquerda ou de direita retomarem o seu verdadeiro papel, a sua responsabilidade educacional, e porem um travão na degradação intelectual da vida pública.”

domingo, 28 de novembro de 2010

A EMIGRAÇÃO DOS PORTUGUESES – NECESSARIAMENTE UM DRAMA?

Todos conhecemos alguém que sai do País para trabalhar. No último ano, saíram do País 697 962 portugueses para trabalhar, o que equivale ao dobro dos 454 191 estrangeiros que cá vivem, e o que significa que se está perante uma terceira vaga da emigração, com níveis próximos dos anos 60 e 70, a que acresce que esta pode ainda ter efeitos mais graves e perduráveis para a economia nacional, já que, desta vez, inclui uma fuga de cérebros, o que, a par da baixa natalidade, alguns classificam de bomba-relógio para a sustentabilidade da Segurança Social. Ao certo, só com os Censos de 2011 se saberá. Os países de destino são a Suíça, a Espanha, o Reino Unido, o Luxemburgo e Angola. Sublinhe-se, contudo, que, contrariamente à emigração dos anos 60-70, esta é de carácter mais temporário. Os que saem para Espanha, por exemplo, chegam a ir e vir todas as semanas ou de 15 em 15 dias. E os que saem para Angola, têm deslocações com ida e volta, e, nos primeiros anos, concede-se-lhes apenas um visto de três meses.
Relativamente à fuga de cérebros, 1 em cada 13 portugueses com curso superior emigrou em 2000, considerando um total de 90 mil emigrantes, no mesmo ano, segundo o Observatório da Emigração. Um número elevado mas não desenquadrado face ao fenómeno europeu de mobilidade, com a Eslováquia a chegar aos 14% e a Irlanda aos 23%. Há, ainda que incluir nestes dados o número de portugueses que concluí a formação superior nos países de destino, que representam 20 %. Segundo os autores de “Portugal: Atlas das Migrações Internacionais”, publicado pela Gulbenkian, os principais destinos, em termos absolutos, são os EUA, o Canadá, a Alemanha e a França, e, em termos relativos, o Reino Unido, a Bélgica, a Holanda, a Suécia e a Itália. "À excepção da França [apenas 4% são licenciados], em todos os países referidos a percentagem de emigrantes portugueses com formação superior situava-se entre um mínimo de 20% (EUA) e um máximo de 40% (Reino Unido)".
É obvio que a actual conjuntura de crise, que, ao contrário do que muitos afirmam, não é de agora, de que decorrem os números crescentes do desemprego constituem um indicador preocupante.
Têm-se feito da questão um bicho papão. É verdade que a crise empurra dramaticamente a grande maioria dos emigrantes para fora, mas também convém não esquecer que os paradigmas de cultura se alteraram e que a mobilidade, pelo menos a que ocorre dentro do espaço Schegen, está mais facilitada. Mas também é verdade que as classes mais jovens encaram a sua saída – concretamente ao nível dos mais qualificados – como uma hipótese de interagirem com novas culturas e de valorização curricular. O incómodo de sair é, em muitos casos, atenuado pelo domínio das línguas do país de destino e até compensado com a multiculturalidade adquirida. Sem prejuízo de se reconhecer que, para outros, é a única solução, para uns, será a melhor solução.
As mentalidades mudaram e até, eu própria, à beira dos cinquenta anos, não vejo, agora, qualquer drama em aceitar uma oferta de emprego fora de portas. O que é curioso porque sou uma matriarca responsável pela sustentação de um projecto empresarial com um irmão quinze anos mais novo, que, igualmente, se dispõe a ir para onde os negócios o aconselharem, e que assumo o acompanhamento dos meus pais, na faixa dos setenta, que manifestam toda a disponibilidade em me acompanhar, se isso fosse necessário. Até as minhas filhas, a mais velha advogada na área do direito público de uma conceituada firma de advogados e a outra à beira de entrar na faculdade, uma já independente e a outra, em custódia partilhada com o pai, nada vêm de trágico na ideia de viverem e trabalharem fora do País. E, há uns bons anos, quando as oportunidades surgiram afastei-as sem hesitar. A Europa, como os países lusófonos, estão hoje no nosso horizonte territorial de vida, porque as nossas perspectivas sociais e culturais se alteraram.
A ideia enraizada dos nossos pais de que, quase tudo, era para toda a vida, desvaneceu-se, senão mesmo, faleceu. Começando na casa, no emprego e na família. Não há, julgo eu, que exorbitar as causas do fenómeno. Talvez haja mais, isso sim, que nos preocuparmos com as suas consequências. Como o fazem outros países que sofrem do mesmo. Como sempre, preferencialmente, apelando à razão sem nos deixarmos tolher pelo coração. Porque, basicamente, também o mundo da abrangência no espaço dos próprios afectos se alterou. E, com as novas tecnologias, a nostalgia e o distanciamento decorrente da distância minimizaram-se. Como dizia um amigo meu: - “falo mais agora com a minha filha (em Angola) e acompanho mais a vida dela e dos meus netos do que quando morava ao fim da minha rua.”
Tornámo-nos cidadãos do Mundo.

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

DIA INTERNACIONAL DE VIOLÊNCIA CONTRA AS MULHERES: TODOS OS DIAS DA NOSSA VIDA



Celebra-se, amanhã, o Dia Internacional de Combate à violência contra a mulher. Julgo que todos reconhecemos que esta é uma causa de cada um e de todos. Independentemente de ser física e/ou sexual, psicológica, por meio de coação, constrangimento, ameaça, de subtil ou explícita. Independentemente de condições sociais, étnicas, estéticas ou etárias. A violência contra a mulher assenta na própria condição feminina, e é mais ou menos bem suportada e tolerada pela construção de valores e papéis sociais que, ao longo da história, vêm submetendo as mulheres a relações desiguais, interferindo negativamente no desenvolvimento da sua autonomia e na conquista da sua emancipação.
A última das causas que congregou a comunidade mundial foi a da iraniana Sakineh Mohammadi Ashitianí, condenada à lapidação até à morte por adultério e cumplicidade no homicídio do marido. Parece que a sua vida está, literalmente, por um fio, embora, já hoje, um alto funcionário do regime de Teerão tenha afirmado que está a ser estudada a possibilidade de comutação da pena, recordando que a sua execução ficou em suspenso devido à campanha realizada por países ocidentais e organizações de direitos humanos contra a concretização da sentença, sem esquecer o papel determinante do Conselho de Direitos Humanos do Irão. Hoje, também, uma notícia sobre a situação das mulheres nos Emirados Árabes Unidos, dá conta da aprovação recente de um parecer, emitido pelo Supremo Tribunal, que reconhece ao homem o direito de “disciplinar” (leia-se agredir) mulher e filhos, desde que não deixe marcas físicas visíveis. Uma “legalização” que ocorreu depois do julgamento de um caso de violência doméstica cometido por um cidadão de Sharjah, que agrediu a estalo e pontapé a mulher, deixando-lhe ferimentos na cara e na boca, e a filha, com ferimentos na mão e no joelho. E, segundo o tribunal, os ferimentos nas duas mulheres relevam, apenas, porque provam que o pai abusou do seu direito na sharia, sobretudo, relativamente à filha, de 23 anos, que já seria velha demais para receber uma punição do pai, dado que, de acordo com a sharia, a puberdade determina o estado de adulta. Felizmente, a decisão do Supremo Tribunal suscitou a indignação das entidades que lutam por uma maior abertura e modernização do país, afirmando que a aplicação da sharia mancha a imagem dos Emirados Árabes Unidos, até porque a sua população é maioritariamente estrangeira.
É tempo - está-se sempre a tempo - de se agitarem as consciências e de se trabalhar para conseguir a mobilização geral da comunidade, nacional e internacional, contra a violência sobre as mulheres.
Trata-se de uma situação assumidamente chocante e em que todos os meios servem para se combater este flagelo. Amanhã, não é, pois, dia de celebrar, é, sim, dia de se chorar, porque, ainda, há muito em que se reforçar a luta pelo fim desta maleita social, pela formação e pela informação. O conceito da sentença dos Emirados Árabes Unidos, de que “disciplinar” vale, desde que não haja marcas visíveis, é, por acção e omissão, “permitido” em muitos estados democráticos, sabendo-se que há casos em que essa é uma recomendação dada por alguns advogados aos seus “ilustres” clientes. E falo por experiência própria.
Mas, se as marcas físicas exteriorizam os maus tratos, não esqueçamos, peço-vos o encarecido favor, que as marcas da alma nunca se apagam e delas quase nunca se recupera. E, quando perguntam, a quem já a sofreu na pele, porque não arrisca e porque não se “deixa levar” e tenta ser feliz, a resposta é pragmática: não se trata de não arriscar, ainda que pela primeira vez, a felicidade, mas de não arriscar, mais nenhuma vez, a infelicidade. Porque é bom que só uma vez chegue para se dizer “basta”!

domingo, 21 de novembro de 2010

“EM CASOS PONTUAIS JUSTIFICADOS” – O PRESERVATIVO – AINDA A POSIÇÃO DA IGREJA

Morrem, por ano, mais de 2,7 milhões de pessoas com o vírus da sida, de forma mais marcante na África subsariana. O último relatório da Organização Mundial de Saúde e a avaliação do programa de luta contra a sida das Nações Unidas indiciam que a epidemia está a estabilizar à escala global, mas apuram, também, que o impacto da crise económica dificulta a concretização dos programas de prevenção e de tratamento, em, pelo menos, 22 países de África, Caraíbas, Europa, Ásia e Pacífico. Com a África do Sul está na linha da frente dos portadores do vírus VIH no mundo, com 11,6% (5,7 milhões) da população (de 49 milhões). Em África a população flagelada é de 22,4 milhões. Viram-se agora os olhos das autoridades mundiais de saúde para o Leste Europeu e para a Ásia Central, em que se constatou um aumento do número de novas infecções.
Joseph Ratzinger tem vindo a apregoar que a acção humana tem de ser vista em conjunto com uma dimensão moral, que, embora, se baseie nos fundamentos que constituem o vértice do catolicismo apostólico romano, tem de se adaptar ao momento histórico. E, terá sido, com base nessa sua ideia que o Papa veio flexibilizar o uso do preservativo, apenas em "casos pontuais, justificados". No livro Luz do Mundo, a lançar em Portugal a 3 de Dezembro, Bento XVI dá como exemplo para um desses "casos pontuais justificados”, a utilização do preservativo por quem pratica a prostituição, com o argumento de esta pode moralizar aquela (?!). Acrescenta que o uso do preservativo não é "uma solução verdadeira e moral", nem "a forma apropriada para controlar o mal causado pela infecção do VIH", e defende que a solução "tem, realmente, de residir na humanização da sexualidade". O que, no fundo, equivale a dizer que a utilização do preservativo só se justifica por questões de saúde e não de contracepção.
Em Portugal, como em todo o mundo, os ecos ouviram-se.
D. Januário Torgal Ferreira, bispo das Forças Armadas, diz que está "muito feliz" com a decisão de Bento XVI, o que é coerente com a posição que ele próprio tomou aquando das declarações do Papa na visita a África, não se coibindo de afirmar que as palavras do Papa "chegam atrasadas" e de manifestar alguma hesitação e prudência dizendo que aguarda que Bento XVI assuma as mesmas perante os fiéis. "Se me pergunta se é um estrondo, sem cairmos em excessos, nem em exageros, é indiscutível que é. É indiscutível que é um "volte face", com o qual rejubilo", mas reconhecendo que a prática dos cristãos há muito assumiu essa opção em nome da responsabilidade e de princípios éticos e morais, tal como admite estar "muito satisfeito" com as palavras do Papa, tendo em conta que as mesmas se destinam a situações de risco reais, em que se "joga a vida" e em que estão em causa "princípios éticos". "A vida não pode ser infectada, a vida não pode ser assassinada", afirma, enfatizando que a "verdade pode aparecer um pouco alongada no tempo", mas que "quando é dita tem sempre lugar marcado". Mostrando, ainda, alguma relutância em crer que, ipsis verbis, terá sido isso que o Papa quis mesmo dizer, acrescenta que faz votos para que não venha a aparecer uma "contra corrente" a argumentar que Bento XVI disse sem dizer, ou seja, que terá sido mal interpretado, ou corrigindo a frase com uma retificação, atendendo a que há precedentes nestas reviravoltas.
O padre Carreira das Neves crê que a posição "pode levar a uma mudança de atitudes, já que a palavra do Papa é ouvida por muitos", e que é, sem dúvida, "um avanço", "um passo em frente" da Igreja. Já o presidente da Conferência Episcopal Portuguesa, D. Jorge Ortiga, preferiu remeter-se ao silêncio, no que foi acompanhado pelo porta-voz da CEP, Manuel Morujão, que se limitou a dizer que "não há voz mais autorizada que a do Papa". Maria João Sande Lemos, do movimento Nós Somos Igreja, afirma que "Depois de a Igreja até ter dito que o preservativo ajudava a propagar a infecção, estas palavras são muito positivas." D. Carlos Azevedo, bispo auxiliar de Lisboa, diz que esta "é uma questão moral, que há muito tempo está esclarecida. Talvez as pessoas estranhem por ela vir do Santo Padre" e que é "a reflexão sobre um mal menor: não vamos matar outras pessoas quando alguém não tem consciência do que faz". Já no ano passado, o bispo de Viseu, D. Ilídio Leandro, tinha defendido, meio à revelia da doutrina predominante e oficial, "o uso do preservativo por doentes com sida", entendendo-a como uma medida "aconselhável e obrigatória".
Perante uma realidade dura e crua como a dos atingidos pelo vírus da sida, quer alguns cristãos, nas suas vidas privadas, e, dentro de portas, usavam o preservativo, até para fins de anticoncepção, e eram abençoados pelos padres das suas paróquias e compreendidos pelos seus confessores. Tal como já os técnicos afectos aos programas mundiais de luta contra a SIDA o recomendavam e tinham a aderência de alguns padres locais e regionais, o que não retira o valor das declarações de Joseph Ratzinger.
Mas creio que evidencia ao mundo esta triste realidade: que a Igreja, só quando se vê intimidada pela pressão dos media e só quando constata a calamidade como facto consumado, é que abre ligeiramente as janelas do seu pensamento. E, por isso, compreendo os que se movimentam já, exigindo um pedido de desculpas de Bento XVI ao mundo, pelos que morreram e pelos que estão enfermos.
Na Primeira Carta de São João, capítulo 4, versículos 8 e 10, lê-se que “…. Deus é amor” e que “Nisto consiste o amor: não em termos nós amado a Deus, mas em ter-nos ele amado, e enviado o seu Filho para expiar os nossos pecados.”, e esta é a maior lição da entidade divina cristã.
Então fica sempre a inquietação.
Porque será que aquela que se apelida de “mão de Deus”, de “voz de Deus”, não agiu prudentemente, de acordo com os deveres de cuidado a que estão obrigados os pais perante os filhos, e não acautelou, não preveniu, e apenas remediou. E, creio, que, a existir uma forma de Deus, lá do alto, o juízo que faria das posições de quem se diz seu mandatário seria bastante critico. E, aquela que me parece a grande conclusão, é a de que, nesta matéria, se confirma que o homem foi feito à imagem e semelhança de Deus (Gênesis 1:26-27), porque, nós, por cá, também somos profundamente críticos em relação à imprudência e à negligência da Igreja. Deus é de amor, mas a Igreja é alicerçada em dogmas que nem sempre se coadunam com uma postura de amor. E isso dá que pensar! E deixa-nos profundamente apreensivos e, até mesmo, tristes!

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

RESPONSABILIZAÇÃO DOS POLITICOS, na visão de RUI RANGEL

O artigo é do Rui Rangel e intitula-se "Realidades indissociavéis", de 18-Nov-2010
"Rui Rangel - Ainda a propósito da minha última crónica sobre a responsabilidade civil e penal dos políticos. Nas sociedades democráticas e nos tempos que correm, não existem princípios imutáveis e puros. Tudo está em mutação ou em renovação. O aumento dos níveis de responsabilização é uma necessidade e uma exigência dos tempos, sendo um sinal de transparência e de crescimento das democracias.
Hoje, as responsabilidades política, civil e penal dos titulares de cargos públicos constituem realidades indissociáveis. A mera responsabilidade política é insuficiente e não oferece garantias de boa governação da coisa pública. Até porque os níveis de abstenção nos sucessivos actos eleitorais e as cifras negras elevadas de analfabetismo existentes têm enfraquecido e fragilizado a responsabilidade política.
Já não existe uma genuína responsabilidade de quem exerce cargos políticos. Ninguém cumpre as promessas eleitorais, governa-se em função dos interesses partidários e dos ciclos eleitorais e não à dimensão e às necessidades do País. Aumenta a responsabilidade política no dia em que quem estiver no poder governar para perder as eleições. E nesse dia ganham Portugal e a democracia. Mas como estamos longe desse dia, é necessário encontrar, por via legislativa, outros patamares de responsabilidade.
Não é populismo nem demagogia defender a responsabilidade civil e penal dos titulares de cargos políticos. É normal e lícito em democracia existirem políticos incompetentes e a prática do erro. Esta não confere nenhum título de qualidade nem certifica a competência. Mas ninguém ousará contestar que a democracia e o Estado de Direito certificam a verdade, a transparência, a lealdade e não pactuam com o erro grosseiro. A legislação que já existe sobre a matéria, particularmente a Lei nº 34/87 de 16 de Julho, que trata dos "Crimes de Responsabilidade de Titulares de Cargos Políticos", é vaga, imprecisa, generalista e muito branda. Em termos de prevenção, não tem o mais pequeno pingo de dissuasão.
O crime compensa desde que seja de bolsos cheios. A margem na lei criminal existente é nula ou quase nula e não é por falta de capacidade judicial para a aplicar. Esta lei fraca e tímida mostra que não é nenhum crime à democracia defender essa responsabilidade. O que se queria era uma lei exigente e mais clara e objectiva. Mas como são os políticos que as fazem, é sempre assim, para que fique tudo na mesma.
Então, o titular de cargo político que de forma grosseira autorize despesas sem cabimento, gaste mais do que aquilo que o País pode suportar, faça grandes obras públicas em momentos de completa ruptura económico-financeira, afunde as finanças, endivide o Estado até à exaustão, escondendo esta realidade e a seguir venha pedir sacrifícios às famílias e às empresas, não merece ser responsabilizado civil e criminalmente? Claro que sim.
Não é de agora nem por causa desta crise ou de certos processos judiciais que envolvem políticos que defendo o aumento dos níveis de responsabilização. A responsabilidade civil e penal, por erro grosseiro, na violação de regras orçamentais é uma necessidade das democracias modernas e uma salvaguarda dos bons políticos, devendo, por isso, ser alargada." (Rui Rangel Correio da Manhã 18.11.2010)
Ainda bem que o Rui Rangel se pronunciou porque quando teci criticas à Lei 34/87, havia quem entendesse (vide, p. ex. revista Sabado da semana passada) que esta era quanto bastava para responsabilizar criminalmente os titulares de cargos políticos - e com isso louvasse a "descoberta" de Pedro Passos Coelho, mas, de facto, não é. Fazer uma nova lei é uma exigência inquestionável! Façam-nos o favor!!

MAGISTRATURA: PRIMEIRO A GREVE, DEPOIS O "RESTO"

A Justiça tornou-se um tema recorrente. A última semana trouxe-nos indicadores preocupantes.
Devido ao facto de a criminalidade em Portugal estar a aumentar, segundo os dados da Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa, destacando-se, sobretudo, o aumento da criminalidade fiscal e na área da corrupção. Quase metade dos novos inquéritos que deram entrada este ano respeitam a crimes fiscais (fraude fiscal, abuso de confiança fiscal, e outros). Desde empresas que retém verbas para a Segurança Social e que não entregam o dinheiro ao Estado a pessoas singulares que prestam falsas declarações de rendimentos ao fisco. Quanto à corrupção, a PGDL registou 166.002 novos inquéritos na área da sua jurisdição, até Setembro, abrangendo todo o distrito de Lisboa, grande parte do distrito de Leiria, algumas comarcas de Santarém, duas da Margem Sul e as regiões dos Açores e Madeira. Preocupante também, embora estatisticamente estável, é a criminalidade participada por tráfico de droga, com uma ligeira diminuição do número de crimes contra o Estado e a emissão de cheques sem cobertura.
"A criminalidade reflecte a violência que existe na sociedade", afirma Francisca van Dunem, que entende que se pode voltar aos índices de criminalidade verificados em 2008, o que significa que, depois de uma baixa na criminalidade citada no relatório anual de segurança interna, pode vir a verificar-se uma inversão com uma nova subida.
Ora, tudo isto vem a propósito da greve do dia 24. De um lado, a Procuradoria Geral da República decide assegurar os serviços mínimos, tendo sido a adesão decidida pelo Sindicato dos Magistrados do Ministério Público que avisou o ministro. Uma atitude nunca antes vista. Uma decisão comunicada à hierarquia do Ministério Público por Isabel São Marcos, a recentemente eleita vice-procuradora-geral, dois dias depois de o sindicato apresentar o pré-aviso aos ministérios da Justiça e do Trabalho. A procuradora-geral determinou que os procuradores-gerais distritais, o coordenador do Ministério Público no Supremo Tribunal de Justiça e a directora do Departamento Central de Investigação e Acção Penal assegurem, por turnos, o serviço urgente, nomeadamente casos de prazos máximos de prisão preventiva e providências urgentes de menores em perigo.
A decisão levantou polémica no Ministério Público, primeiro, porque não está prevista a intervenção sindical na definição dos serviços mínimos e porque espelha a posição própria de cada magistrado, na decisão de adesão à greve e, segundo, porque nunca se tomou uma medida destas ao nível da magistratura. A que acresce que as leis gerais que regulam o exercício do direito à greve prevêem o acordo entre os funcionários e as entidades patronais quanto à forma e duração dos serviços mínimos, sendo que, em regra, são os representantes dos trabalhadores a definir quem efectuará os serviços mínimos, com a excepção de, se os sindicatos nada decidirem até 24 horas antes do início da greve, a entidade patronal defini-os ela mesmo.
Relativamente aos funcionários do sector da Justiça, há que ter em conta o entendimento subscrito num parecer do Conselho Consultivo da PGR, de 1999, que reconhece que as associações sindicais têm de ser auscultadas quanto a serviços mínimos. O que fomenta o antagonismo entre as partes. Com o Sindicato dos Magistrados (ASMP) a garantir que vai definir os serviços mínimos com o Governo, porque não reconhece à PGR o direito a impô-los unilateralmente. A agravar pela circunstância de afirmar (a ASMP) que o Governo não está a negociar de boa fé a lei do Governo que visa rever o Estatuto dos Magistrados Judiciais, estabelecendo uma conexão (?!) entre as condições de independência necessárias às decisões judiciais os subsídios e a jubilação.
Para uns casos, os magistrados arrogam-se os protagonistas de um órgão de soberania independente, numa situação de supremacia. Para outros, exigem ter os direitos dos trabalhadores “normais”. Esquecidos ficam os índices de criminalidade a subir decorrentes, alguns deles, nas palavras dos próprios, da crise financeira. Crise financeira que não se coíbem de agravar aderindo a uma greve que em nada apoia a recuperação económica do País. Vestem-se e despem-se as becas, conforme as conveniências. E, abaixo de tudo, fica o interesse do País. Uma atitude que obriga ao desapontamento. Que provém da imagem que antes se tinha de uma classe que se supunha acima de lutas partidárias! Uma imagem dificilmente recuperável face ao recente protagonismo negativo dos vários interlocutores e representantes da classe. Provavelmente, fomos todos nós que errámos: elevamo-los a um púlpito imerecido!

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

SOBRE AS NOVAS NOMEAÇÕES DO GOVERNO OU O ÓNUS DE SER DIRIGENTE

Fala-se muito das nomeações feitas pelo Governo, em mês e meio, já depois da aprovação do PEC III. Terão sido 270 nomeações para cargos na sua própria estrutura orgânica e nas administrações directa e indirecta do Estado. Em resposta, o Governo veio esclarecer que essas nomeações correspondem, maioritariamente, a substituições de dirigentes por concurso público. Razão pela qual não representam aumento da despesa, dado que os cargos já existiam e as respectivas verba estavam já cabimentadas. Para além do que, os candidatos a esses lugares são funcionários públicos que deixam de constituir uma despesa no quadro do mapa de pessoal, passando a ser remunerados pelo ministério do cargo dirigente para que são nomeados. Na prática, o que dali resulta é um excedente, e que, sendo para dirigentes nomeados por concurso público, é quase insignificante.
Lamentavelmente, esquecem-se alguns dados subvertendo as conclusões. Primeiro, que a fuga dos funcionários públicos de carreiras de alto nível, a par do recurso à pré-aposentação ou à reforma antecipada, privou alguns serviços e organismos de técnicos superiores e mesmo de dirigentes. Eu própria constato, como consultora e auditora, a incapacidade que os mesmos têm de lidar com uma legislação administrativa extraordinariamente complexa, sucedendo-se equívocos e erros flagrantes e que podem vir a custar muito ao Estado, caso os particulares fornecedores, prestadores, empreiteiros e até os próprios trabalhadores accionem os mecanismos processuais devidos. Segundo, a ausência de quadros dirigentes é, neste momento, dramática. Porque os mais velhos partiram, recorrendo à pré-aposentação, e, face à contenção os serviços se vão remediando com um ou outro que fica e que acumula com as tarefas antes distribuídas por vários, com a inerente sobrecarga de trabalho e desconhecimento das matérias e dossiers. Terceiro, tudo agravado pelos mecanismos da responsabilidade civil extracontratual do Estado que responsabiliza os titulares de cargos públicos pelos actos e omissões cometidos na sua função. O mesmo diploma que responsabiliza os médicos que estão ao serviço públicos por erros médicos e os juízes pelo erro judiciário. Com uma grande diferença: é que, enquanto estes protegidos pelas respectivas ordens profissionais possuem um seguro de grupo que lhes permite estar salvaguardados quanto a eventuais indemnizações devidas por aqueles erros, os titulares de cargos públicos vêm exposto o seu património pessoal caso errem nas suas decisões, pela simples razão de que nenhuma seguradora em Portugal aceita fazer esse seguro. Mesmo para os presidentes dos institutos públicos – apesar da existência de um despacho do Ministro das Finanças que a isso obriga - o que, tendo em conta, os montantes envolvidos na gestão, é um caso sério e um risco considerável. Tenho amigos que, antes de aceitar os cargos, optaram para uma separação judicial de bens, passando a titularidade do património familiar para o cônjuge, à cautela. E não se diga que se erram a culpa é sua, porque até acontece que alguns são qualificados gestores mas nada entendem, ou pouco entendem, do complexo ordenamento jurídico que regula a contratação pública. Pecam pela forma e não pela substância.
E, dirão, para que servem os trabalhadores públicos licenciados em Direito. Tendo em conta que se lhes proíbe o exercício da advocacia, não pode o Estado contar com prática de litigio, pelo que, quando representam o Estado em tribunal o resultado é, na grande maioria dos casos, negativo. Tendo em conta a diversidade de matérias que lhes é dada a analisar, obsta-se à especialização, pelo que não conhecem como seria desejável a complexidade de leis hoje ordenadoras da gestão pública. Junte-se a isto, que a contenção de despesas implica menos formação, o que resulta em menor qualificação.
Em suma, há até muito boa gente que está consciente que autorizará procedimentos, actos e despesas, e que, caso contenham erros de tramitação e/ou procedimentalização, e haja, por causa disso, lugar a indemnizações de terceiros, será o seu património a responder. Razão porque assumir um cargo de direcção é hoje, não um prémio, mas um ónus. Que nem todos estão dispostos a assumir.
A velha ideia dos jobs for the boys ruiu. Resta-lhes duas alternativas: ou se fazem assessorar por técnicos especializados ou, recusem a oferta e sugiram o nome do vosso pior inimigo. Porque o convite pode vir a revelar-se um presente envenenado!

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

A PROPOSTA DE ALTERAÇÃO DA RESPONSABILIDADE FINANCEIRA DOS AUTARCAS

O presidente do Tribunal de Contas apresentou as suas críticas e exigiu ser ouvido pelo Parlamento a propósito da proposta do Orçamento do Estado para 2011, que contempla uma norma que, na sua opinião, "desresponsabiliza" financeiramente os titulares de órgãos autárquicos pelos seus actos de gestão. Trata-se da alteração ao artigo 61.º da Lei de Organização e Processo do TC que equipara, para efeitos de responsabilidade financeira, "os titulares dos órgãos das autarquias locais aos membros do Governo". Segundo Guilherme de Oliveira Martins, a norma é incoerente já que as câmaras municipais e as juntas de freguesias são órgãos que prestam contas e que a consequência directa da eventual aprovação da alteração será a ausência da efectiva responsabilização financeira dos titulares de órgãos autárquicos e a perversão do sistema de responsabilização financeira, para além de que obrigará a rever o quadro de competências dos órgãos dos municípios e freguesias, "sob pena de disfuncionalidade de todo o sistema".
A Associação Nacional de Municípios defende, através do seu presidente, que não se trata de "desresponsabilizar" os autarcas pelas suas decisões, mas sim de que os autarcas só respondam quando tomem decisões contrárias a pareceres fundamentados, supostamente vindos dos técnicos dos serviços autárquicos.
Não me vou pronunciar sobre a forma estratificada e fortemente hierarquizada do TC nem sobre a inabilidade, uma vezes, e a impossibilidade, outras, de recolha de prova pelos auditores no terreno - que, na generalidade dos casos, resulta no arquivamento dos processos em sede de apreciação da culpa pelo Ministério Público - nem sequer me pronuncio sobre as sanções incompreensivelmente baixas na proporção dos ilícitos praticados ou na possibilidade de pagamento voluntário das coimas por quantia irrisória.
Do alto do seu estamine, os preconizadores da medida ou contornam uma questão nuclear, conhecendo-a, ou simplesmente esquecem-na, por desconhecimento: quem fará os tais “pareceres” fundamentados que justificarão os actos dos autarcas e os desresponsabilizarão. Primeiro, como consultora na área da contratação pública, conheço algumas autarquias, e sei que, muitas delas, não têm pessoal técnico apetrechado dos conhecimentos para fazer um trabalho que seja uma “espécie” de parecer – razão porque são os consultores externos (lembrando que poucos advogados, à excepção dos conhecidos consultórios de especialistas em Direito Público, dominam o acervo de legislação administrativa e autárquica a que acresce a complexidade do Código dos Contratos Públicos) a elaborar tais pareceres. Já se adivinha a pressão para se escrever isto ou aquilo consoante o fim que se pretenda – o que presume que primeiro se conheça a conclusão querida e só depois se teça o raciocínio, num enviesado que vai do silogismo para a premissa – o que nem me perturba tanto como isso, desde que o se queira praticar seja um acto lícito e de interesse para a autarquia. Mas para o consultor externo nem é assim tão grave, já que tem liberdade para expor várias soluções e discutir com independência técnica as questões perante os responsáveis. Fico a pensar é naquelas autarquias em que existem técnicos a quem vai ser “encomendado” um parecer para sufragar esta ou aquela decisão e na pressão que sobre os mesmos será feita para produzirem um trabalho que legitime decisões nem sempre defensáveis à luz do Direito, a par do dever de acatar ordens e, nalguns casos, do temor reverencial, acompanhada das consequências de não fazerem o jeito às chefias, ou de, fazendo-o, e, havendo responsabilidade civil extracontratual e disciplinar sobre o acto praticado, sobre eles recair direito de regresso e processo disciplinar em conformidade.
O que me suscita uma constatação: atendendo ao número de técnicos autárquicos superiores e ao ainda menor número que detém massa critica ou liberdade para contrapor soluções e questionar ordens, a aplicação da norma agora proposta no OE pode vir a ter um efeito pernicioso – a criação de um segmento especifico de funcionários sobrecarregados e sobre os quais hão-de recair pressões e responsabilidades acrescidas. E que são dos piores pagos na Administração Pública. É como dizia Calimero: é uma injustiça!

terça-feira, 9 de novembro de 2010

PASSOS COELHO: AUDITORIA DO TRIBUNAL DE CONTAS À E.M. ACÇÃO PDL – A OPORTUNIDADE DE APLICAR JÁ A SUA PROPOSTA DE CRIMINALIZAÇÃO

Pedro Passos Coelho tem sido criticado pela sua ideia quixotesca (não pela intenção mas pela sua inexequibilidade) de responsabilizar criminalmente os governantes. Como ficou evidente que PPC nem sequer tem a ideia do que é a responsabilidade criminal, dispararam reparos jurídico-constitucionais com arrazoados muitas vezes incompreensível pelos leigos.
Uma notícia de hoje deu-me o mote. E já que, ao que parece, faltou às aulas ministradas na Universidade de Verão do PSD por Guilherme de Oliveira Martins, Presidente do Tribunal de Contas, e tão-pouco conhece o conceito de responsabilidade financeira, aproveito-a para lhe a exemplificar com um caso concreto.
O Tribunal de Contas, numa actual auditoria identificou várias irregularidades na gestão desenvolvida pela empresa municipal Acção PDL, uma sociedade anónima criada pela Câmara Municipal de Ponta Delgada (liderada pela líder do PSD/A, Berta Cabral) que gere investimentos nas áreas de urbanização, requalificação urbana e habitação social. Da lista das irregularidades consta que, relativamente a gestão de obras, o projecto do Parque Urbano de Ponta Delgada, orçado em 15 milhões de euros, previu a construção de um pavilhão multiusos e de um complexo de piscinas, que não foram executados mas em que o dinheiro se gastou num driving range e num club-house, para além de falhas contabilísticas, valores incorrectamente declarados e documentos em falta. Constatou-se ainda que a autarquia criou uma outra sociedade anónima, a Cidade em Acção, cujas tarefas se sobrepõem, parcialmente, às da Acção PDL. Através destas duas empresas, a autarquia contraiu, até 30 de Setembro de 2009, dívidas superiores a 20 milhões de euros, admitindo-se que sejam mais avultadas e estejam ocultas devido à ausência de informação consolidada. E o anexo ao balanço e à demonstração de resultados não contém informação relativa aos "compromissos financeiros futuros" firmados entre 2009 e 2010 e que ascendem a 37 milhões de euros. Apesar disto, os responsáveis afirmam que estão satisfeitos, que foi mínimo o número de irregularidades detectadas e que não implicam responsabilidade pessoal de nenhum dos administradores.
Berta Cabral terá também faltado às aulas, o que se compreende já que era destinada a jovens. Já compreendo menos bem que a Passos Coelho nem sequer tenham mostrado os power-point. Quando, dentro do mesmo partido, temos opiniões tão dispares fica óbvio que uns conhecem as lacunas do sistema que eles próprios criaram e que outros, aqui incluindo o seu líder nacional, venham, com manobras de populismo, esgrimir com um ordenamento jurídico consolidado apenas no seu imaginário.
Contarão com o desconhecimento do “povo”, enquanto “massa anónima de votantes” – como ouvi durante anos um dirigente do PSD dizer de viva voz – mas talvez fosse providente contarem também com o conhecimento de algum desse “povo”. É que, uma coisa é certa, ainda que não se chegue ao ponto de subscrever as palavras de Francisco Lopes que já disse que “Pelas palavras, certamente inconsequentes do Presidente do PSD, sobre a sujeição dos responsáveis da situação do país à justiça podia parecer que Cavaco Silva fosse chamado à Justiça. É difícil encontrar quem tenha mais responsabilidades.”, apoiando-se no número de anos – 15 – em que Cavaco Silva exerceu cargos políticos em Portugal, Passos Coelho pode começar já a aplicar, na prática, aquilo que tanto defende, em teoria, “propondo” a Berta Cabral que se demita de funções e que renuncie a todos os cargos políticos e que, em regime de voluntariado, comece, a suas expensas, a equacionar o tal regime com que sonha PPC, e, abrindo mais uma excepção de cariz jurídico-penal, propor a aplicação retroativa da afamada criminalização voluntariando-se às sanções que o seu líder partidário defende.
Todos tentámos explicar a PPC que a aplicação do sistema que defende esvaziaria o partido, o que ele terá entendido – senão mesmo equacionado antes de lançar a público a sua ideia – o que significa que poderá renovar o partido de alto a baixo – e provavelmente será mesmo isso que pretende. Começando já com este caso actual. Ensinaram-me as dominicanas que quem foi bafejado pelo factor sorte não a deve desperdiçar ao jogo, sob pena de receber, em contrapartida, azar. Passos Coelho teve sorte em chegar a líder dos sociais-democratas mas vai jogando e perdendo. Em primeira instância, dir-se-á que conhece mal – se for mesmo um “ovo kinder” – ou que conhece até demasiado bem – se for um bom aluno do mestre – o seu partido. Em última instância, o tal “povo” que nada percebe e tudo engole vai escasseando ante o império da informação e do acesso ao conhecimento. E é esse mesmo “povo” que vai esperar sentadinho pela sua atitude concreta no caso em análise. E, a partir dela, concluir pela categoria em que o decidirá inserir: um “ovo kinder” ou pupilo de Maquiavel?!

sábado, 6 de novembro de 2010

VENCIMENTOS DOURADOS EM TEMPOS APOCALIPTICOS

Obviamente que os vencimentos dos administradores da Fundação Cidade de Guimarães têm de ser reequacionados à luz dos vencimentos dos seus congéneres, mas sobretudo à luz da política de contenção que o País atravessa. Mas a primeira nota de preocupação vai para o descontrolo - neste caso em grande parte devido à omissão (não lhe chamemos sonegação, para não carregar o tom do discurso) de informação do Conselho Geral da Fundação, do Estado – legitimado pela permissividade legal do regime jurídico que às mesmas assiste. As palavras da Ministra da Cultura, Gabriela Canavilhas, têm de ser contextualizadas neste quadro. Esta só terá tido conhecimento das quantias envolvidas quando preparava o orçamento. Não tenho dúvidas quanto às suas palavras, Canavilhas tem fama de ter pulso firme e creio que dificilmente anuiria a ter, no âmbito da sua tutela, administradores [da Fundação] que ganhem (até) mais do que ela própria (o presidente aufere 14 mil euros e os dois vogais, cada um, 12 mil euros).
Esta (grave) omissão do Conselho Geral da Fundação assenta fundamentalmente no facto de o Ministério da Cultura não participar da contribuição retributiva, pelo que tem todo o sentido defender um modelo das fundações em que haja uma partilha da responsabilidade [do Estado] com a sociedade civil (como é o caso da Fundação Serralves). Qualquer ente civil, independentemente da sua designação, que beneficie de fundos públicos seja controlado, na devida proporção, pelo Estado. Estamos claramente aqui perante uma figura similar àquela que o direito comunitário designa por “organismo de direito público”, já assimilada pelo direito interno, designadamente, no Código dos Contratos Públicos, e adoptada para efeitos de validar a actuação inspectiva dos serviços inspectivos competentes, no caso a Inspecção-Geral das Actividades Culturais e a Inspecção-Geral de Finanças, e de auditoria, nomeadamente o Tribunal de Contas.
Atribuir dinheiros públicos e depois não os poder “perseguir”, perder-lhes o rasto, é um absurdo do ponto de vista do financiamento e da verificação da regularidade da aplicação dessas verbas. Sobretudo porque se está a sobrefinanciar numa área (a da cultura) em que a contenção de verbas assumiu o rosto de uma guilhotina para alguns dos nossos ex-libris nacionais, caso do Teatro Nacional S. João – que estava já antes desta “financeiramente doentíssimo” e que, ao que parece poderá ser objecto de uma operação de salvamento por um novo mecenas, a ANA -- Aeroportos de Portugal. Um caso dramático em que já não há dinheiro para a programação, nem para o funcionamento do dia a dia. Pelo que conheço, enquanto consultora e auditora na área, a integração deste teatro e do Nacional Dona Maria II na OPART (Organismo de Produção Artístico, E.P.E.), poderá ser o balão de oxigénio em falta.
Não propriamente na Cultura mas lá por perto urge deitar a mão à situação ofensiva verificada na RTP, com quadros a auferirem 15.000 euros por mês, “quase o dobro” do Presidente da República. O que levou já o ministro dos Assuntos Parlamentares a admitir que “não deve haver temas tabus” e que se deve reponderar “quais são os níveis justos e proporcionais dos vencimentos no sector público empresarial”. Alguns quadros da RTP ganham 15.000 euros/mês e há assessores e consultores que recebem 8.600 euros.
Em suma, deixam-se dois exemplos de aplicação dos dinheiros públicos – o da Fundação Cidade de Guimarães e do da RTP – que mereceriam uma atenção redobrada. O uso dos dinheiros públicos, independentemente das vestes de que se revista, deve ser repensado em toda a linha, desde o momento da sua atribuição até à justificação da sua aplicação. E só podemos ficar apreensivos quando se constata que uma parte significativa dessa aplicação se faz com a atribuição de vencimentos de quadros e de gestores que, tendo em conta os tempos difíceis que vivemos, literalmente, podemos qualificar de escandalosos.
São “faces ocultas” apadrinhadas pela Lei, reconhece-se. São vencimentos de “pleno direito”, sabe-se. Mas então que se alterem as leis, porque quando a lei é ela própria subversiva, torna-se premente fazê-la cair. Se, por um lado, se criam novas leis, quase diariamente, para espartilhar a vida dos que mais precisam, e, por outro, continuam vigentes leis velhas que legitimam a abundância e o desperdício dos mais beneficiados, o Estado corre o risco de ser visto como um cavaleiro do Apocalipse, com a particularidade de vestir de preto, para uns, e de dourado, para outros. Um anjo da desgraça para uns e um anjo da graça para outros.

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

INSURGEM-SE AS VOZES “CONTRA O FIM DA ACUMULAÇÃO DE VENCIMENTOS E PENSÕES”

Muitos portugueses disseram “finalmente” quando na quinta-feira o Governo anunciou que vai proibir a acumulação de pensões com salários na Função Pública. De facto, numa época de grande contenção não me vêem à lembrança argumento de maior para alguém se insurgir contra a medida. E dei comigo a pensar que esta era uma das medidas que mereceria a aprovação de todos. Enganei-me. Agradar a gregos e troianos é impossível.
Trata-se de uma medida, já aprovada em Conselho de Ministros, cujo âmbito de aplicação inclui não somente antigos políticos mas também todos os que desempenharam funções públicas e que recebam uma pensão por essas funções, paga pela Caixa Geral de Aposentações, por Fundos de Pensões ou pela Segurança Social. Resumindo, atingirá o bolso de deputados, autarcas, ministros, políticos, gestores de empresas públicas, médicos, magistrados e os demais que acumulem pelo menos uma pensão de reforma e um salário na Função Pública. Sim, pelo menos uma, já que todos conhecemos quem tenha cinco, seis e sete.
Num primeiro momento, o Governo terá ponderado aplicar a medida para o futuro, perante o espectro de uma eventual declaração de inconstitucionalidade por ser aplicada retroativamente a direitos adquiridos, mas depois terá equacionado que, se o argumento já visado pelo Tribunal Constitucional relativamente à retroatividade dos impostos, e outros com os quais espera fazer vingar a medida de subtracção dos vencimentos dos funcionários públicos, designadamente o do “interesse público”, servirão igualmente para validar a medida.
Infelizmente para os próprios, Manuela Ferreira Leite e Cavaco Silva, são alguns dos titulares de cargos políticos que, a partir de Janeiro, não poderão mais acumular as respectivas pensões com os actuais salários. Evidentemente, uma enorme maçada! E ergue-se já um coro de vozes solidários e preocupados com estes e outros que tais. A começar pelo Presidente do Governo Regional da Madeira, Alberto João Jardim, que veio a público chamar o Estado português de “ladrão". E mais diz que é "caso de tribunal", não sem, em simultâneo, criticar o Tribunal Constitucional por estar "desacreditado" desde que deixou "passar a retroatividade dos impostos".
Sabemos, pois, que existem, no mínimo, três cidadãos indignados com o Governo. Por acaso, dá-me na gana de dizer que, para compensar, nós por cá, até estamos agradados. E, como se sabe que o Estado desconhece quantos cidadãos usufruem de tão justiceira medida, apetece-me até dizer: para uns será uma maçada, para outros será uma caçada. E desejar aos últimos bom tiro ao alvo e certeira pontaria. O povo agradece.

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

A CENA DO ORÇAMENTO – VISTA POR FORA (E POR DENTRO?)

Intervalada a novela do Orçamento de Estado, esquecendo o caricaturismo de algumas cenas que ficarão lembradas na forma de fazer política em Portugal (ir a casa de um dos protagonistas, a fotografia saída do telemóvel de um deles, numa inédita “privatização” da vida pública), achei interessante partilhar convosco uma certeza: se nós andámos baralhados com as jogadas fará os de “fora”. Refiro-me à imprensa internacional que põe em evidência o ressurgimento de tensões durante a apresentação do acordo no Orçamento para 2011.
O Wall Street Journal afirma que o entendimento "após controversas semanas de intensas negociações" se deveu às cedências de ambas as partes a fim de se evitar uma crise financeira e política, destaca as críticas de Teixeira dos Santos relativamente às exigências do PSD e as repercussões orçamentais decorrentes das mesmas. E acaba por concluir que a solução foi a possível já que o chumbo do OE poderia levar à queda do Governo e a uma crise que muito provavelmente obrigaria Portugal a "seguir o exemplo da Grécia", pedindo ajuda à União Europeia e ao Fundo Monetário Internacional.
O Financial Times retira a mesma conclusão e é assim que justifica o acordo após "várias semanas de tensas negociações", embora acresça que a tensão ressurgiu no sábado, depois da cerimonia de assinatura do protocolo ser cancelada à última hora e de se ter optado por declarações separadas, realçando que o ministro das Finanças "criticou o PSD por não apresentar propostas adicionais de cortes na despesa para compensar a perda de receitas" resultantes das medidas de que fez condicionar o acordo.
"Portugal evitou um possível colapso do Governo após os dois principais partidos terminarem no sábado um mês de impasse quanto ao orçamento do próximo ano", titula o New York Times, destacando o facto de José Sócrates ter ameaçado com a demissão várias vezes, na eventualidade da não aprovação do OE na Assembleia da República, concluindo que o acordo irá forçar o Governo a encontrar soluções alternativas para atingir a meta do défice.
A agência financeira Reuters salienta também que o acordo visou evitar uma crise política e financeira e qualifica Portugal como um dos membros da zona euro mais frágeis financeiramente, após um impasse que "ameaçou deixar o país paralisado", não deixando de concluir, como os demais, que a inexistência de um acordo "poderia obrigar o Governo a procurar um apoio financeiro nos seus parceiros europeus, como a Grécia fez no ano passado”.
Seria de pensar que, no plano internacional, os comentadores, os economistas e os politólogos, com a assinatura do acordo, tivessem sossegado os mercados e os parceiros internacionais. Mas segundo Nouriel Roubini (o economista que previu a última crise financeira), Portugal e a Irlanda acabarão por ter o mesmo destino da Grécia. "Apesar do plano de resgate anunciado, apesar das ajudas à Grécia e apesar dos testes de resistência à banca, as dívidas dos países periféricos continuam a apresentar problemas. E o crescimento económico na Europa, especialmente nos PIGS, vai ser muito baixo e inclusivamente negativo. O panorama assusta", afirmou entrevista ao ‘El País'. E afirma que "com dívidas tão altas e com os planos de austeridade, a deflação é um risco sério", antecipando que "países como a Grécia vão ter que reestruturar a sua dívida e isso provocará uma nova crise orçamental" e que esta "já não é uma questão se vai acontecer, mas apenas quando". Concluindo, aponta o dedo, dando-os como culpados da difícil situação dos países periféricos, o Banco Central Europeu (BCE) e a Alemanha. "A teimosia do BCE, que se empenha em ver fantasmas de inflação, é um desastre para a Europa e em particular para os países periféricos", disse. E avisa "quando o euro atingir os 1,60 dólares desaparecerá qualquer possibilidade de recuperação, e provavelmente veremos outro país a pedir um resgate como fez a Grécia. Portugal e Irlanda são os países pior situados". Já Espanha, refere, "está muito melhor que a Grécia, e melhor que a Irlanda ou Portugal", apesar de que "tem uma dívida privada enorme, um desemprego muito elevado que não vai baixar no médio prazo e uma bolha imobiliária".
Por cá ficámos com a ideia de que o risco de nos vermos governados pelo FMI desapareceu com a aprovação do Orçamento. Por lá, ficaram com a ideia de que apenas conseguimos adiar o inevitável. No entretanto, resta-nos “conquistar Portugal”. É chegada a altura de, plagiando John F. Kennedy, cada português apontar para si mesmo e para o outro e dizer " Não perguntes o que o teu País pode fazer por ti, mas sim o que tu podes fazer pelo teu Pais".

DILMA – UM POLÍTICO EM PORTUGAL PODE ARRISCAR O SEU PERFIL?

Podia começar por falar do simples facto de, abrindo novos caminhos à História e aos precursores do feminismo, contando com o voto de mais de 55 milhões de brasileiros (56%), Dilma Vana Rousseff, aos 62 anos, se tornar a primeira mulher presidente. Nem os USA chegaram ainda tão longe e nem o tentaram tãopouco. É um facto político marcante. Mas prefiro falar do estilo de política que se faz no Brasil. Em certa medida, sabe-se que é uma cópia do marketing político americano “com as devidas adaptações”. Ouvimos Dilma, com um discurso passional, emocional, apelando ao coração dos votantes e prometendo-lhes algo mais ou menos próximo da “felicidade”.
E não posso deixar de constatar que os nossos políticos, espelhando o que nos vai na alma, fazem os possíveis por parecer tristes, desesperançados, nostálgicos. Até aí, compreende-se. E, naturalmente, não fazem grande esforço. (O riso pode prejudicar, e muito, uma carreira em Portugal.) Não arriscam sair do perfil cinzento, apagado, acabrunhado, macambúzio, porque foi sempre esse o retrato da classe dirigente no nosso País. Deve até ser a primeira coisa que os mentores ensinam aos pupilos: o dress-code e – quando muito se a situação o exigir – um sorriso, mas leve, esboçado – rir, nunca. Pode até ser a morte do artista. Com a mania da perseguição muitos dirão que parece que se ri deles e nem põem a hipótese de um riso ser mesmo apenas isso: rir com e não rir de.
Ora, depois do discurso de Cavaco Silva, sobre o qual já se disse tudo, entristeceu-me aquela parte em que diz que não dá ilusões aos portugueses – numa alusão clara a Manuel Alegre, já que dar sonhos é coisa de poeta e não de economista. Nesse tal perfil, Cavaco bate os pontos. Aquele não era um discurso para dar vida a um povo, era um elogio fúnebre. E aquele ênfase no “eu” e no “eu fiz”, dá mesmo a ideia de alguém que tenta, mesmo que à força, justificar o seu papel e dar-lhe a maior importância possível.
Cada vez se percebe mais que o grande defeito apontado a Manuel Alegre, para além de ser poeta, é ser um homem comum. Que se entristece e preocupa. Mas que nos transmite força, espírito de combate e resistência, e esperança. E que ri como “normal” que é.
E é, sobretudo, o facto de este ser um político que arrisca a normalidade sem se dar ares nem se ajustar ao perfil, que tem inquietudes, que tem génio, que tem temperamento, que incomoda imenso determinadas hostes de políticos profissionais que, não tendo a menor graça por qualidade nata, ou tendo-a arrumaram-na a bem das suas carreiras, se vêm agora confrontados com um novo paradigma de liderança que pode deitar por terra anos de cinzentismo e de ares carrancudos e de maus modos ou de modos comedidos, consoante os casos.
Num país em que tudo puxa esta tendência nacional para a lamúria e desgraça, a antevisão do que podem ser os próximos cinco anos com Cavaco Silva na Presidência arranca-me da alma um suspiro que mais parece um fado – e fado não é algo para se ouvir a qualquer hora, nem em qualquer momento.
Aquela “conversa em família” de Cavaco Silva mostrou um homem ainda mais cinzento que o costume, ainda mais sério que o costume, ainda mais enfadonho que o costume, na convicção de que os portugueses – dados à nostalgia e uma certa forma de melancolia – num momento como este, ainda apreciariam melhor aquelas (in)qualidades.
Por mim falo, ter como Presidente alguém que me coloca perante um cenário de terror – e até de temor: onde estaríamos sem os seus avisos? – é a última coisa que ver concretizar-se.
Já que, como povo, não estaremos ainda preparados nem para ter uma mulher na Presidência e muito menos alguém que ri, faz humor, e se emociona, façam-me um favor: mostrem que, ao menos, estamos preparados para ter um homem que é igual a todos nós. Sem se dar ares e estando-se nas tintas para o dito perfil. Que ria e que chore. Um Presidente-estátua – ainda ontem Marcelo Rebelo de Sousa dizia que Cavaco era a única variante previsível na conjuntura nacional (os homens “normais” são previsíveis? – consta que não) – é que não. Que dessas está o País cheio e que se saiba são feitas de pedra e não têm sítio reservado para o bater do coração. Estátuas é que não! Façam-me o favor!