sábado, 6 de fevereiro de 2010

Escutas, escutadores e escutados - na pele do escutado

Luís Marques Mendes tem marcado e influenciado a imagem do PSD. Dado que me lembrava dele do tempo em que este protagonizava a imagem de um homem do sistema não tinha de LMM a melhor das imagens. No entanto, a sua tentativa de fazer passar o pacote anti-corrupção e a forma como se veio a libertar de eventuais amarras políticas e partidárias, o distanciamento em relação a alguns lobbys dentro do PSD - sobretudo quanto a determinados indíviduos que se entretém a coleccionar acusações de ilícitos criminais - fez uma inflexão no que dele pensava. Denotando uma preservança que só consigo comparar com a de Paulo Teixeira Pinto, depois da sua saída do BCP-Millenim, este homem tem evidenciado ter ideias próprias e ideais pessoais, uma qualidade que é admirável nos tempos que correm, em que os carreiristas da política são cada vez mais e nada fazem de per si, como se pensassem através e por causa dos interesses (pessoais) filiados. Por isso, atendo e sigo com interesse as opiniões deste homem.
"Acho que um político - autarca, deputado ou governante - acusado, pronunciado ou condenado por crimes especialmente graves - como corrupção, peculato ou fraude fiscal, por exemplo - está fortemente diminuído na sua autoridade, na sua credibilidade e nas condições para o exercício de um cargo político, comprometendo, assim, o prestígio da política e a imagem das instituições", declarou. Nestes casos - precisou o ex-líder do PSD - a lei devia "consagrar frontalmente uma inelegibilidade, ou seja, devia impedir que políticos nestas situações pudessem candidatar-se a eleições". LMM salientou que "fazer isto seria um acto da mais elementar decência política". E, referindo Sá Carneiro "a política sem ética é uma vergonha."
Deve-se a ele o facto de, nas eleições autárquicas de 2005, o PSD, sob a sua liderança, recusar a candidatura pelas suas listas de Valentim Loureiro, em Gondomar, e de Isaltino Morais, em Oeiras (que respondiam perante a Justiça por crimes alegadamente praticados no exercício das funções autárquicas), "a verdade é que o poder pelo poder não serve para nada" e "há que ter princípios e convicções", sendo que "às vezes é preciso correr o risco de perder uma eleição para afirmar uma linha política de seriedade e de credibilidade". O ex-presidente do PSD observou, também, que "há mais de três anos que a Assembleia da República tem em seu poder um projecto de lei consagrando a inelegibilidade de candidatos a contas com acusações ou condenações judiciais especialmente graves", tendo sido ele "o autor da ideia" desse diploma. "O que é grave é que esse projecto foi aprovado na generalidade, por unanimidade. Por todos os partidos sem excepção. Porém, na hora da verdade, não houve coragem para avançar. O Parlamento fechou as portas e o projecto ficou na gaveta. Considero uma omissão grave, deliberada e escandalosa", criticou. LMM observou, também, que "os partidos falam muito de verdade, transparência e credibilidade", mas "na hora de decidir unem-se para mandar às urtigas estes princípios". Por isso, volto a dizer, oiço o LMM. Que julga que o caso das escutas do processo Face Oculta que envolvem a TVI «é uma vergonha que ultrapassa todos os limites e todas as marcas», e que «É muito grave pelas consequências que tem, pois fica claro, no plano político, que o Governo tinha um plano ao mais alto nível para controlar a informação», e que o caso «tem consequências para a credibilidade do Governo e do primeiro-ministro, que fica pelas ruas da amargura».
LMM afirmou que todos os governos «têm os seus pecadilhos» em matéria de interferência na comunicação social. Questionado sobre se o PR deve ou não intervir no caso, LMM escusou-se a maiores considerações, dizendo apenas que cada um deve assumir as suas responsabilidades.
O que LMM afirma é uma confissão, também. E vale por isso mesmo. Porque falou sem a demagogia de um político, com a consciência de um cidadão informado. E o mesmo se recomendaria aos seus colegas de (ex) partido que falam como se pudessem arremessar pedras para os outros quando se comportaram, enquanto no poder, como umas damas injuriadas, trocando cadeiras dos órgãos dominados pelo aparelho como se troca de camisa.
Jorge Lacão, ministro dos Assuntos Parlamentares, também já reagiu, em entrevista à «RTPN» às notícias avançadas pelo «Sol» sobre o alegado plano do executivo para controlar a comunicação social, afirmando que o Governo «está de consciência tranquila» e que «não há explicações a dar». «O Governo (...) não tem nada que lhe pese na consciência», afirmou. O ministro foi ainda questionado sobre a proposta do PSD para que a Comissão de Ética Parlamentar ouça o Sindicato dos Jornalistas, a entidade reguladora, jornalistas e directores de órgãos de comunicação social. «Não quero dar o meu contributo para manobras de diversão, porque vivemos num Estado democrático, pluralista, onde a liberdade de iniciativa no domínio da comunicação social e a liberdade de expressão felizmente não estão em causa», respondeu. Em jeito de conclusão acrescentou: «Só quem não sabe distinguir aquilo que era um regime anterior ditatorial do que é um regime de liberdade é que não sabe fazer essa distinção».
Entendo o JL. Viver em democracia implica liberdade de expressão e de pensamento. E, como parece que poucos se incomodam com o facto de pudermos ser escutados e de puderem devassar, sem dó nem piedade, a nossa privacidade, a pretexto de suspeitas provindas, por vezes, de fonte ainda mais suspeitas, tenho de concordar com o PM, José Sócrates. Não porque goste ou não goste dele, como indíviduo, mas porque, com este meu complexo quixotesco tomo sempre o partido dos oprimidos. E como as conversas foram escutadas, até prova em contrário, para mim, os escutados serão as vítimas.
Ora, veio Sócrates qualificar de «absolutamente lamentável» o que apelidou de «jornalismo de buraco de fechadura», baseado em «escutas telefónicas e conversas privadas» sem relevância criminal, escreve a Lusa. Questionado sobre o levantamento de suspeitas sobre si, acusando-o de ingerência no caso TVI e de, alegadamente, querer condicionar o PR, nada disse, para não contribuir para «essa infâmia». E, fez muitíssimo bem. «Eu não contribuo para essa infâmia, nem para a degradação da nossa vida pública, baseando-se essas acusações e essas notícias em escutas telefónicas», disse.
«Eu acho absolutamente lamentável esse jornalismo, que se pode classificar como jornalismo de buraco de fechadura, baseado em escutas telefónicas e em conversas telefónicas que, não tendo relevância criminal, devem ser privadas», frisou o PM. «Ainda por cima, era o que faltava que eu me pusesse agora na posição comentar conversas privadas de outros. Não o faço», sublinhou, considerando que tal atitude «indecorosa e desprezível».
Até LMM diz que estas cenas não são motivo para demissão do Governo, de modo a que há que pensar: então de que serve tamanho algarviado? Ou serve a quem? Mesmo que tentasse acreditar na versão escutada, recuso-me a tal. Dificilmente creio que se tivesse escutado algo de relevante nas conversas entre JS e os demais. Até porque o considero um político de excelência e nunca se ouviu falar de políticos excelentes serem escutados. O que me irrita é que quem escutou indevida e inescrupulosamente seja o que for, divulga, sem qualquer pudor, o que diz ter escutado, sabendo que o sistema dificulta a sua detecção e a aplicação de uma qualquer sanção (disciplinar ou penal) por ter trazido a público o que era privado. A verdade é que eu, como qualquer um dos meus amigos que me lêem (e já agora, os inimigos também) também gostaria de "fazer a folha" a quem já me a tentou fazer, incluindo a uma (ex-lembro que não as há, porque as carregamos para sempre) sogra que me fez a vida num oito e a uns quantos safados que já me tentaram esquartejar a alma, o que significa que se me escutarem podem ouvir alguns planos mais ou menos articulados de como eu, e uns amigos sempre solidários, acompanho a vida desses safados, esperando que o Destino cumpra a sua parte no meu karma. Na verdade, continuo, quase que faria um pacto com o Diabo para ter a certeza de que ainda vou ver nesta vida Justiça feita. O que quer dizer que um destes dias ainda sou acusada de premeditação. Isto porque já se consegue perceber que conversas descontextualizadas dão a impressão de serem autênticos complots mafiosos para nos livrarmos deste ou daquele inimigo. Pelo que o melhor mesmo é começar a poupar para pagar a penalistas conceituados para preparar antecipadamente a defesa.
E o mesmo conselho dou aos amigos: quem tiver um parente, inimigo ou afim a quem gostasse de ver carpir as lágrimas, faça já uma conta-poupança porque o esperam processos criminais em catadupa, e, sem uma boa defesa, jamais sairá impune. Digo mais, se for convidado a um cargo ou a uma função pública, contrate, antes do mais, um brilhante advogado-crime, porque vai, seguramente, precisar, dele. É que quanto mais alto for o voo mais abutres vai ter à espera que caia por terra. Porque coscuvilheiros legais parecem abutres, miram do alto, ouvem do alto, e cheira-lhes de longe a sangue. E um dia pode ser o nosso sangue. Pelo que, lamento, mas, ou há outras provas concretas, ou as escutas não me chegam para enforcar ninguém na praça pública.
Porque quem de entre nós nunca pensou alto numa boa desforra?
Eu, por mim, confesso que não há dia em que não me lembre de uma. E você, também não. Porque de "médico e de louco todos temos um pouco". Não é verdade?