Falam a mesma língua, ou quase, estão ligados por uma história agitada e vêem, cada vez mais, a mesma televisão. Não se suportam, mas não podem viver uns sem os outros. Alemães e austríacos formam um dos mais espantosos pares de povos europeus.
Segundo Filip Gańczak a diferença entre um alemão e um austríaco é que o alemão quer compreender os austríacos, mas não consegue. Enquanto que o austríaco consegue compreender os alemães, mas não quer. Esta é apenas uma das muitas piadas que ilustram o ressentimento germanico-austríaco. A publicação, este ano, na Áustria do livro Streitbare Brüder (Os Irmãos Inimigos) relançou o debate sobre as relações abruptas entre os dois vizinhos.
“Quando alguém, no estrangeiro, me toma por alemão, é quase um insulto. Não me importo de ser de qualquer outro país, do Canadá, da Noruega, da República Checa ou do Chile, mas da Alemanha não”, ironiza o escritor austríaco Franzobel, que não poupa palavras quando fala dos seus vizinhos do Norte: “Não percebem as nossas piadas, levam tudo a sério, acham que têm sempre razão”. O diário alemão Bild, também não poupa os austríacos e fez uma lista de trinta razões para se rir deles. “A vossa bandeira é vermelha, branca, vermelha, para evitar que a usem ao contrário. Os austríacos célebres ou estão mortos ou emigraram, como Arnold Schwarzenegger.”
A oposição Áustria-Alemanha reflecte a antiga dicotomia Áustria-Prússia. O primeiro é um país católico tradicional, galante e amável. O segundo é um protestante rígido, arrogante, de um formalismo pretensioso a que se junta uma desagradável tendência para dar lições a toda a gente. Após a derrota nazi, a germanidade bateu em retirada.
No século XVIII, Frederico II tirou aos austríacos a quase totalidade da Silésia. Em 1866, durante a batalha de Sadowa, o exército de Guilherme I derrotou o exército imperial de Francisco José. Mas, após a Primeira Guerra Mundial e o fim do Império Austro-húngaro, os austríacos, condenados a viverem num pequeno Estado nas margens do Danúbio, desejaram a integração na Alemanha. Por isso, não é surpreendente que, apenas 20 anos depois, a grande maioria dos austríacos tenha acolhido com grande entusiasmo a anexação do seu país pelo Terceiro Reich (Anschluss). Pelo contrário, após a derrota dos nazis e a revelação dos seus crimes, a germanofilia batia em retirada. Os austríacos tentaram escapar à sua quota de responsabilidade na recente hecatombe, afirma Hannes Leidinger, co-autor de Streitbare Brüder. O país em reconstrução tratou de ser tornar neutral, as elites políticas, tal como os jornalistas vienenses, trabalharam afincadamente na construção do mito da Áustria primeira vítima de Hitler. Esqueceram-se do lugar onde tinha nascido o chefe do Terceiro Reich. O austríaco quer convencer o mundo de que Hitler era alemão e Beethoven austríaco. Os alemães estão-se nas tintas, diz outra das piadas sobre os vizinhos germanicos.
O semanário vienense Falter escreve, com ironia, que os alemães, que constituem a maior comunidade imigrante do país, depois dos turcos, são tão reticentes como estes últimos a integrarem-se na sociedade austríaca, porque recusam aprender a língua... De facto, o alemão em versão austríaca difere muito da língua dos habitantes de Berlim ou de Hanôver. O Palatschinken austríaco não é uma variedade de presunto [Schinken, em alemão], mas um crepe. A compota de ameixas, Pflaumenmus para os alemães, é aqui nomeada à eslava: Powidl. Depois da guerra, as autoridades de Viena tiveram o cuidado de se distinguirem linguisticamente do grande irmão do Norte. Em 1949, a língua alemã tinha desapareceu, enquanto tal, dos programas escolares austríacos. Claro que continuava a ser ensinada, mas chamava-se oficialmente “a língua de ensino”.
Dois povos condenados a suportarem-se. Hoje, o alemão austríaco perde cada vez mais as suas particularidades. A televisão por satélite e por cabo, afinal de contas, existe. Muitos austríacos preferem os canais alemães RTL ou SAT 1 à sua ORF. Os cantores alemães usam, sabiamente, a pronúncia standard, condição indispensável para a conquista do atraente mercado alemão.
“Férias na Áustria nunca mais!”, escrevia o Bild em 1994, depois do tenista alemão Michael Stich ter sido vaiado por um público austríaco. Mas o apelo ao boicote não funcionou. 40% dos turistas que visitam a Áustria vêm da Alemanha.
“Sem os turistas estrangeiros, a república alpina seria uma zona de crise económica”, reconhecem os autores do livro. O PIB austríaco, por habitante, (cerca de 46 mil dólares) é hoje superior ao da Alemanha (menos de 41 mil dólares). Já lá vai o tempo em que os austríacos iam à Alemanha comprar carros em segunda-mão. Hoje, são eles os mais ricos, e a economia austríaca foi menos atingida pela crise do que a alemã. Os irrequietos vizinhos podem arreliar-se mutuamente, à vontade, mas estão condenados a suportar-se um ao outro.
Segundo Filip Gańczak a diferença entre um alemão e um austríaco é que o alemão quer compreender os austríacos, mas não consegue. Enquanto que o austríaco consegue compreender os alemães, mas não quer. Esta é apenas uma das muitas piadas que ilustram o ressentimento germanico-austríaco. A publicação, este ano, na Áustria do livro Streitbare Brüder (Os Irmãos Inimigos) relançou o debate sobre as relações abruptas entre os dois vizinhos.
“Quando alguém, no estrangeiro, me toma por alemão, é quase um insulto. Não me importo de ser de qualquer outro país, do Canadá, da Noruega, da República Checa ou do Chile, mas da Alemanha não”, ironiza o escritor austríaco Franzobel, que não poupa palavras quando fala dos seus vizinhos do Norte: “Não percebem as nossas piadas, levam tudo a sério, acham que têm sempre razão”. O diário alemão Bild, também não poupa os austríacos e fez uma lista de trinta razões para se rir deles. “A vossa bandeira é vermelha, branca, vermelha, para evitar que a usem ao contrário. Os austríacos célebres ou estão mortos ou emigraram, como Arnold Schwarzenegger.”
A oposição Áustria-Alemanha reflecte a antiga dicotomia Áustria-Prússia. O primeiro é um país católico tradicional, galante e amável. O segundo é um protestante rígido, arrogante, de um formalismo pretensioso a que se junta uma desagradável tendência para dar lições a toda a gente. Após a derrota nazi, a germanidade bateu em retirada.
No século XVIII, Frederico II tirou aos austríacos a quase totalidade da Silésia. Em 1866, durante a batalha de Sadowa, o exército de Guilherme I derrotou o exército imperial de Francisco José. Mas, após a Primeira Guerra Mundial e o fim do Império Austro-húngaro, os austríacos, condenados a viverem num pequeno Estado nas margens do Danúbio, desejaram a integração na Alemanha. Por isso, não é surpreendente que, apenas 20 anos depois, a grande maioria dos austríacos tenha acolhido com grande entusiasmo a anexação do seu país pelo Terceiro Reich (Anschluss). Pelo contrário, após a derrota dos nazis e a revelação dos seus crimes, a germanofilia batia em retirada. Os austríacos tentaram escapar à sua quota de responsabilidade na recente hecatombe, afirma Hannes Leidinger, co-autor de Streitbare Brüder. O país em reconstrução tratou de ser tornar neutral, as elites políticas, tal como os jornalistas vienenses, trabalharam afincadamente na construção do mito da Áustria primeira vítima de Hitler. Esqueceram-se do lugar onde tinha nascido o chefe do Terceiro Reich. O austríaco quer convencer o mundo de que Hitler era alemão e Beethoven austríaco. Os alemães estão-se nas tintas, diz outra das piadas sobre os vizinhos germanicos.
O semanário vienense Falter escreve, com ironia, que os alemães, que constituem a maior comunidade imigrante do país, depois dos turcos, são tão reticentes como estes últimos a integrarem-se na sociedade austríaca, porque recusam aprender a língua... De facto, o alemão em versão austríaca difere muito da língua dos habitantes de Berlim ou de Hanôver. O Palatschinken austríaco não é uma variedade de presunto [Schinken, em alemão], mas um crepe. A compota de ameixas, Pflaumenmus para os alemães, é aqui nomeada à eslava: Powidl. Depois da guerra, as autoridades de Viena tiveram o cuidado de se distinguirem linguisticamente do grande irmão do Norte. Em 1949, a língua alemã tinha desapareceu, enquanto tal, dos programas escolares austríacos. Claro que continuava a ser ensinada, mas chamava-se oficialmente “a língua de ensino”.
Dois povos condenados a suportarem-se. Hoje, o alemão austríaco perde cada vez mais as suas particularidades. A televisão por satélite e por cabo, afinal de contas, existe. Muitos austríacos preferem os canais alemães RTL ou SAT 1 à sua ORF. Os cantores alemães usam, sabiamente, a pronúncia standard, condição indispensável para a conquista do atraente mercado alemão.
“Férias na Áustria nunca mais!”, escrevia o Bild em 1994, depois do tenista alemão Michael Stich ter sido vaiado por um público austríaco. Mas o apelo ao boicote não funcionou. 40% dos turistas que visitam a Áustria vêm da Alemanha.
“Sem os turistas estrangeiros, a república alpina seria uma zona de crise económica”, reconhecem os autores do livro. O PIB austríaco, por habitante, (cerca de 46 mil dólares) é hoje superior ao da Alemanha (menos de 41 mil dólares). Já lá vai o tempo em que os austríacos iam à Alemanha comprar carros em segunda-mão. Hoje, são eles os mais ricos, e a economia austríaca foi menos atingida pela crise do que a alemã. Os irrequietos vizinhos podem arreliar-se mutuamente, à vontade, mas estão condenados a suportar-se um ao outro.