quinta-feira, 18 de março de 2010

Jobs for the boys: Quem atira pedras?

Sousa Franco dizia que uma das preponderantes a equacionar relativamente à questão da clientela política, aos “jobs for the boys”, é que foi Guterres a falar em “no jobs for the boys”, até porque, como dizia Jorge Coelho, os “boys” já estavam nos “jobs” quando o PS chegou ao Governo. Não estava contra os “jobs” apenas por estar, como uma atitude generalista. Disse mesmo que "as chefias da administração pública e do sector público empresarial eram — e em boa parte ainda são doentiamente partidárias." Era, então como hoje, necessário tirar os “boys” dos “jobs” para colocar pessoas competentes. Provando que este é um problema de sempre, o programa do PSD de Passos Coelho prevê “provas” para titulares de altos cargos, o que quer dizer que todos os dirigentes que venham a ser nomeados pelo Governo, desde as entidades reguladoras aos institutos públicos e empresas de capitais públicos, teriam de “prestar provas curriculares” perante o Parlamento. Isto se a proposta passasse, PPC fosse a PM ... e, por aí fora. PPC não pode ser assim tão naif. Pretender que houvesse uma prévia discussão curricular pública dos nomeados para cargos públicos como forma de pôr termo aos jobs for the boys é uma utopia. PPC não deve ignorar que o PSD foi useiro em colocar os seus testas-de-ferro nos sítios convenientes. Fê-lo desabridamente e ainda hoje, espante-se, muitos lá continuam. Por uma razão ou duas talvez. Poucos por serem competentes. Quase todos porque são igualmente subservientes e coniventes com o Poder, independentemente de quem o ocupa. Essa é a exacta medida da sua independência. Há até casos em que dirigentes de reconhecida incompetência que foram postos pelo PSD nas suas alegres casinhas lá continuam hoje, mantendo a sua reconhecida incompetência. Não é assim tão difícil chegar ao topo, a maior arte é continuar lá, agradando a gregos e troianos. José Reis Santos, no Diário Económico, de 17.Março, fala da temática. Acontecimentos recentes relembram a expressão de António Guterres quando, referindo-se à herança cavaquista (que tinha partidarizado ferozmente o aparelho de Estado), disse que não haveria – no seu governo - ‘jobs for the boys’. Os boys estão em todo o lado e não são um exclusivo partidário. Em comum, apresentam-se como jovens de duvidosa credibilidade, sedentos de poder e famintos de influência. O sistema político português vive de e para os ‘boys'. São o pessoal de confiança política dos detentores de cargos públicos e só os que vêem irrealistamente os meandros da política e insistem em portar-se como neofitos é que pode acreditar que aos políticos é indiferente ter na sua ‘entourage' pessoas do seu partido ou de outro qualquer. Os ‘boys' nascem e são educados "no caldo dos partidos, nas suas juventudes partidárias, onde adquirem uma sólida cultura política e uma forte rede de relações partidárias." Quando estão agregados ao poder reinante fazem uma vida à grande e comportam-se como estagiários: putos(as) e música. A sua intíma ligação à vida nocturna provém de uma rica vidinha pós-tarde com os seus amigos de sorte. A Capital era uma réplica do Conselho de Ministros, mas nivelada por baixo: adjuntos, assessores, secretários(as) e afins. Peritos em boa-vida. Na sua maior parte sujeitos de uma herança genética com direito a tal. Pais, tios, padrinhos legitimavam a transferência de poder geracional. Produziam legislação e regulamentação desgovernada, desatinada, surrealista. Findo o período de boa sorte regressam a sítio nenhum, porque não têm onde regressar nem ao que regressar. Abrem ou agregam-se a sociedades de negócios e a escritórios de advogados, sabendo-se que a sua mais-valia é apenas uma: fornecer clientela angariada quando estavam em grande. Os seus nomes valem apenas isso: são ex-tudo. Diz-se até que é quando saem do poder e entram na oposição que começam realmente a fazer bom dinheiro. Cobram favores feitos quando estavam no exercício daquelas importantíssimas funções. Entretanto, acumularam pós-graduações, mestrados e doutoramentos. Permitiu-lhes o excesso de tempo disponível e o contacto privilegiado com académicos que actuavam como peritos e consultores nos gabinetes que estes "frequentavam". Estranha-se mais que se mantenham em funções os nomeados de um outro partido, quando nem com um nem com outro mostraram qualquer obra feita, continuando a depositar neles uma confiança que lhes foi creditada por outros. Continuaremos sem perceber algumas nomeações feitas para cargos públicos, Administração Pública stricto sensu ou máquina do Estado, lato sensu, incluindo institutos públicos, empresas públicas ou semi-públicas. Mas uma maior profissionalização da vida política não equivale a uma maior partidarização do Estado. A lei que faz depender a nomeação dos dirigentes de um concurso público é uma metáfora. Eu própria abri e fechei muitos concursos com fotografia e em que tive de defender a adequabilidade do perfil ao cargo, quando dificilmente se percebia alguma. Este é um que nunca foi nem nunca será jogado a claro. Sabe-se quem nomeia mas desconhece-se porquê. E o facto de ser com suposto conhecimento prévio e depender de processos públicos e publicitados em nada altera a situação. Propõe-se que a Assembleia da República e as bases da Net que publicitam a contratação pública prevejam um site de que constem as nomeações do executivo; e o Parlamento deveria ter o poder de confirmar as nomeações susceptíveis de provocar maiores estragos, como as empresas públicas empresariais ou aquelas em que o Estado é accionista. Sem esta publicidade, desconhece-se o número de jobs for the boys (sem esquecer os casos conhecidos de jobs for the girls), e o despacho de nomeação que - medida recente - se faz acompanhar de um pequeno currículo vitae passa despercebido entre as últimas páginas do Diário da República. Mas, deixem-se de coisas, a política precisa mais dos boys do que estes precisam dos jobs. E se não houvesse boys nos jobs não haveria cunhas. E esse é um instituto jurídico absolutamente necessário a muita gente da nossa praça. A lembrar Vítor Direito que um dia escreveu no República antes do 25 de Abril: "Manhã de nevoeiro transforma a cidade (…) Não se vê um palmo à frente do nariz (…) Andam por aí certos senhores, feitos meteorologistas de trazer por casa, a prever 'boas abertas'. Mas o nevoeiro persiste."