sábado, 24 de abril de 2010

Visões de Abril, por Campos de Andrada



O major Campos de Andrada foi comandante dos 2800 homens da Polícia Militar, de 11 de Março a 25 de Novembro de 1975. Essa data viria a marcar a sua vida para sempre. Foi nesse dia que lhe foi retirado o comando. Foi detido e levado para a prisão de Custóias, onde esteve incomunicável durante 45 dias.
Era o princípio do fim de uma carreira militar, que terminaria com a passagem à reserva de forma compulsiva e a instauração de 32 processos em tribunal.
O golpe de 25 de Novembro de 1975, que resultou no fim da influência da esquerda militar radical no poder, teve na Calçada da Ajuda um dos episódios mais trágicos. A 26 de Novembro, um recontro entre comandos e militares do Regimento de Lanceiros 2, a Polícia Militar, que Campos de Andrada comandava na Calçada da Ajuda, levou a mortes de ambos os lados.
Hoje, Campos de Andrada fala de "afastamento político". Ao contrário de outros militares, o major ainda não conseguiu ver regularizada a sua situação no Exército. Não foi reintegrado, nem lhe foi atribuída a pensão pelos seus serviços na guerra colonial. Mantém a patente com que saiu da prisão.
Nada mais teve a ver com as Forças Armadas que o seu pai servira como oficial superior. O Exército devolve-o a casa sem colocação e Campos de Andrada vê-se forçado a seguir uma nova vida longe dos quartéis. "Comecei a forrar uns 'maples'", lembra desses primeiros tempos. Depois disso, e graças ao curso de topografia tirado no Exército, fez parte de uma equipa de apoio a câmaras municipais, para estudo e preparação de obras públicas, até descobrirem, conta Campos de Andrada, quem ele era. Foi então que "decidiu ir estudar". Escolheu o Instituto Superior de Engenharia de Lisboa, cujo curso de engenheiro técnico civil despachou em três semestres, graças às equivalências de disciplinas da Academia Militar. Formou um gabinete e "foi ter com uns amigos de câmaras de esquerda". Entre outros serviços, foi o responsável pela estrada para a ilha do Pessegueiro, em Grândola.
30 anos depois do 25 de Abril, quando desafiado a falar sobre a evolução da democracia portuguesa, o major tornado engenheiro civil continua a achar que "não mudou nada" e, tal como nos tempos mais conturbados da Revolução do Cravos, "isto é tudo politizado". "Democracia é governar de acordo com o povo e não é isso que se está a passar. Os partidos têm as suas clientelas e, como tal, servem-nas. O resultado é a bagunça a que assistimos hoje", resume. Campos de Andrada reconhece que o país está muito melhor que há trinta anos. Mas acrescenta que podia estar melhor. "As coisas não se levam até ao fim", afirma.
Assegura que "o 25 de Abril valeu a pena" e que "faria tudo exactamente o que foi feito". Ainda se lembra com orgulho dos carros de combate sabotados no quartel, na madrugada de 25 de Abril de 1974, para que não pudessem atrapalhar as movimentações das colunas rebeldes. Ainda se lembra de seguir na Chaimite "com o Marcelo [Caetano] depois de se render e de ele bater com a cabeça não sei quantas vezes por causa dos solavancos" e "dos tabuleiros de sandes para os militares que as pessoas levavam para a rua". E ainda tem a pistola que tirou a um pide, quando entrou na sede da PIDE/DGS, após a rendição dos elementos aí barricados.