domingo, 4 de abril de 2010

PRENDAS: Quando o valor (efectivamente) conta!


Regateei os montantes com que se insinua que o empresário da sucata Manuel Godinho, através de "prendas", enviadas pelo Natal, a centenas de prendas a políticos, autarcas, gestores de empresas públicas e funcionários de organismos do Estado, "comprava" os ditos. O Ministério Público constituiu a lista das "prendas", como uma das provas do «projecto delituoso», já que, as mesmas, seriam um indício demonstrativo da forma como Godinho encarava as suas relações empresariais, estabelecendo uma teia de «cumplicidades». Algumas das "prendas" quase são de um valor tão irrisório que quase que roçam a indelicadez, mas, felizmente, um bonito bouquet de rosas ou uma caixa de bombons suiços "compra-me" com relativa facilidade (já para não falar de um sorriso, um franco aperto de mão, um braço, um beijo caloroso, uma risada ...). Questionei-me, na altura, se eu, que fui justamente acusada de, até há pouco tempo atrás, me comportar como uma virgem num bordel (tal era o meu desconhecimento dos esquemas que proliferam pela Administração Pública), até já via demais. Algumas das ofertas foram avaliadas num valor tão insignificativo que perguntei-me se o diz-que-diz dos subornos (quanto custa abrir uma certa porta ou chegar a alguém com poder decisório) estaria sobreavaliado ou o "mercado" teria sofrido alguma deflacção generalizada. Como a franqueza sai cara (pelo menos enquanto fui funcionária pública, saíu-me muito cara!), evitei comentários de maior e decidi fingir que acreditava. Às vezes, a inocência (ainda que estratégica) de parecer virgem num bordel até é conveniente!
Acabo de ler, no In Verbis, um artigo de MAGALHÃES E SILVA. Elucidativo. Vai na íntegra.
" Estava eu a desempenhar, há escassos meses, as funções de Secretário Adjunto da Administração e Justiça no Governo de Macau, quando, no dia de anos, recebo um jarrão, dinastia Qang, oferecido por Stanley Ho, magnata do jogo e um dos homens mais ricos do mundo... À cautela, pedi para averiguarem, discretamente, o preço. "40 000 Patacas" (4000 €), disseram-me uns dias mais tarde. "Então não posso aceitar" retorqui de imediato. Ao que me opuseram: "Sabe como é que se suborna em Macau um chefe de Secção? Com um Rolex em ouro, que custa 4500 contos (22 500 €). Ora não passa pela cabeça do Senhor Stanley Ho subornar um Secretário Adjunto com um presente de 800 contos. Se devolver o jarrão, então é uma ofensa pública, pois está a recusar algo que para Stanley Ho representa apenas estar a mostrar que é rico e que respeita as autoridades." Dei-me a pensar neste presente quando o PS, por causa de centros de mesa de 1600 €, que se diz ter Manuel Godinho oferecido ao PM, quer que a lei consagre presentes destes como suborno. Nunca pensei que o partido do Governo pudesse achar que havia o risco de o seu Secretário-Geral se vender e por tão pouco. MAGALHÃES E SILVA (ADVOGADO) CORREIO DA MANHÃ 04.04.2010"
Compreendem agora a história que vos queria contar? É lá prenda que se dê a um Primeiro-Ministro, a não ser para efeitos de cortesia! Sem ironia! Alguém acredita, mesmo, que "comprar" a vontade de um PM custa assim tão pouco?! Alguém sabe de alguma subvalorização do euro no "mercado" dos subornos? Se souberem, avisem, porque, definitivamente, O SUBORNO, finalmente, DEMOCRATIZOU-SE! Com ironia, claro!