quarta-feira, 3 de março de 2010

Debate Passos Coelho/Rangel: um KO!

Numa democracia a qualidade da oposição marca o compasso do Governo.
Daí que seja preocupante a sua falta de qualidade, não somente porque se devem eleger os melhores mas porque essa referência qualitativa se afere pelos padrões de exigência ditados pela oposição. Uma oposição tem um papel a cumprir: ser um(a) alternativa ao Poder. O PSD parece ter encontrado um novo rumo com Pedro Passos Coelho e isso ficou claro no debate de ontem com Paulo Rangel.
PPC começou por acusar a direcção de Manuela Ferreira Leite de "incompetência". E disso julgo que ninguém tem dúvidas (a não ser talvez PR, que é seu delfim). O adormecimento da estrutura laranja decorre da prepotência, da omnipresença e omnipotência de ferreiristas, cavaquistas, barrossistas, santanistas, e outros bandos que tais que transformaram o PSD numa sociedade em comandita. Homens como PPC foram sistematica e metodicamente afastados da linha da frente, em prol do populismo, do imediatismo, do facilitismo, da perseguição política e do oportunismo. Se há coisa em que os comandantes destas tribos se plagiam de bom grado é na falta de sabedoria política em congregar facções, pelo contrário, expandem-nas, cultivam-nas. Ser sectário torna-se uma imposição quando se sabe que a liberdade de ideias tem um custo: o ostracismo a tempo, uma solitária travessia pelo deserto, e, por fim, a morte (se necessário, o assassinato) política. PPC está a pôr-se a jeito. Resta saber se de ser o novo lider do PSD e de, com alguma sorte e empenho, ressuscitar o projecto ideológico dos sociais-democratas, ou se cavar a sua própria sepultura (política).
Por muito que digam o contrário, como o faz Henrique Raposo (http://www.expresso.pt/), em artigo de hoje, que considera que PPC foi uma desilusão. Diz que esperava mais do suposto futuro PM. Diz que revelou vícios de "jotinha" e, mais, que tem uma estranha ambição: ser o Guterres do PSD. Sinceramente, não vejo que se possa apontar isso como um defeito. PPC tem um percurso que não enjeita e Guterres foi um marco de qualidade no PS, que monopolizou vários grupos da sociedade, desde intectuais, sociais, económicos e até políticos. Estava até muito bem o PSD se PPC fosse "outro" Guterres. Aponta algumas desonestidades intelectuais a PPC. Quando este insinuou que as declarações de PR, em Bruxelas, sobre a (falta de ) liberdade de expressão em Portugal influenciaram o olhar dos mercados internacionais sobre o nosso país. Não se percebe o espanto! Basta ler os periódicos do dia seguinte para confirmar que, para além de ser um gesto muito feio e que catadupou Rangel na arena nacional, as críticas choveram de vários lados e houve a maior pressão para a constituição de uma comissão de inquérito para apurar a verdade. Ao contrário do que diz Henrique Raposo, isto não "é de uma desonestidade intelectual assinalável". Nem "É politiquice muito baixa". É uma constatação e assumiu contornos de um facto político. Aliás, foi com esse preciso propósito que PR lançou a "bomba". Diz ainda que PPC manteve "o dedo em riste, cheio de ressentimento contra Manuela Ferreira Leite", o que parece absolutamente natural. Afinal, bem diz o povo, Deus quer que sejamos bons, não que sejamos estúpidos. PPC foi crucifixado pela dita e comitiva dentro do próprio laranjal. Muitas laranjas para pouco sumo. Como de costume! E diz, mais, que "não era necessário". Pois é mesmo necessário! Hipocrisia política ser PPC dar a outra face e agradecer a bofetada. "Quem não se sente não é filho de boa gente". Por fim, diz que "Não se percebe muito bem aquilo que PPC quer dizer quando afirma que "quer dar uma mensagem de esperança ao país". Isso quer dizer o quê? Que espécie de optimismo é este? A mim, parece-me um optimismo "socrático" travestido em tons laranja. Tive aquela estranha impressão de estar a ver e a ouvir um segundo José Sócrates. Lamento, mas isto não chega." Não chega por certo, mas olhe que é um sintoma de sanidade política muito interessante. E se já via PPC como outro Guterres, vê-o também como outro Sócrates. Eis como um crítico se desdiz. Tantos defeitos aponta que se volta o dedo para o seu cisco. Ver PPC como dois novos homens e logo homens que galvanizaram um partido é um grande elogio. E, contradizendo a sua análise (política) lógica, afirma que quando PPC diz que é "preciso evitar "rupturas", porque o país está farto da crispação provocada pelo estilo do actual primeiro-ministro.", isto lhe soa "a familiar". E bate na mesma tecla "Foi assim que António Guterres chegou ao poder: com uma mensagem vaga de esperança, e prometendo diálogo a uma nação cansado do estilo duro de Cavaco. PPC quer ser o Guterres do PSD. Lamento, mas isto não chega." Olhe que, se calhar, não chega, mas é capaz de estar muito perto. Pelo bom caminho, pelo menos, PPC vai. E está até já longe do "não sei por onde vou mas sei que por aí não vou". Provavelmente, resultado da sua travessia pelo deserto, PPC teve muito tempo para observar, ponderar, criticar, concentrar apoios, e agora dá e baralha as cartas, com perícia e destreza.
E repare como até quem o critica não o compara a Pedro Santana Lopes, por exemplo, que isso sim seria grave. Muito grave! Compara-o a Guterres e a Sócrates, mas olhe que estes dois, convenha-se, não se sairam nada mal, não acha?
PPC acusou de "incompetência". "Se o PS está no Governo deve-se à incompetência do PSD", afirmou PPC, reafirmando que: "Não pode ser eleito um primeiro-ministro que promete um inferno para o País e faz uma descrição sombria sobre a capacidade dos portugueses para ultrapassar a crise". Ao admitir ter-se posicionado no mesmo sentido do que o Governo, na questão das Finanças Regionais, PPC mostrou que coloca os interesses do País acima das mesquinhices típicas de uma política "a sete caixas", "em pandeireta". Julgava que o PSD admitia a liberdade de voto interna e que não a usava como arma de arremesso, por puro despeito. "Se o PSD quer ter autoridade para dizer ao Governo que não podem ser só os funcionários públicos a pagar a factura não pode viabilizar um aumento da despesa."
Remata, no fim, PPC, implacável, "Se o PS está no Governo deveu-se à incompetência do PSD nessa eleição" e, num rasgo de asa cobiçável, "Conto convosco [actual direcção do PSD] como não quiseram contar comigo". É de homem. De princípe. E de Maquiavel, q.b..
A confirmar as previsões do Porto Laranja, em "O Regresso do Debate Ideológico" com Pedro Passos Coelho - Intervenções, em que PPC afirmava que “O regresso ao debate político e ideológico começa a ser muito necessário dentro do PSD”. “Devemos por isso repensar e discutir os valores em que acreditamos e que justificam a nossa acção politica, saindo um bocadinho das medidas que, de forma avulsa, são lançadas como forma de combater os problemas imediatos. Não percamos a necessidade de saber como é que o mundo vai evoluir e como podemos influenciá-lo.” "Essa gente que, participando nos governos do PSD, o despolitizou, não foi a mesma que fundou o partido e que lhe deu um sentido ideológico. Mas foi, de facto, quem lhe deu as vitórias eleitorais e que, por isso, depois desfrutou dessa condição. O complexo ideológico que tínhamos foi substituído por uma ideologia de poder. Apesar dos valores que essas pessoas também tinham – porque tinham valores – esses governantes do PSD entenderam que era mais importante conquistar maiorias absolutas do que dizer às pessoas o que se devia dizer." “O PSD não deve esperar ganhar eleições no futuro apenas por demérito do adversário, porque, assim, ficaria prisioneiro desse chamado eleitorado flutuante.Temos que dizer às pessoas o que queremos ideologicamente antes de querer ganhar eleições. Se o PSD tiver receio de confrontar as pessoas com as suas opiniões não vai concerteza desejar ganhar as eleições – ou as ganha para depois fazer uma politica que não é a sua, e essa não é a perspectiva das pessoas que acham que estar na política é estar ao serviço das pessoas e da comunidade, tendo os seus pontos de vista.Se existisse uma absoluta ciência na maneira de governar estendida ao sentido de voto do eleitorado, podíamos viver na sociedade ideal em democracia directa e instantânea. O problema está que o eleitorado não responde duas vezes consecutivas da mesma maneira – as pessoas aprendem com as experiências, mudam de opinião e não votam sempre da mesma maneira. Por regra, consultam outras opiniões antes de decidir. Se a nossa escolha for apenas esperar a opinião do eleitorado para lhes dizer o que vamos fazer, o eleitorado nunca reconhecerá em nós capacidade de liderança e preferirá escolher o que já lhe é conhecido ao que lhe é incerto.Faz, por isso, todo o sentido o PSD aproveitar este tempo de mudança para regressar ao debate ideológico e tirar daí consequências e respostas que traduzam a nossa visão do mundo. E, assim, acredito que podemos oferecer ao país uma alternativa bem distinta da governação do Eng. Sócrates e do Partido Socialista, ao mesmo tempo que dizemos às pessoas que podem novamente ter esperança e confiança na sociedade politica e nos seus políticos.Precisamos de voltar a comunicar com as pessoas sem termos medo de cometer erros, mas nunca enganando as pessoas. As pessoas perdoam os erros mas não aceitam ser aldrabadas. Alguém que deliberadamente aldrabe o eleitorado e lhes dê a entender que vai fazer uma politica que na realidade não tem a mínima intenção de realizar, presta um mau serviço estando calado. É melhor dizer o que pensa, e se todos fizermos isso damos um contributo relevante para voltar a por os valores antes dos objectivos que se querem atingir. Depois, é só deixar as pessoas escolher.”“Não vale a pena ganhar de qualquer maneira!”, concluiu Pedro Passos Coelho.
Um reanimador para os AVC constantes e quase-mortais a que o PSD tem sido sujeito pelas sucessivas feiras de vaidades, acrobacistas, trapezistas, e actores dignos de um filme pornográfico de série B - com um grau de exposição e de voyerismo inusitado e despropositado - um "principezinho" que quer encetar novos trilhos. E porque o caminho se faz caminhando este pode ser O Caminho do PSD (sem qualquer alusão à Opus, entenda-se!).
Seguramente que o debate de ontem Rangel/Passos Coelho pode ter sido uma antevisão de um novo PSD e de um novo presidente do PSD. Resta que as hostes internas percebam o que já o povo entendeu. A escolha faz-se entre um animal político de primeira classe, confiante, preparado, a criar um pós/Ferreira Leite, liberal na economia, defensor de uma educação “moderna” liberal, sem medo de se expor a eleições internas (apesar de saber o preço que pagará em caso de derrota), um corte com o cavaquismo e com uma boa imagem televisiva; ou Rangel, agarrado ao passado na educação (defender trabalhos de casa!?), apoiante da intervenção estatal, belicoso, inquieto, inseguro, clivagista, mal preparado, com receio de eleições antecipadas e pouco confiante. Viu-se ontem "O" “velho” Rangel transformar-se no que muitos apontavam ser os grandes defeitos de Coelho. Uma saudável e (in)esperável mudança de papéis!
E a julgar pelas críticas um motivo de preocupação para os socialistas! Afinal, são elas que o comparam a Guterres e a Sócrates. Ou seja, reconhecem-lhe a capacidade e a força para potenciar estragos (no PSD e, se não se acautela o PS, no último mapa rosa das legislativas!). Atente-se no gráfico de sondagens supra-comentário.