sábado, 17 de abril de 2010

O último episódio da novela "FREEPORT"

O "caso Freeport" estreou em Fevereiro de 2005, com um enredo baseado em informações policiais recolhidas no ano anterior. Dizia o Sol, na 1ª página: "Autoridades inglesas descobrem transferências em dinheiro para personalidades portuguesas". E ainda adiantava que as "autoridades inglesas propuseram à PGR a criação de uma equipa conjunta para investigar o caso Freeport." Na página 7, o jornal noticiava que houve "fluxos financeiros" que vieram de Inglaterra , da Freeport, para Portugal, designadamente, para um escritório de advogados em Lisboa e que "é preciso apurar as razões-lícitas ou ilícitas- dessas transferências de dinheiro". Segundo o mesmo jornal, anos mais tarde, "os ingleses transmitiram que têm indícios do envolvimento de um político português no caso". E foi este o último episódio conhecido. o jornalista e professor de jornalismo, Mário Mesquita, escrevia no Público: "Os actores destes eventos (ou pseudo-eventos consoante os casos) não são, em regra, jornalistas, mas elementos de equipas especializadas em contra-informações que trabalham junto dos partidos ou dos grupos de pressão. Aos jornalistas fica reservada a decisão de lhes dar voz ou de limitar as vias de disseminação do boato".
Os factos era os seguintes: Em 1999, o promotor imobiliário RJ McKinnay pede um parecer sobre a viabilidade de um complexo comercial, nos terrenos da antiga fabrica Firestone, em Alcochete. Em Março de 2002, é aprovado em conselho de Ministros, o DL que altera os limites da Zona de Protecção Especial do Estuário do Tejo. Em Junho desse ano, associações ambientalistas entregam uma queixa à Comissão Europeia contra a alteração dos limites da ZPE e a consequente viabilização do empreendimento. Em Setembro, o DL é suspenso e a C.M. Alcochete começa a emitir as licenças de construção. Em Setembro de 2004 é inaugurado o Freeport. Em Fevereiro de 2005, a PJ apreende documentação na CMAlcochete e nos escritórios da Freeport Leisure e noutras empresas.
No começo do processo, em Fevereiro de 2005, em plena campanha eleitoral, alguém terá "apimentado" um documento oficial, de modo apócrifo, no sentido de comprometer de algum modo, o então candidato José Sócrates, no processo. O semanário Independente, de Inês Serra Lopes, deu o espavento à coisa e assim se criou um escândalo político, à moda portuguesa, e que nunca deu nada a não ser a vitória do PS, com maioria absoluta. Na época, como se refere, a PGR, em comunicado, esclareceu que "os elementos recolhidos até ao momento permitem avaliar que não existe nenhuma suspeita de cometimento, por parte do engº José Sócrates, de qualquer ilícito criminal".
Zeferino Boal, militante do CDS/PP e candidato à presidência da Câmara de Alcochete nas últimas eleições autárquicas, foi o autor da denúncia anónima que originou a investigação da PJ ao caso Freeport, em 2004. JS foi apontado neste processo como estando envolvido na alteração, em 2002, da Zona de Protecção Especial do Estuário do Tejo, enquanto ministro do Ambiente, permitindo a construção daquele empreendimento de Alcochete. Em troca, o PS teria recebido dinheiro para subsidiar a campanha eleitoral para as legislativas daquele ano. A revelação foi feita pelo inspector da PJ Elias Torrão, da directoria de Setúbal, aquando do julgamento no 6.º juízo dos Tribunais Criminais de Lisboa, por violação de segredo de justiça e de funcionário. Contou ET que as informações sobre alegados crimes de corrupção e de participação económica em negócio, envolvendo José Sócrates no caso Freeport, chegaram através de Boal, presidente da concelhia do CDS/PP de Alcochete. No seguimento, informou os superiores hierárquicos, que o terão aconselhado a convencer Boal a escrever uma carta anónima com as denúncias. O que foi feito em Outubro de 2004. A missiva chega à PJ de Setúbal, dirigida a Torrão, e dá origem a um pré-inquérito de averiguações. Em Janeiro de 2005, Armando Carneiro, presidente da administração da Euronoticias, proprietária da revista Tempo, junta na sua casa de Aroeira o inspector Torrão, o antigo chefe de gabinete de Santana Lopes - Miguel Almeida, o advogado José Dias, que trabalhou no escritório de Rui Gomes da Silva, ex-ministro adjunto e ministro dos Assuntos Parlamentares do Governo de Santana Lopes, e o jornalista Vítor Norinha. Segundo ET, todos eram seus informadores. Realizou-se, depois, outra reunião com a inspectora Carla Gomes, titular do processo. À parte deste depoimento, o DN sabe que um dos participantes daquele reunião fez chegar à PJ vários documentos. Um deles foi o diploma do Conselho de Ministros do governo de Guterres que aprovou a alteração do ZPE. A data surge posterior às eleições ganhas por Durão Barroso, e antes da posse deste. Depois daquelas reuniões, regressando ao depoimento de Torrão, começaram as buscas da PJ, nomeadamente ao Freeport e à Câmara de Alcochete, em Fevereiro de 2005. O escândalo rebentou uma semana antes das eleições ganhas por Sócrates. ET foi acusado de ter entregue a um jornalista um planeamento operacional daquele processo relativo à busca realizada a 9 de Fevereiro às instalações da SAE - Sociedade Europeia de Aquacultura. Segundo a acusação do MP, o receptor do documento foi o jornalista da revista Tempo, Vítor Norinha, tendo chegado uma cópia do mesmo ao jornal O Independente - sem que se apurasse como - que o divulgou. Por isso, são também arguidos, com o inspector, a então directora do semanário, Inês Serra Lopes, e o jornalista, autor da notícia, Francisco Teixeira. Vítor Norinha foi ouvido como testemunha, embora a inquirição tenha durado + de 3 horas - um tempo muito superior ao que, no total, foi gasto no interrogatório aos 3 arguidos.
Últimos episódios (salvo possíveis remakes): O Expresso noticia que Sócrates foi ilibado pelos procuradores porque não há provas que liguem o rasto do dinheiro ao PM. Os procuradores do Ministério Público ilibaram JS. O motivo mais determinante para deixar de fora da acusação o PM tem a ver com a falta de provas do rasto do dinheiro. Segundo o semanário, não foi descoberta nenhuma informação financeira a ligar o suposto esquema de corrupção a Sócrates. Chega assim ao fim o braço-de-ferro da PJ com o Ministério Público, que cancelou a ida a Londres para interrogar Jonathan Rawnsley, a última testemunha inglesa. Os inspectores da Judiciária consideravam essencial questionar o britânico cara a cara, mas «perderam». O ex-director de empreendimentos do grupo dono do outlet de Alcochete acabou por ser ouvido pelo Serious Fraud Office, na última segunda-feira, tendo alguns elementos da PJ e do MP acompanhado a audição por telefone, em Lisboa.
Qualquer que seja a informação contida no relatório desta audição, os procuradores já não vão mudar de ideias: Sócrates não é suspeito.
Caso para dizer "Todos os Homens honestos mataram César. A alguns faltou arte, a outros coragem e a outros oportunidade mas a nenhum faltou a vontade", Marcus Tullius Cicero, Philippicae.