Alexandre Quintanilha é um investigador optimista com o panorama científico nacional, apesar de haver doutorados sem emprego, e frustrado com a política. Fala da crise, da ética e do perigo dos fundamentalismos. O prestigiado cientista foi, até há 1 ano, presidente do Instituto de Biologia Molecular e Celular da Universidade do Porto. Continuou a dar aulas de Biofísica no Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar, colabora com prestigiados institutos científicos internacionais e envolveu-se na política - é vereador sem pelouro na Câmara Municipal do Porto (eleito pela lista de Elisa Ferreira) e, apesar de ter ido à maioria das reuniões, sente uma grande frustração. Em Portugal, ainda existe a cultura de "nós" e "eles" e a eles, a oposição, nada é permitido. Não tem filiação partidária nem pertence a associações, porque recusa ortodoxias de pensamento ou atitudes seguidistas.
Abel Salazar dizia que o médico que só sabia de Medicina nem de Medicina sabia. AQ é o epítome do cientista que está muito longe de saber e preocupar-se apenas com Ciência. Muitas foram as causas a que juntou a sua voz: despenalização do consumo de droga, a descriminalização do aborto e, mais recentemente, o direito ao casamento de pessoas do mesmo sexo. Uma questão que, não sendo das mais prementes para o país - como o desemprego ou a falta de ideias para sair da crise -, é prova de qualidade de uma democracia por respeitar os direitos de uma minoria.
A conversa entra na Ciência ou na paixão de conhecer e comunicar. Resume um estudo que leu recentemente com conclusões desafiantes. Afinal, não herdamos exactamente 50% da nossa informação genética de cada progenitor. É verdade, pelo menos para já, que no núcleo as porções são equitativas, mas as mitocôndrias (as baterias de energia das nossas células) também contêm ADN e só da mãe. "São só uns pozinhos, cerca de 0,01%, mas é relevante, porque há doenças genéticas gravíssimas com mutações do ADN mitocondrial, o que significa que são herdadas da mãe", explica. Assim sendo, diz, "somos mais filhos da mãe do que do pai". Há uns anos, pensava-se que descodificando o genoma, conhecia-se tudo a respeito da pessoa, chega-se à "alma" secreta e única de cada ser humano. Hoje, sabe-se que "a genética está a ter e vai continuar a ter um impacto enormíssimo na forma como organizamos a nossa vida". Porém, cada um de nós "não é apenas ADN". Ou, por outras palavras, somos muito mais do que aquilo que "os genes prometem", explica o investigador. Somos genética combinada com infinitas possibilidades culturais. Assim, as vantagens, apesar de óbvias - como conhecer e prevenir determinadas tendências -, "não são lineares", porque não somos produto directo dos genes, mas também porque hoje há evidência de que até o próprio ADN sofre alterações em função de factores ambientais e até emocionais. Entre as desvantagens, o risco de eugenia, da selecção dos mais perfeitos, é suficiente para justificar acuradas reflexões.
Nada parece derrubar o optimismo natural de Quintanilha, herdado do pai, professor, geneticista e um anarco-sindicalista do princípio do século passado, obrigado por Salazar a imigrar para Berlim, de onde teve de fugir, por causa do nazismo, para Paris, abrigo seguro até à invasão de Hitler. Foi, então, para Moçambique, mas também não pode lá ficar muito tempo, e acabou por seguir para Joanesburgo. "Foi sempre corrido de sítio para sítio e nunca perdeu o optimismo", conta. Embora não haja provas da existência de um gene do optimismo, a verdade é que AQ herdou a fabulosa capacidade de ver sempre o copo meio cheio: "Não vejo o mundo com cores muito escuras, talvez porque lido com muita gente jovem. Tenho uma visão do mundo como uma estrutura robusta e encontro muita evidência nesse sentido", explica. E acrescenta: "Se a forma como se está na vida interfere com o modo como se lida com o cancro, vale a pena ter atenção à forma como se olha para o mundo".
AQ considera que José Sócrates é "uma pessoa capaz de ser muito convencida das suas ideias", o que pode ser "uma virtude ou um defeito, dependendo das consequências". Sublinhando não ter qualquer filiação partidária - não obstante já ter participado em iniciativas do PS e ter integrado a lista de Elisa Ferreira à Câmara do Porto -, o cientista diz não percepcionar uma alternativa a José Sócrates. "Tenho pena, era um bom sinal", acrescenta. Quando instado a avaliar o Governo, Alexandre Quintanilha centra-se na Ciência. Diz que nenhum outro país aumentou tanto o investimento nesta área, o que se traduziu numa grande atracção de jovens para a investigação. De tal forma que, actualmente, os doutorados já não têm emprego assegurado em Portugal. Porém, a fuga de cérebro não o preocupa, porque "estamos a formar pessoas para o mercado global".
Abel Salazar dizia que o médico que só sabia de Medicina nem de Medicina sabia. AQ é o epítome do cientista que está muito longe de saber e preocupar-se apenas com Ciência. Muitas foram as causas a que juntou a sua voz: despenalização do consumo de droga, a descriminalização do aborto e, mais recentemente, o direito ao casamento de pessoas do mesmo sexo. Uma questão que, não sendo das mais prementes para o país - como o desemprego ou a falta de ideias para sair da crise -, é prova de qualidade de uma democracia por respeitar os direitos de uma minoria.
A conversa entra na Ciência ou na paixão de conhecer e comunicar. Resume um estudo que leu recentemente com conclusões desafiantes. Afinal, não herdamos exactamente 50% da nossa informação genética de cada progenitor. É verdade, pelo menos para já, que no núcleo as porções são equitativas, mas as mitocôndrias (as baterias de energia das nossas células) também contêm ADN e só da mãe. "São só uns pozinhos, cerca de 0,01%, mas é relevante, porque há doenças genéticas gravíssimas com mutações do ADN mitocondrial, o que significa que são herdadas da mãe", explica. Assim sendo, diz, "somos mais filhos da mãe do que do pai". Há uns anos, pensava-se que descodificando o genoma, conhecia-se tudo a respeito da pessoa, chega-se à "alma" secreta e única de cada ser humano. Hoje, sabe-se que "a genética está a ter e vai continuar a ter um impacto enormíssimo na forma como organizamos a nossa vida". Porém, cada um de nós "não é apenas ADN". Ou, por outras palavras, somos muito mais do que aquilo que "os genes prometem", explica o investigador. Somos genética combinada com infinitas possibilidades culturais. Assim, as vantagens, apesar de óbvias - como conhecer e prevenir determinadas tendências -, "não são lineares", porque não somos produto directo dos genes, mas também porque hoje há evidência de que até o próprio ADN sofre alterações em função de factores ambientais e até emocionais. Entre as desvantagens, o risco de eugenia, da selecção dos mais perfeitos, é suficiente para justificar acuradas reflexões.
Nada parece derrubar o optimismo natural de Quintanilha, herdado do pai, professor, geneticista e um anarco-sindicalista do princípio do século passado, obrigado por Salazar a imigrar para Berlim, de onde teve de fugir, por causa do nazismo, para Paris, abrigo seguro até à invasão de Hitler. Foi, então, para Moçambique, mas também não pode lá ficar muito tempo, e acabou por seguir para Joanesburgo. "Foi sempre corrido de sítio para sítio e nunca perdeu o optimismo", conta. Embora não haja provas da existência de um gene do optimismo, a verdade é que AQ herdou a fabulosa capacidade de ver sempre o copo meio cheio: "Não vejo o mundo com cores muito escuras, talvez porque lido com muita gente jovem. Tenho uma visão do mundo como uma estrutura robusta e encontro muita evidência nesse sentido", explica. E acrescenta: "Se a forma como se está na vida interfere com o modo como se lida com o cancro, vale a pena ter atenção à forma como se olha para o mundo".
AQ considera que José Sócrates é "uma pessoa capaz de ser muito convencida das suas ideias", o que pode ser "uma virtude ou um defeito, dependendo das consequências". Sublinhando não ter qualquer filiação partidária - não obstante já ter participado em iniciativas do PS e ter integrado a lista de Elisa Ferreira à Câmara do Porto -, o cientista diz não percepcionar uma alternativa a José Sócrates. "Tenho pena, era um bom sinal", acrescenta. Quando instado a avaliar o Governo, Alexandre Quintanilha centra-se na Ciência. Diz que nenhum outro país aumentou tanto o investimento nesta área, o que se traduziu numa grande atracção de jovens para a investigação. De tal forma que, actualmente, os doutorados já não têm emprego assegurado em Portugal. Porém, a fuga de cérebro não o preocupa, porque "estamos a formar pessoas para o mercado global".