Com as eleições de 6 de maio ficou evidente a linha de rutura
entre a elite do poder e os cidadãos. Talvez porque parte substancial dos
primeiros vive num mundo que não é de parte substancial dos segundos. Fala-se
de "viragem à esquerda" e "novo rumo para a Europa". Para
manter de pé o sonho europeu há que abandonar o
fundamentalismo do rigor cultivado (carinhosamente) pelas elites e encetar
novas perspetivas de solidariedade e de integração verdadeiramente protetores
dos cidadãos. A Europa é hoje um feudo encrustado de interesses de elites,
alheada dos interesses dos cidadãos. O que este superdomingo revelou foi uma
consciência inesperada de que a rutura pode ser o caminho para uma nova união (possível).
O que não é, ainda, um plebiscito
negativo, é, sem dúvida, um alerta convicto. Circula, na Europa, uma petição a
que chamam “da ingenuidade” cujo mote é - “Não perguntem o que é que a
Europa pode fazer por vós, mas sim o que é que vocês podem fazer pela Europa”.
Está assinada por um grupo de intelectuais europeus. Parte destes indaga-se “Quanto
tempo mais?” tem a ditadura de Angela Merkel, que vai ficando com a sua tropa
enfraquecida na Europa e se prepara para mais um revés eleitoral nas eleições
da Renânia do Norte-Vestefália, a 13 de maio. À esquerda ou à direita, o que
importa aos cidadãos é, primeiro, a sobrevivência à Troika, e, depois, o
retorno possível (nada será como dantes!) à qualidade de vida que entendem como
“mínima”.
Em
Dezembro, Pedro Nuno Santos (então "vice" da bancada parlamentar do
PS) disse "estou-me a marimbar para os credores", o que suscitou a
indignação de algumas pseudo-virgens conformadas com a ditadura da abstenção
violenta socialista. Dizer, na altura, que Portugal devia exigir outras
condições no pagamento “arrepiou” a (in)disciplinada (por dentro, felizmente,
vai havendo alguns indisciplinados – há esperança para o PS?) bancada
parlamentar. Hoje, depois de domingo, soou o alarme com Soares a defender que o
PS deve desvincular-se do acordo com a troika e o País "rasgá-lo". E
António José Seguro lá vai falando conforme os outros vão falando, em jeito de
boleia. Talvez sim, talvez não, ou nem por isso, diz.
Esta falta
de oposição e esta incapacidade de lutar pelos direitos dos cidadãos (trauma da
Europa que provocou o resultado eleitoral da França) é notória (tristemente),
com as consequências da proposta de lei 46/XII, aprovada a 02 de fevereiro em
Conselho de Ministros, entrada no Parlamento a 09
de fevereiro – o novo Código de Trabalho - e acabadinha de aprovar com
os votos do PSD e CDS. O PS absteve-se. Ribeiro e Castro, do CDS, e 9 deputados
do PS votaram contra. Depois de ter ouvido Jorge
Miranda dizer que os deputados estão “domesticados”, afirmação que corroboro na
sua infeliz generalidade, e que obedecem aos “diretórios políticos”, sem
pestanejar, sob pena de a cadeira lhes deixar de servir de assento, renasceu a
esperança quando vi Paulo Campos, Sérgio Sousa Pinto, Isabel
Moreira, Isabel Santos, Renato Sampaio, André Figueiredo, Carlos Enes, Pedro
Delgado Alves (o jota socialista que recomendou
ao Presidente da República que retire a estátua da República depois da maioria
aprovar no código do trabalho o fim do cinco de Outubro, o dia em que se
comemora a implantação da República) e Rui Santos votarem contra.
Políticos castrados, não!
O novo
Código do Trabalho contém alterações à atual
legislação laboral, e, desta nova golpada nos direitos sociais não destaco nem
a questão dos feriados, nem a duração das férias, nem as “pontes”, mas a
alteração na relação com a inspeção do trabalho (as empresas deixam de estar obrigadas
a enviar à Autoridade para as Condições do Trabalho o mapa de horário ou o
acordo de isenção de horário), o conjunto de novas regras que servem de base para
o despedimento (a dispensa por inadaptação passa a ter critérios subjetivos e
fica dependente da avaliação de produtividade e qualidade do trabalhador), o
“preço” do trabalho suplementar (reduzido para metade: na primeira hora extra, um
acréscimo de 25 por cento (contra os atuais 50 por cento) e de 37,5 por cento
nas horas seguintes (contra os atuais 70 por cento) e, no trabalho suplementar
ao fim de semana ou feriado, 50 por cento, contra os atuais 100 por cento); a
compensação do trabalho extraordinário (que deixa de dar direito a descanso compensatório,
que atualmente representa 25 por cento de cada hora de trabalho suplementar (15
minutos)); a criação de um banco de horas (após negociação, por proposta
escrita, ou, se o trabalhador não responder a essa proposta, ao fim de 14 dias,
tacitamente aceite) e, por fim, a alteração de critérios de extinção do posto
de trabalho (com o funcionário mais novo a desocupar a linha da frente do
despedimento e a permissão da aplicação de critérios arbitrários pela empresa que
decide quem dispensa e deixa de ter a obrigação de procurar um posto de
trabalho compatível com o trabalhador antes de o despedir). Isto, a par, do que espera os trabalhadores
da Função Pública com a mobilidade geográfica forçada alargada, a mobilidade
interna temporária com unidades orgânicas desconcentradas e o despedimento
por acordo, faz prever “sangue”. Isto é que vai ser perseguição legitima
e legitimada!
A modos
que chegou a hora de dizer às elites que nos governam: "Vocês são indivíduos tristes e isolados,
vocês estão falidos, o vosso papel acabou. Vão para onde vocês pertencem a
partir de agora - para a lixeira da história!" (Leon Trotsky). Que a hora é dos cidadãos!