quinta-feira, 4 de março de 2010

À procura de um homem perfeito!

(Re)Ouvi, no You Tube, O "Homem Perfeito - Verso - Jô Soares". Mais ou menos com este texto. "O homem perfeito é lindo tem um pouco de mistério é belo quando está rindo é belo quando está sério O homem perfeito é bom tem um jeito carinhoso quando fala, em meigo tom causa arrepio gostoso O homem perfeito é fino é solícito, é fiel tem a graça de um menino e é mais doce que o mel O homem perfeito adora dar flores, botões de rosa, a uma velha senhora Ou uma jovem formosa O homem perfeito tem energia, não se cansa, lava louça, cozinha bem, gosta muito de criança O homem perfeito é sensível à grande arte gosta de dança e ballet Nunca haverá de magoar-te Para encerrar a preceito estes versos que alinhei: se existe um homem perfeito,o filho da p*** é gay."
Uma das verdades que dou por assumidas. Ninguém sabe ser maior cavalheiro. Nenhum sabe ser tão homem!
Em "As 35 regras para conquistar o homem perfeito", de Ellen Fein & Sherrie Scneide, um livro que esgotou prateleiras e fez escola na pseudo-arte da sedução. O livro transporta-nos para uma história encantada, de princesas confiantes e de principes montados num Pégaso, cavalo alado branco, que rasga o céu e vem de arremesso à terra, salvando-nos desta torpeza solitária do dia-a-dia. A tese defende o regresso às velhas táticas da conquista feminina, que, estou em crer, abririam falência perante os homens novos de hoje.
Outra tese absolutamente maravilhosa é a "Os homens são necessários? - Quando os sexos entram em choque", de Maureen Dowd (Colunista do The New York Times, vencedora de um Prémio Pulitzer). Não podia concordar mais com ela. Até porque diz que não sabe se complicou demais a simplicidade deles ou se simplificou demais a sua simplicidade.
Mulheres e homens foram deixando de estar em colisão desde que diminuiu em nós o desejo de independência intempestiva, que se baseava numa cultura de décadas seguintes, em que as mulheres se reacomodaram à vida doméstica e à submissão, tendo como modelo as nossas mães tão supostamente perfeitas. Com a Revolução Sexual, as mulheres rebentaram com os casulos dos anos 50. O espírito da Era do Jazz ressuscitou com a Era de Aquário. Voltámos a este acto preconceituoso de imitar os gestos masculinos como se nos aumentassem uma inconsciente supremacia de atitude: fumava-se, bebia-se, queria ganhar-se tanto dinheiro como eles, enganávamo-nos com a ilusão de que a pílula nos dera “o direito de serem sexuais”.
O mundo feminino ía das feministas agressivas às admiradoras do prazer (estilo Carrie Bradshaw, de Sex and the City), entre jeans sujos e unissex, visual cara lavada, drogas e um interesse inexplicável por danças em que não se tocava no sexo oposto.
No universo de Eros, sonhava-se com estilo e audácia, adorava-se o encanto art déco dos filmes dos anos 30, dançava-se como Fred e Ginger em suítes de hotel branquíssimas, bebia-se martínis e vivia-se a vida de uma heroína excêntrica - qual Katharine Hepburn, com um elegantíssimo vestido de lamê dourado com uma racha malandra na lateral - saltitava-se pelas ruas com Cary Grant, caminhava-se na Quinta Avenida com leopardos de estimação.
Às vezes, assemelhamos estes felinos aos homens, pela sua capacidade enganosa, lembrando Dorothy Parker, quando escrevia: "Quando estiver em seus braços, Trêmula, ofegante, e ele jurar imortais laços E infinita paixão — Minha filha, atenção: Um de vocês está mentindo." E vêmo-nos como Dinah Brand (a personagem dura e implacável do romance de Dashiell Hammett, Seara vermelha, de 1929), lamentando: “Eu pensava que entendia os homens, mas que nada! São todos uns lunáticos.”
Passámos a Era da Discoteca, das blusas de lurex que espetavam pele contra pele, da idéia de que a ambição era a melhor coisa do mundo, boa, pela década do eu e do umbigo, pelo consumismo yuppie e os bares reservados ao fumo do charuto — fazendo um círculo a partir dos sapatos plataforma e do vestido-envelope de Diane Von Furstenberg.
A nossa relação com o sexo forte foi sempre tumultuosa. Sofremos como Emma (Emma Woodhouse) e, tal como ela, aprendemos que as manipulações são perigosas. O que aprendeu quando tentou transformar a sua amiga, uma mulher simples, Harriet Smith, numa jovem com ambições e aspirações. Tarde demais, a heroína de Jane Austen percebeu que mudara Harriet para pior: antes era humilde depois tornou-se vazia. A literatura dá-nos uma mão cheia de casos que advertem contra as experiências com a identidade — de Dorian Gray a Jay Gatsby, passando pelo talentoso Tom Ripley, cuja máxima assassina era: “É preferível ser um alguém falso do que um ninguém verdadeiro.”
O jogo de aparências a que somos forçados no dia-a-dia e que também pretende conferir algum glamour à simplicidade que nos é nata parece ter dado razão à lógica de Oscar Wilde, segundo o qual “apenas as pessoas superficiais não julgam pela aparência”.
Ora, estas 35 regras para conquistar o homem perfeito, de 1996, tornou-se a bíblia de uma época, que encorajava a mulher a voltar aos jogos do pré-feminismo, trocando o tão cultivado facilitismo e até exposição para com o sexo feminino por uma postura mais inatingível, de alvo difícil (“Limite o tempo das ligações telefónicas a dez minutos, mesmo que você seja a directora da empresa; quando estiver com o homem que ama, seja discreta e misteriosa, aja como uma dama, cruze as pernas e sorria; use ligas pretas e suba ligeiramente a saia para atiçar o sexo oposto!”). Dando, enfim, razão, a Oscar Wilde, que defendia que “em assuntos de importância capital, estilo, e não sinceridade, é essencial”.
Outro livro de leitura obrigatória era o de Zsa Zsa Gabor, Como agarrar um homem, como manter um homem, como se livrar de um homem (“A melhor maneira de atacar um homem imediatamente é ter peitos grandes e cérebro pequeno, e deixar ambos bem à mostra.”). Recomendação da sua homóloga de hoje, Paris Hilton: "Tudo se resume a fazermo-nos de difíceis. Ninguém gostaria de caviar se ele fosse barato.” Muito ao jeito de Scarlett O’Hara, de E o vento levou... : “Fiquei acordada a noite toda tentando resolver qual de vocês é o mais bonito.”, ou de Becky Sharp, de Feira das vaidades: “Mas que criatura esquisita! Como se eu ligasse importância.”, ou até de Gwendolyn Fairfax, de A importância de ser prudente: “Que olhos maravilhosamente azuis você tem! Espero que você olhe para mim assim, sempre, sobretudo quando outras pessoas estiverem por perto.”, ou ao conselho que Alfred Hitchcock deu a Eva Marie Saint, antes da filmagem das cenas quentes no comboio, em Intriga internacional: “Fale baixo. Não mexa as mãos. E olhe o tempo todo bem nos olhos de Cary Grant.”
Dificilmente me rendo às verdades absolutas das verdadeiras sedutoras dos tempos modernos, que resgataram algumas das técnicas básicas das suas avós: um risinho absurdamente adorável, uma mexida estratégica da cabeça, um ar maroto de triunfo, olhos lânguidos e um sólido conhecimento de música, desenho, caligrafia e geografia. Sentar-se numa chaise longue, passar um lenço rendado sobre os olhos e reclamar um sopro de vertigem primaveril.
As mulheres das Ciências terão muito mais facilidade em regressar à Era dos Estratagemas Amorosos. Por mais baixinho que se sussurre, deve ser difícil seduzir alguém que se preocupa apenas com a cotação do dólar ou as taxas de juros. Mesmo que se imitem os miaus calientes de Marilyn Monroe — “Isso soa delicioso” e “Você é tããão engraçado” — e que se usem réplicas perfeitas para recepções sociais.
No interesse público destaco seis axiomas-chaves de Como agarrar e manter um homem, para mulheres que gostariam de se tornar esposas: Não faça gestos abruptos. Os homens são fascinados por objectos brilhantes e luminosos, muitos cachos, muito cabelo (na cabeça), arquinhos, laços, rendas e cores vivas. Se ele tiver uma namorada, torne-se amiga dela. O sarcasmo é perigoso. Evite-o por completo. Ele destrói a aura de doçura, feminilidade e gentileza que você deveria estar tentando cultivar ao redor de si. Evite dizer logo um não. Ao invés disso, procure posicionar-se em lugares de difícil acesso para ele. Sente-se numa cadeira sem braços e estreita, ou mantenha um cigarro acesso entre vocês. Pense sempre em si mesma como num gato suave e misterioso. Para obter o “jeitinho felino” você tem que “ficar relaxada, dobrar levemente os joelhos, apertar o rabiosque, encolher a barriga e soltar os ombros. Para a posição em pé, assuma a postura descrita acima, coloque um pé à frente e apóie o resto do seu peso sobre o outro pé. Quando começar a ficar cansada, troque a posição dos pés, mantendo o peso, sempre, sobre o pé de trás”.
Não sei se resulta ou não, mas ainda prefiro a ideia de encontrar por aí um ser tão perfeito, quase andrógeno, que possa ser retratado nas palavras de "O homem perfeito", do Jô Soares. Enfim, nada que mais uns cinquenta anos a passar por mim não curem!