sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

Um "basta" do Miguel Sousa Tavares (voluntário, sem coacção)

Qualquer um que se levante e diga "basta!" é logo conotado como socialista impedrenido, boy ou girl, por isso, até os insuspeitos se levantam para demonstrar a sua indignação com esta algazarra pseudo-jornalista-informativa a que se assiste nos últimos meses. O homem que agora vem dizer-se aborrecido com a proporção que a guerrilha tomou. O mesmo homem que diz, publicamente, "Armando Vara tem a correr contra mim uma acção cível em que me pede 250000 euros de indemnização por "ofensas ao seu bom nome". Porque, algures,eu disse o seguinte: "Quando entra em cena Armando Vara, fico logo desconfiado por princípio, porque há muitas coisas no passado político dele de que sou altamente crítico".". Sim, é o Miguel Sousa Tavares (Nov. 05, 2009, wetblog A Xafarica, "O Factor Vara"). Não sei se irá aparecer alguma escuta telefónica ao MST provando que se perdeu de amores ou que é devedor (afectiva ou pecuniariamente) de alguém do PS. Mas, note-se, MST há muito que se assume anti-Vara. Ora, o mesmo Miguel escreveu, ontem, Oito passos em direcção ao fim, (www.expresso.pt). Vindo de quem vem, dificilmente se acredita que lhe tenham prometido um "tacho", um qualquer privilégio ou benefício, para tomar uma atitude profundamente crítica sobre a novela Face Oculta. É caso para dizer: parem, escutem e olhem. São de tal modo esclarecedoras as suas afirmações que o melhor mesmo é transcrevê-las ipsis verbis.
"Para começo de conversa: a liberdade de imprensa não está em perigo em Portugal. Obviamente. Quem o diz, quem organiza petições online e manifs, nunca antes, quando o perigo real existiu, se fez ouvir. Não há um único grande jornalista português que ande por aí aos gritos em defesa da liberdade pretensamente ameaçada. Não conheço ninguém que não diga e não escreva o que quer e que não tenha tribuna para ser escutado. Sim, há, como haverá sempre, os que têm medo, os que hesitam e os que medem as consequências: mas a cobardia individual não é defeito público. Convém, pois, não confundir liberdade com irresponsabilidade, não confundir vaidades individuais, desejos de protagonismo e aproveitamentos políticos com a situação real, como um todo." Quem o diz? MST.
"Mal, muito mal, andou, pois, Paulo Rangel, com aquele seu infeliz, quase ridículo, discurso no Parlamento Europeu, querendo justificar num minuto a ditadura que se viveria em Portugal. Além de mais, para quem queria defender o jornalismo livre, ele cometeu um pecado capital: exagerou, generalizou, mentiu. Fiquei a pensar que, se este é o amigo da liberdade de imprensa, que avancem os inimigos." - continua o Miguel.
"Nada, jamais, me fará deixar de lado o nojo que me causa a revelação destas 'verdades' arrancadas à custa da divulgação de conversas telefónicas ou presenciais privadas, do atropelo sem vergonha do segredo de justiça. Aceitando que as escutas sejam necessárias (excepcionalmente e não como regra geral) na investigação de crimes que, de outro modo, não poderiam ser investigados, nunca conseguiria imaginar que, uma vez declaradas sem interesse para a investigação ou mandada arquivar esta, as escutas pudessem cair então no domínio público. Se não aproveitam à justiça, servem então para o voyeurismo jornalístico ou para os julgamentos populares? Por mais incrível que pareça, é esta, por exemplo, a opinião do juiz-conselheiro Eduardo Maia Costa, que sustenta que "tendo sido proferido despacho de arquivamento... o interesse público prevalece", já que as escutas reveladas pelo "Sol" não "contêm nenhum facto que se reporte à vida privada ou íntima de quem quer que seja". Então, o sr. conselheiro acha que a divulgação da correspondência privada - cuja inviolabilidade é garantida pela Constituição - não é, em si mesma, uma violação da privacidade, desde que não contenha passagens sobre sexo, drogas e rock'n'roll? Muito bem: dê-nos a ouvir a gravação das suas conversas ao telefone dos últimos meses - quando não sabia que estava a ser escutado." - e é ainda o MST a falar.
"Eu já vivi isto, eu lembro-me disto. Assim como me lembro de viver sem liberdade de imprensa ou sob a ameaça a ela. A diferença é que, hoje, eu, como qualquer um, digo o que penso, mas não posso impedir que escutem as minhas conversas ao telefone ou num restaurante e que depois elas sejam plasmadas num jornal, para que o pagode se regale. É isso, antes de tudo o resto, que me preocupa. E, preto no branco: no lugar do director do "JN", José Leite Pereira, eu também não teria consentido a publicação da crónica de Mário Crespo. Porque não aceito, como regra deontológica do jornalismo, a publicação de notícias fundadas numa fonte anónima que escutou conversas privadas, mesmo em local público. E porque também não o aceito como regra de educação. Nunca o fiz e nunca o farei - e também o poderia fazer abundantemente. E sinto asco quando vejo o director do "Sol" vir agora revelar o suposto teor de uma conversa com Sócrates, num almoço em que foi como convidado a S. Bento e onde o PM lhe teria feito confidências gravíssimas. Com gente desta não quero almoçar. (Não deixo, aliás, de achar extraordinário que o mesmo "Sol" ande aí a gritar aos quatro ventos que o Governo português quis comprar a sua liberdade, aproveitando as dificuldades financeiras do jornal, quando, tanto quanto sei, eles se abriram, directa ou indirectamente, aos dinheiros do mais corrupto Governo do planeta)."- continua o MST.
"Aprendi, de há muito, o essencial: que não há fins que justifiquem meios injustificáveis. Pelo contrário: meios injustificáveis caracterizam os próprios fins - a história de qualquer ditadura o ensina. Mas, dito isto, estou de acordo com Ana Gomes: ultrapassado o asco e o nojo, porque assim tem de ser, resta o conteúdo e, esse, é inquietante."
Foi uma citação pura. Que subscrevo na íntegra. E que muitos outros subscrevem. Também.