quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

O palhaço de Mário Crespo

A juntar-se a um corpo de vozes em defesa de Mário Crespo veio hoje juntar-se a voz de um meu formando. Não fosse pela circunstância de ter o maior respeito pelos meus formandos e o assunto nem me daria mais que comentar. Mas dado que o primeiro artigo sobre o assunto adveio de um comentário do meu amigo Joffre, acho por bem referir igualmente os comentários das pessoas a que quero bem e que se pronunciam no sentido contrário. Até porque o Francisco Balsemão, presidente do grupo Impresa, recorde-se, já veio a público dizer que tinha "consideração" e "apreço" pelo jornalista da SIC. Ora, tenho de acrescentar que também tinha essa ideia do Mário, mas infelizmente o que escreveu dá azo a que se retirem as piores conclusões e uma delas é que o jornalista ultrapassou a fronteira do direito à opinião e chegou já ao desrespeito, à mal-criadez, portando-se em nada como um profissional da palavra e da escrita.
Posso até dizer que não sei o que se passa com o CDS. Primeiro, foi a Maria José Nogueira Pinto, que, na primeira audição da Comissão Parlamentar de Saúde, chamou «palhaço» ao socialista Ricardo Gonçalves. Escrevi, então, a propósito, lembrando-lhe que ela mais parecia um pierrot, que não deixa de ser uma espécie de palhaço triste. Digo o mesmo a propósito do Mário que publicou um artigo de opinião no DN em que aplica tais elogios a "alguém da nossa praça política" (conhecendo agora claramente a opinião do jornalista sobre Sócrates não há nada de mais fácil do que perceber claramente que é a este que aquele s refere).
Como os dois são pessoas extraordinariamente cultas, custa-me dizer-lhes que o palhaço nem sempre tem uma conotação tão prejurativa como lhe pretendem dar. E antes de se deixar, na íntegra, o tal artigozinho de Mário Crespo, deixo-vos com algumas frases e pensamentos célebres sobre o palhaço.
"Devemos visitar os bastidores de nossa alma, fantasiados de palhaço. Dessa forma, podemos sorrir de nossas falhas e tripudiar das inseguranças, atraindo-as para o nosso maior aliado: o picadeiro. É aqui, que as feras de orelhas enormes minguam ao som dos aplausos de Deus e dos nossos amigos." Augusto Vicente "Eu continuo sendo apenas um palhaço, o que já me coloca em nível bem mais alto do que o de qualquer político." Charles Chaplin "O palhaço não sou eu, mas sim esta sociedade monstruosamente cínica e tão ingenuamente inconsciente que joga ao jogo da seriedade para melhor esconder a loucura." Salvador Dali
Ou seja, Mário, às vezes até se pode elogiar com esta palavra. Querendo elogiá-lo, sempre lhe digo que quem afirma ser jornalista deveria poupar-se a estes impropérios, a não ser que tencione entrar na carreira política e já esteja em plena campanha.
14.Dez, DN: "O palhaço"
"O palhaço compra empresas de alta tecnologia em Puerto Rico por milhões, vende-as em Marrocos por uma caixa de robalos e fica com o troco. E diz que não fez nada. O palhaço compra acções não cotadas e num ano consegue que rendam 147,5 por cento. E acha bem.O palhaço escuta as conversas dos outros e diz que está a ser escutado. O palhaço é um mentiroso. O palhaço quer sempre maiorias. Absolutas. O palhaço é absoluto. O palhaço é quem nos faz abster. Ou votar em branco. Ou escrever no boletim de voto que não gostamos de palhaços. O palhaço coloca notícias nos jornais. O palhaço torna-nos descrentes. Um palhaço é igual a outro palhaço. E a outro. E são iguais entre si. O palhaço mete medo. Porque está em todo o lado. E ataca sempre que pode. E ataca sempre que o mandam. Sempre às escondidas. Seja a dar pontapés nas costas de agricultores de milho transgénico seja a desviar as atenções para os ruídos de fundo. Seja a instaurar processos. Seja a arquivar processos. Porque o palhaço é só ruído de fundo. Pagam-lhe para ser isso com fundos públicos. E ele vende-se por isso. Por qualquer preço. O palhaço é cobarde. É um cobarde impiedoso. É sempre desalmado quando espuma ofensas ou quando tapa a cara e ataca agricultores. Depois diz que não fez nada. Ou pede desculpa. O palhaço não tem vergonha. O palhaço está em comissões que tiram conclusões. Depois diz que não concluiu. E esconde-se atrás dos outros vociferando insultos. O palhaço porta-se como um labrego no Parlamento, como um boçal nos conselhos de administração e é grosseiro nas entrevistas. O palhaço está nas escolas a ensinar palhaçadas. E nos tribunais. Também. O palhaço não tem género. Por isso, para ele, o género não conta. Tem o género que o mandam ter. Ou que lhe convém. Por isso pode casar com qualquer género. E fingir que tem género. Ou que não o tem. O palhaço faz mal orçamentos. E depois rectifica-os. E diz que não dá dinheiro para desvarios. E depois dá. Porque o mandaram dar. E o palhaço cumpre. E o palhaço nacionaliza bancos e fica com o dinheiro dos depositantes. Mas deixa depositantes na rua. Sem dinheiro. A fazerem figura de palhaços pobres. O palhaço rouba. Dinheiro público. E quando se vê que roubou, quer que se diga que não roubou. Quer que se finja que não se viu nada.Depois diz que quem viu o insulta. Porque viu o que não devia ver.O palhaço é ruído de fundo que há-de acabar como todo o mal. Mas antes ainda vai viabilizar orçamentos e centros comerciais em cima de reservas da natureza, ocupar bancos e construir comboios que ninguém quer. Vai destruir estádios que construiu e que afinal ninguém queria. E vai fazer muito barulho com as suas pandeiretas digitais saracoteando-se em palhaçadas por comissões parlamentares, comarcas, ordens, jornais, gabinetes e presidências, conselhos e igrejas, escolas e asilos, roubando e violando porque acha que o pode fazer. Porque acha que é regimental e normal agredir violar e roubar.E com isto o palhaço tem vindo a crescer e a ocupar espaço e a perder cada vez mais vergonha. O palhaço é inimputável. Porque não lhe tem acontecido nada desde que conseguiu uma passagem administrativa ou aprendeu o inglês dos técnicos e se tornou político. Este é o país do palhaço. Nós é que estamos a mais. E continuaremos a mais enquanto o deixarmos cá estar. A escolha é simples.Ou nós, ou o palhaço."
Vou retorquir-lhe com estas palavras: "Mas que espécie vens tu a ser?....Sou um palhaço, ....e colecciono instantes. Adeus."Heinrich Böll