O escritor curitibano Dalton Trevisan, 86 anos, é o vencedor da 24.ª edição do Prêmio Camões. descrição de um amigo: “Seu nome: Dalton Trevisan. Seu instrumento de trabalho: o conto. Sua vítima: o leitor incauto. Sua meta: amedrontar, deliciando. Sua cara: pouco veiculada. Seu endereço: desconhecido. Seu diálogo com o público: um monólogo interior. Sua foto mais conhecida: a tirada por um repórter com teleobjetiva atrás de uma árvore emuma tarde de outono. Seu número de telefone: nem mesmo sua família sabe.” O primeiro livro que dele li, A Guerra Conjugal (1969), marcou-me. descobri originalidade, estilo, enredo, análise das almas e das situações, a aparente simplicidade de todos os personagens se chamarem João e Maria... espantou-me. O autor é assim como que o Clausewitz da guerra conjugal e o seu livro a versão caseira de Vom Kriege. "Porque intramuros, como no mundo dos generais, cada um tem a sua estratégia, e a guerra ou a guerrilha, a luta de trincheiras, o bombardeamento, o corpo-a-corpo, podem começar por um nada. Um esquecimento, uma tolice, um desarrumo..." dizem.
Aqui fica um pequeno trecho de “Apelo”: "Amanhã faz um mês, ai não, a Senhora longe de casa. Primeiro dia, na verdade, falta não senti. Bom chegar tarde, esquecido na conversa de esquina. Não foi ausência por uma semana: o batom ainda no lenço, o prato na mesa por engano, a imagem de relance no espelho. Com os dias, Senhora, o leite primeiro vez coalhou. A notícia de sua perda veio aos poucos: a pilha de jornais ali no chão, ninguém os guardou debaixo da escada. Toda a casa um corredor vazio, até o canário ficou mudo. Não dar parte de fraco, ah, Senhora, fui beber com os amigos. Uma hora da noite eles se iam. Ficava só, onde o perdão de sua presença, última luz na varanda, a todas as aflições do dia? Sentia falta da pequena briga pelo sal no tomate – meu jeito de querer bem. Acaso é saudade, Senhora? Às suas violetas, na janela, não poupei água e elas murcharam. Não tenho botão na camisa. Calço a meia furada. Que fim levou o saca-rolha? Nem um de nós sabe, sem a Senhora, conversar com os outros: bocas raivosas mastigando. Venha pra casa, Senhora, por favor""