O estudo de Emília Nunes "Literacia, capacitação e participação, condições para o pleno exercício da cidadania em saúde", é um apontamento crucial para a compreensão do que deve ser a articulação entre o exercício pleno dos direitos e deveres dos cidadãos em matéria de saúde – o direito à saúde (enquanto bem individual e colectivo) e o dever de a defender e promover. Torna-se claro que esse equilibrio só é alcançável se os cidadãos tiverem acesso a bons níveis de literacia em saúde, de competências, da motivação e do poder para a tomada de decisões saudáveis e, em condições de igualdade de oportunidades, a condições estruturais, ambientais e sociais que lhes permitam agir sobre os factores que determinam a saúde. Desses factores, os ligados aos estilos de vida da população – consumo de tabaco, de álcool e de outras substâncias, os hábitos alimentares e de actividade física – têm sido particularmente valorizados nos últimos anos, dado estarem na origem directa do aumento dos níveis de doenças crónicas não transmissíveis – doenças cardiovasculares, doenças oncológicas, obesidade, diabetes e doenças respiratórias crónicas. Estas doenças acarretam dor e sofrimento prolongado, traduzindo-se por perda de qualidade de vida, perda de produtividade e gastos económicos, tendencialmente incomportáveis pela sociedade, em tratamentos e serviços de saúde. São hoje a primeira causa de morte prematura na generalidade dos países, em particular nos países mais desenvolvidos.
A sua incidência está igualmente a aumentar nos países mais pobres; à medida que melhoram o seu nível social e económico e a esperança de vida das suas populações, vêem-se confrontados com uma dupla sobrecarga – a par de uma elevada incidência de doenças transmissíveis, enfrentam um aumento incontrolado de doenças crónicas e incapacitantes.
Ao longo das últimas décadas muito se tem feito no sentido de controlar estas doenças e os seus factores de risco. No entanto, apesar de todos os esforços e múltiplos programas de saúde a sua incidência continuará a aumentar, estimando-se, segundo a OMS, que esta possa registar um aumento de cerca de 17% nos próximos dez anos. Embora a evolução de alguns indicadores mostre ser possível obter ganhos no controlo destas doenças, estes ocorrem de modo desigual entre os dois sexos e entre diferentes grupos sociais, contribuindo para agravar o gradiente social de saúde entre pobres e ricos. As pessoas com melhor acesso à informação, capacidade de a compreender e utilizar (literacia), maior acesso a bens económicos e a serviços de saúde conseguem enfrentar melhor os riscos e os constrangimentos do quotidiano, beneficiando mais dos avanços na área médica e terapêutica. Pelo contrário, a pobreza e a exclusão social deterioram o bem-estar dos cidadãos, comprometendo gravemente a sua capacidade de expressão, de participação na sociedade e de acesso à educação, ao emprego e à saúde. Combater o gradiente social de saúde e melhorar os níveis de equidade em saúde é hoje um imperativo não só para os sistemas de saúde, mas para toda a sociedade. Agir sobre os determinantes sociais da saúde implica lutar contra os efeitos adversos económicos e sociais decorrentes do processo de globalização próprio do mundo actual – o marketing global, a massificação, a concentração de mercados, a liberalização económica, o desemprego, a marginalidade, a pobreza e a exclusão - , garantindo igualdade de oportunidades entre géneros e entre diferentes grupos sociais. Este processo implica uma estreita aliança entre todos os sectores sociais (saúde em todas as políticas), organizações da sociedade civil e cidadãos. Para que os cidadãos possam assumir um papel activo na defesa da saúde, há que garantir condições de acesso à informação no domínio da saúde, de promover a sua capacidade de compreensão e leitura crítica da informação disponível. É necessário, também, que os cidadãos disponham das competências para agir sobre os referidos determinantes uma vez conhecidos e analisados, disponham da motivação, do poder e de oportunidades de acção e participação.
A literacia e a capacitação em saúde, num conceito que (seguindo Paulo Freire) poderíamos chamar de - conscientização -, permite que cada pessoa seja capaz de desenvolver capacidades de leitura e compreensão social e política da realidade, como base para a acção informada, consciente, autónoma e responsável no exercício da cidadania em direcção à saúde e ao bem-estar. Este exercício implica, também, ser capaz de aceitar a limitação de direitos e liberdades individuais, sempre que estes possam comprometer a saúde colectiva, enquanto bem público e valor colectivo a preservar e promover.
Ao longo das últimas décadas muito se tem feito no sentido de controlar estas doenças e os seus factores de risco. No entanto, apesar de todos os esforços e múltiplos programas de saúde a sua incidência continuará a aumentar, estimando-se, segundo a OMS, que esta possa registar um aumento de cerca de 17% nos próximos dez anos. Embora a evolução de alguns indicadores mostre ser possível obter ganhos no controlo destas doenças, estes ocorrem de modo desigual entre os dois sexos e entre diferentes grupos sociais, contribuindo para agravar o gradiente social de saúde entre pobres e ricos. As pessoas com melhor acesso à informação, capacidade de a compreender e utilizar (literacia), maior acesso a bens económicos e a serviços de saúde conseguem enfrentar melhor os riscos e os constrangimentos do quotidiano, beneficiando mais dos avanços na área médica e terapêutica. Pelo contrário, a pobreza e a exclusão social deterioram o bem-estar dos cidadãos, comprometendo gravemente a sua capacidade de expressão, de participação na sociedade e de acesso à educação, ao emprego e à saúde. Combater o gradiente social de saúde e melhorar os níveis de equidade em saúde é hoje um imperativo não só para os sistemas de saúde, mas para toda a sociedade. Agir sobre os determinantes sociais da saúde implica lutar contra os efeitos adversos económicos e sociais decorrentes do processo de globalização próprio do mundo actual – o marketing global, a massificação, a concentração de mercados, a liberalização económica, o desemprego, a marginalidade, a pobreza e a exclusão - , garantindo igualdade de oportunidades entre géneros e entre diferentes grupos sociais. Este processo implica uma estreita aliança entre todos os sectores sociais (saúde em todas as políticas), organizações da sociedade civil e cidadãos. Para que os cidadãos possam assumir um papel activo na defesa da saúde, há que garantir condições de acesso à informação no domínio da saúde, de promover a sua capacidade de compreensão e leitura crítica da informação disponível. É necessário, também, que os cidadãos disponham das competências para agir sobre os referidos determinantes uma vez conhecidos e analisados, disponham da motivação, do poder e de oportunidades de acção e participação.
A literacia e a capacitação em saúde, num conceito que (seguindo Paulo Freire) poderíamos chamar de - conscientização -, permite que cada pessoa seja capaz de desenvolver capacidades de leitura e compreensão social e política da realidade, como base para a acção informada, consciente, autónoma e responsável no exercício da cidadania em direcção à saúde e ao bem-estar. Este exercício implica, também, ser capaz de aceitar a limitação de direitos e liberdades individuais, sempre que estes possam comprometer a saúde colectiva, enquanto bem público e valor colectivo a preservar e promover.
Neste contexto, parece legítimo questionar qual deverá ser papel dos serviços de saúde.
Para além de garantir o acesso de todos os cidadãos a cuidados curativos e de prevenção da doença, seguros, de elevada qualidade e em condições de igualdade de oportunidades, cabe-lhes ser uma fonte de informação em matéria de saúde, credível, isenta, baseada em evidência, desprovida de juízos morais ou de valor, de ajuda e apoio nas decisões ao longo da vida, nas várias etapas e dificuldades, tendo em vista contribuir para que cada utente/paciente/cidadão seja capaz de auto-gerir a sua saúde, com respeito pelo direito ao consentimento informado e à autodeterminação em saúde. Cabe-lhes, ainda, influenciar as decisões estratégicas no sentido da adopção de políticas públicas saudáveis, em favor da redução das iniquidades, da promoção da literacia e da capacitação dos cidadãos, em estreita articulação com os restantes sectores sociais, ONG's e outras organizações da sociedade civil. Dar apoio às escolhas saudáveis, especialmente junto daqueles que, de outro modo, não poderão fazê-las, reduz riscos e desigualdades sociais, constituindo um objectivo a perseguir por toda a sociedade, tendo em vista a obtenção de melhores níveis de saúde, de desenvolvimento e de justiça social.