domingo, 18 de abril de 2010

Suicídio: o mais intrigante dos actos do ser humano em escala crescente



O suicídio é a principal causa de morte não-natural no país, tendo ultrapassado o número de mortes na estrada. O facto verifica-se desde 2006, ano em que os suicídios consolidaram o 1º lugar nas causas de morte não-naturais, o que pode ser justificado pela diminuição de vítimas mortais nos acidentes de viação. De acordo com o Instituto Nacional de Estatística, em 2008 registaram-se 1035 suicídios e 776 mortes na estrada devido a acidentes de viação, informa o «Público». Este ano, o número de suicídios aumentou para 1195, contra 1135 vítimas de acidentes na estrada. As mulheres lideram as tentativas de suicídio em Portugal mas são os homens que registam taxas mais elevadas de suicídios concretizados, por utilizarem métodos mais eficazes, como enforcamento, medicamentos e nas áreas rurais pesticidas e armas de fogo. O retrato foi traçado pelo coordenador nacional para a Saúde Mental, Caldas de Almeida, na sequência de um estudo do Alto Comissariado da Saúde, que lança alguns dados sobre o suicídio no Continente. Com base em dados do último Inquérito Nacional de Saúde (2005-2006), do Infarmed e do INE, o Gabinete de Informação e Prospectiva do ACS indica que os homens registam as mais elevadas taxas de suicídio, especialmente os indivíduos com mais de 65 anos e viúvos. Seguem-se os divorciados ou separados. Estes registos mostram a «influência significativa de perda de uma pessoa, em especial de um cônjuge», segundo Caldas de Almeida. O padrão do estado civil é semelhante para ambos os géneros.
As taxas são mais elevadas entre os trabalhadores não qualificados, seguindo-se os trabalhadores de profissões manuais e os ligados à agricultura e pescas.
Na população com 65 anos ou mais, a taxa de suicídio é mais elevada no Alentejo e abaixo dessa idade os números mais expressivos registam-se no Algarve. O suicídio tem aumentado no Algarve, facto que foi determinado pela população feminina, ao contrário do que acontece nas restantes regiões do país. A maior expressão no sul tem, porém, diferentes explicações conforme as regiões: no Alentejo deve-se ao isolamento e há existência de muitos homens idosos que acusam o peso dessa situação. No Algarve, a explicação passa pela população flutuante que atrai, nomeadamente para a área do Turismo e que inclui muitos migrantes e imigrantes que viajam sozinhos.
Entre 2003 e 2005, o suicídio era a oitava causa de morte em Portugal. No período 1999-2001 a média anual de óbitos por suicídio aumentou nos dois géneros e a média de idade passou dos 45,4 para 46,5 anos. Nos homens foi de 47,7 e para as mulheres de 49,1. Nas faixas etárias mais baixas, depois dos acidentes viários e SIDA, o suicídio continua a ser uma das causas de morte. Entre 1991-2005, a década de 90 registou um decréscimo, atingindo o valor mais baixo em 2000 (5,1 por 100 mil habitantes) e em 2002 a taxa mais elevada (11,6 por cem mil habitantes). O pico para a população feminina aconteceu em 2004. Caldas de Almeida declarou que as subidas no número de suicídios em Portugal contrariam a tendência constante ou de diminuição registada no resto do mundo, exceptuando o subgrupo dos jovens masculinos adultos. O aumento em Portugal não corresponde a um aumento efectivo da taxa de mortalidade por suicídio, mas na melhoria das taxas de registo por esta causa de morte. «É paralela a taxa de aumento dos suicidários com a diminuição do registo de morte por causa indeterminada. Muitos dos suicídios não se registavam dessa forma por motivos culturais e religiosos», disse. Sobre o suicídio nos jovens adultos, o especialista adianta que é notada essa tendência, mas ainda não há certezas nos motivos, embora se apontem maiores vulnerabilidades na passagem da adolescência para a vida adulta nos rapazes.
É o mais intrigante dos actos do ser humano. Número de suicídios registou em Portugal uma descida progressiva na década de 90, mas subiu para mais do dobro no início deste século. Na região, o número de suicídios parece ter disparado no ano passado. Qual será, afinal, o impacto da crise na saúde mental dos portugueses? O psiquiatra Carlos Saraiva, garante que a crise económica tem efeitos negativos na saúde mental das pessoas. Portugal é reconhecido como um país em que as taxas globais de suicídio (n.º de mortes anuais por 100 mil habitantes) são relativamente baixas, tal como os restantes países do Sul da Europa de maioria católica, ao contrário do que se passa no Norte e no Leste. Existe, todavia, em Portugal uma marcada assimetria entre o Norte e o Sul. De facto, ao Sul do Tejo as taxas são mais elevadas devido a uma diversidade de factores sociais e psiquiátricos. Desde a desertificação à personalidade melancólica. Desde o envelhecimento à baixa religiosidade.
Mas a realidade pode superar a estatística, já que os números avançados pelo INE podem conter equívocos, devido a falhas na contagem e falta de rigor nos registos. Carlos Saraiva admite que «os dados do suicídio em Portugal não são muito rigorosos». Um mal da modernidade.