terça-feira, 1 de junho de 2010

DE QUE VALEM AS UTOPIAS?

Comprometi-me a escrever semanalmente para o Jornal Alpiarcense, a convite do António Centeio. A páginas tantas desafia-me a falar sobre Maçonaria. Creio que o tema gerou polémica e que se acenderam alguns ânimos. É normal.
Amiúde, os que não se vergam ao status quo são acusados de utópicos. Como os maçons. Fiz um interregno sobre a explicação do que se pretende com a criação de um exército de homens de bem e com valores de tolerância. Mas é difícil para um maçon afastar-se, no seu dia a dia, dessa força motriz que o impele para se tornar uma coluna de uma sociedade melhor. Alguns uma coluna jónica. Sendo maçon português, o ímpeto é ainda mais violento, porque se lhe junta a força da massa atlântica, do povo que foi para além do Bojador. Sonhar é um saudosismo que nos assola até pela mera circunstância de termos e de sermos (e de contermos em nós) o Atlântico. Há quem afirme que foi um português que falou a Thomas More pela primeira vez dessa quimera: da Utopia. E são as crises, como íngremes ondas do Atlântico, que nos obrigam a repensar no sonho de “um não lugar, lugar que não existe”, aquela Utopia.
Thomas More admirava Platão e tirou a inspiração para A Utopia da República. Mas a República vem-nos crescentemente desencantando e voltamos, por sobrevivência, à força atlântica e ao sonho da Utopia. Uma sociedade justa que se regia por escassas leis. Em que as riquezas eram distribuídas e repartidas equitativamente. Em que se criticavam o orgulho e a vaidade, o nervo do luxo supérfluo. Diz-se que todos os países do mundo adotariam o regime de Utopia se não fosse o orgulho, “esse pai de todas as pestes”. Utopia não tinha dinheiro. O bem individual era submetido ao bem geral. A guerra era motivo de vergonha e só era usada quando necessária (até os zapoletas, de uma nação vizinha, que viviam para a guerra e eram semi selvagens, eram treinados com o objectivo único de defender a República em caso de guerra. Mas mantinham-se espiritualmente pacíficos). More levantou o seu protesto com os olhos postos nas injustiças da Inglaterra de Henrique VIII. Para isso atacou a monarquia e as instituições, a vida de luxos inúteis à conta do trabalho de outros. Inspirou-se em Platão e depois vieram anarquistas e comunistas e inspiraram-se nele.
Crescem os conflitos e não temos a certeza de que deles emergirá a utopia de uma sociedade melhor, mais igualitária e mais segura, com que métodos e com que meios, e em que zona “entre o realizável e o impossível», parafraseando B. Sousa Santos (2000), haverá espaço para a Utopia. Contudo, até pela crise, há que continuar a crer na Utopia, no seu sentido positivo, como uma necessidade vital para qualquer ser humano e para qualquer sociedade. Porque sem a Utopia pode perder-se o presente e o sentido do futuro. No princípio do terceiro milénio, impõe-se focar sinergias, equacionar novas relações sociais e apelar a estratégias políticas adequadas que diminuíam as assimetrias e todas as formas conhecidas de exclusão social. Essa dimensão legítima, enraizada no sentido de crise insolúvel, é a aposta numa educação para a tolerância, para a paz, contra a guerra e contra todas as formas de violência. A primeira é absolutamente necessária para evitar a violência e enquanto não for assimilada, as vozes pela tolerância e pela capacidade de coabitação comum, não terão eco sociológico, mesmo que se tenha de fazer falar o silêncio por uma «sociologia das ausências» (B. Sousa Santos (2000).
Até lá, esta não é uma sociedade verdadeiramente democrática e igualitária. Nem sabemos se será o projecto de uma. Resta a Utopia. Mas se lhes juntarmos o empenho e a determinação atlântica, ficará mais perto aquela tão desejada nova sociedade, livre de injustiças e exclusões sociais.
E faço minhas as palavras de Luther King: “I have a dream...”
E isto, creiam, tem muito a ver com Maçonaria.