quinta-feira, 15 de abril de 2010

Portugal: Cem anos antes...à República (Parte II)

(continuação)
Deslocar-se para os bairros periféricos de Lisboa não era difícil. Desde 1902 que não circulavam os "americanos", puxados por mulas e rodando sobre carris, destronados pelos carros eléctricos que surgiram em 1901, com uma carreira entre o Cais do Sodré e Algés. Oito anos depois, a sua rede estendia-se até ao Areeiro, Benfica, Graça e Poço do Bispo. Andar a pé era relativamente seguro. Uma boa parte da cidade estava já dotada de iluminação eléctrica e a Guarda Municipal, a pé ou a cavalo, patrulhava as ruas. Para chegar a pontos altos, como a Baixa ou a área ribeirinha, utilizavam-se os elevadores de Santa Justa, Glória, Lavra e Bica. Há dois anos que táxis (os descendentes das tipóias) se disponibilizavam para servir os mais apressados ou opulentos. Nas duas principais cidades do país, os jovens que aspiravam a uma educação académica acediam às Escolas Médico-Cirúrgicas de Lisboa e do Porto ou ao Curso Superior de Letras da capital, mas a única universidade articulada era a de Coimbra. Existia uma Faculdade de Teologia e uma cadeira de Direito Canónico na Faculdade de Direito. Muitos professores e mesmo bastantes alunos eram sacerdotes. Tudo iria terminar no ano seguinte, quando a nova república laicizaria a estrutura e os rituais da universidade.
Nuvens negras começavam a ensombrar o horizonte político da monarquia mas D. Manuel permanecia alheio à inquietação da elites republicanas, fortemente influenciadas pela Carbonária e pela Maçonaria. Em Julho e Outubro, o rei visita unidades militares, onde verifica que os oficiais lhe mantém o testemunho de fidelidade. Um ano depois, face à eclosão da revolta republicana de 5 de Outubro, o Exército, contrariamente ao que o soberano esperaria, não manifestou significativa resistência. Exilou-se o rei para Inglaterra e jamais tornaria a pisar o solo da pátria que o vira nascer. Perdera o reino sobre o qual lhe haviam ensinado, na sua criação e educação, ganhara um dia a governar, por direito próprio e por direito divino. Era a sua convicção. Mas, o povo, mais uma vez, como o faz continuamente, ao longo da História, cortou-lhe, abruptamente, a sua vontade, confirmando, mais uma vez, que é sua a última palavra, e que a única vontade realmente determinante para fixar o rumo da História é a sua.
Marcava-se assim, pela mão da República, uma nova época para Portugal.