terça-feira, 6 de abril de 2010

Mulheres presas: Capadocia e o Relatório Panayotopoulos-Cassiotou

Não me refiro a Capadócia, aquela belíssima região da Turquia, com paisagem lunar, as cidades subterrâneas que serviram de abrigo aos antigos cristãos, casas e igrejas escavadas nas rochas. Refiro-me à série da HBO Latina. 5 anos de negociações com as autoridades mexicanas para conseguir autorização para as filmagens. Capadócia retrata a realidade de uma prisão feminina na Cidade do México. Nela, três discursos se revezam como principal eixo da trama: o de Teresa Lagos (Dolores Heredia)" a diretora com intenções humanitárias -, de Federico Márquez (Juan Manuel Bernal)" um dos responsáveis pela prisão que procura tirar vantagem de mão de obra barata disfarçada de projeto social -, e de Lorena (Ana de la Reguera), uma dona de casa que pensa ter a vida perfeita até ir parar atrás das grades. E o que acontece dentro da cela, por mais arbitrário, corrupto, assustador e violento, não será muito diferente do que se vive do lado de fora. Capadócia, um lugar sem perdão. Treze episódios, cada um com uma hora e dez minutos. Três nomeações: para Cecilia Suárez, Melhor Actor, para Oscar Olivares, e Melhor Série Dramática.
O Relatório Panayotopoulos-Cassiotou retratou a situação particular das mulheres na prisão e o impacto da detenção dos pais para a vida social e familiar. Elas constituem cerca de 4,5 a 5 % da população prisional na União Europeia. As prisões estão orientadas para os homens reclusos e tendem a ignorar os problemas específicos das mulheres presas. As principais áreas de preocupação são os cuidados de saúde, a situação das mães com filhos na prisão e a reintegração profissional e social. A exigir mais atenção nos cuidados de saúde das mulheres e das suas necessidades de higiene. Em especial, as grávidas, que requerem recursos e cuidados especializados em matéria de alimentação, exercício, vestuário, medicamentação e cuidados médicos por pessoal especializado. As crianças que permanecem com as suas mães presas requerem uma protecção e cuidados adequados e não devem sofrer quaisquer formas de discriminação. A reclusão das mulheres pode ter implicações particularmente graves quando, antes de ser presas, tinham exclusivamente a seu cargo a educação dos filhos. A inserção social das detidas deve ser preparada logo no período de detenção e após a libertação, em cooperação com os serviços sociais e as outras organizações competentes, de forma a garantir uma transição harmoniosa entre a reclusão e a liberdade. O documento sugere que se crie "em cada estado uma comissão de estudo e sistemas de mediação permanente para uma vigilância efectiva das condições de internamento", isto para se "detectar e corrigir os factores de discriminação que ainda afectam as mulheres no sistema penitenciário". Propõe que se invoque, "nos debates locais, regionais e nacionais, as necessidades" destas mulheres, "a fim de promover medidas positivas em matéria de recursos sociais, habitação, formação". Aquele organismo do PE recomenda "o recurso acrescido às penas de substituição da reclusão, como alternativas alicerçadas na sociedade, em especial para as mães". Insiste "na necessidade de a administração judiciária se informar sobre a existência de filhos antes da decisão de prisão preventiva, ou, aquando da condenação, e de se assegurar que foram adoptadas medidas para preservar todos os seus direitos". A comissão reclama também programas próprios para toxicodependentes. Apenas 4 países (França, Portugal, Eslováquia e Suécia) dispõem de projectos específicos orientados em função do género para as reclusas toxicodependentes". Como se impõe uma formação isenta de estereótipos de género, Portugal merece uma menção positiva por ser um dos países que promovem oportunidades de formação a nível superior e de formação vocacional às mulheres reclusas. Portugal continua a figurar, no relatório da Comissão dos Direitos da Mulher e da Igualdade de Géneros, como um dos países da UE com maior taxa de reclusão feminina. Falando de mulheres, curiosa a figura das "visitas íntimas" - ainda não chegaram aos estabelecimentos prisionais femininos. São encontros privados, mensais, com uma duração média de 3 horas. Funcionam no Funchal (14 reclusos), em Vale de Judeus (77), na Carregueira (62), em Paços de Ferreira (19) e em Monsanto (5) - mas as reclusas só beneficiam delas se o seu companheiro estiver detido. É como se só eles tivessem imperativo sexual. Pela primeira vez, pelo menos desde que a medida foi introduzida em Portugal, a Direcção-Geral dos Serviços Prisionais é encabeçada por uma mulher. E Clara Albino está a analisar este dossier. A Comissão dos Direitos da Mulher e da Igualdade dos Géneros instou "cada estados-membros da União Europeia a integrar a dimensão da igualdade entre homens e mulheres na sua política penitenciária e nos seus centros de detenção, bem como a ter em maior consideração as especificidades ligadas ao género".
Ficam as considerações em jeito de recomendação.