Elucidativo o apontamento de Jaime Freire (escritor (Nov. de 2011) | InVerbis | 26-11-2011) "Os Senhores da Anomia".
Começa o seu raciocínio a partir da violência das medidas enunciadas na Proposta de Lei do Orçamento do Estado para 2012, a mando da Troika, e a propósito do tão falado "Estado de Necessidade", e critica que ninguém da «sociedade do espectáculo» tenha vindo a público esclarecer o que é isto do "Estado de Necessidade".
Pelo que explica "Imaginem uma zona chamada Notstand, uma «terra de ninguém» situada algures entre as esferas do direito e da política favorável à invasão da tirania e ao ressurgimento da hidra da Excepção. Na ficção das coisas, a Excepção parte da própria Constituição, mas na realidade (no imaginado far west sem simulacros) a hidra emerge do indistinto e brumoso pântano do Estado de Necessidade. Após a ocupação deste território selvagem, os poderosos invasores, a coberto do Estado de Necessidade ou, o que agora é o mesmo, do Estado de Emergência Financeira, agem politicamente através de decretos de urgência com força de lei violadores da velha (e arcaica) Constituição. Modo de actuar que desvenda a decisão normativa do Estado de Excepção sobre a estranha e indiferente (inter)zona de anomia."
E continua chamando à colação o pensador italiano Giorgio Agamben, cujo «passo na floresta» segue desconstruindo neste pequeno texto, e que "define anomia na sua obra Estado de Excepção (Stato di Eccezione). Trata-se de um fenómeno essencialmente político que acontece numa ordem que (já) não é jurídica. O Estado de Excepção aparece como a inclusão e a captura de um espaço que não está fora nem dentro do Direito. Nas palavras do filósofo, «O Estado de Excepção é um espaço anómico, no qual está em jogo uma força-de-lei sem lei», força que é «uma fictio através da qual o direito procura anexar a própria anomia»."
"Isto é, ao incluir a anomia na Lei os Senhores Absolutos da zona exterior legitimam o advento da violência soberana que suspende selvaticamente o Direito, transcendendo-o. Doravante, é a Necessidade que dita, ou diz, o direito positivo através da violência soberana sem lei.
E desta vez na história, na nossa sociedade desenvolvida e pós-moderna (segundo o mito), nem foi necessário os representantes dos alienígenas declararem formalmente o iustitium para a decisão acontecer, ou se manifestar de forma impiedosa. A essência da ordem antes estabelecida, filha da era das luzes, feneceu perante o charivari (a mascarada) neoliberal do declínio do Ocidente como um boneco de neve no solstício de Verão.
Assim, na desencantada situação artificial em que nos encontramos como avatares do nada, abertos depois do colapso dos gigantes os portões do Inferno, que afinal a Constituição também abraça com paixão, pelo campo dos abandonados andando vem o terror anómico."
Conclui "Em nome de uma dívida infinda, andando vem o terror anómico."
A falta de ordem na desordem é uma consequência e não uma causa, digo eu.