domingo, 5 de dezembro de 2010

A "oportuna" evocação de Sá Carneiro e o nascimento de uma coligação (do tipo) AD

O DN Opinião traz um artigo que suscita a nossa reflexão. Basicamente, creio que, a cada 4 de Dez, há os que mexem oportunamente nas reminiscências do trágico episódio de Camarate. E não lhe chamo acidente, pela razão de que não acredito que o tenha sido. Mais, acredito mesmo na tese do atentado. Raros foram os atentados realizados à revelia do grupo que rodeava a vítima. Basta pensar no regicídio republicano, para dar um exemplo da nossa História. Este aproveitamento estratégico da máquina laranja surge com maior vigor quando as circunstâncias o aconselham. Mais uma vez o marketing bem ensaiado impõe que PSD e CDS-PP se juntem à volta de uma causa comum: a memória de Sá Carneiro e de Adelino Amaro da Costa. E devia ser isso mesmo e ponto. Mas não é. A evocação de ambos aparece quando o barómetro eleitoral aponta as chances do PSD ganhar as próximas eleições, tendo já dito Pedro Passos Coelho que não pretende (des)governar sózinho, acenando as boas-vindas a uma aliança estratégica como PP. Por isso - e para a grande maioria dos militantes dos dois partidos, a começar pelas respectivas "jotas" que nem conhecem a história dos lideres homenageados, só por isso - se viu, lado a lado, pela primeira vez, os dois líderes daqueles que foram os partidos protagonistas da "mais bem-sucedida experiência de coligação da democracia". Juntos para a fotografia, a falar direitinho a quem recorda, sobretudo, Sá Carneiro, os líderes de hoje do PSD e do CDS prepararam-se para ouvir dois históricos da Aliança Democrática, António Capucho e Cruz Vilaça, num claro apelo à reedição dessa histórica coligação. Invocando precisamente o momento histórico, como o evocaram há 31 anos. Passos e Portas não podiam ter sido, por fim, mais claros. A coligação vai acontecer. Por eles, pelo menos. (se Portas lidera com pulso o PP já o mesmo não se pode dizer de Passos, e esta é uma diferença que convém não esquecer). Há quem considere que existe mérito em admitir, neste preciso momento, uma coligação, já que as experiências anteriores revelaram que existem riscos inerentes ao projecto. "Conhece-os bem Paulo Portas, porque foi personagem principal nas últimas duas tentativas de refazer a AD, duas tentativas com finais diferentes e métodos opostos. A primeira foi com Marcelo Rebelo de Sousa, logo em 1997, quando a era de António Guterres ainda ia no adro. Era, a muitos níveis, um projecto idêntico ao original: propunha-se a ir a eleições em listas conjuntas, com um único projecto. A ideia, porém, começou tão cedo - tão antes da ida às urnas - que acabou por nem chegar lá, arruinada por uma vichyssoise mal contada (e potenciada pelas características dos dois líderes). A segunda tentativa de reedição foi com Durão Barroso, e feita ao contrário, só depois de eleições onde os partidos concorreram separados. Foi uma aliança de conveniência prática (Barroso precisava de uma maioria na AR que lhe desse estabilidade política), e não programática. Teve vários obstáculos e durou bastante, só fragilizada três anos mais tarde, quando Santana Lopes tomou conta do PSD e do Governo - e apenas derrubada pela dissolução da Assembleia, decidida por Jorge Sampaio. "
Estes dois projectos nada tiveram de ideológicos e tudo tiveram de oportunistas (no sentido de "agarrar" a oportunidade) e, por isso e porque os lideres eram incomparavelmente distantes das figuras de Sá Carneiro e de Amaro da Costa, não deixaram ponta de saudade. O primeiro porque morreu antes de nascer; o segundo porque faleceu no seu próprio desnorte, pela ausência de um verdadeiro projecto comum. Daqui deveriam Passos e Portas retirar lições. A sua parceria apenas será levada a bom termo se a sede de poder do PSD lhe permitir sequer equacionar dividi-lo. Se, agora, a construção de um governo-sombra dentro da elite mais elevada provocou uma autêntica acção (em rigor, várias acções ) de guerrilha interna, imagine-se o que acontecerá quando tiver de agradar a gregos e troianos (todos no mesmo partido) para formar um governo real. O povo sempre os advertiria - se algum com ele se preocupasse ou ouvisse - de que quem vai com muita sede ao pote ... Ou, não estando minimamente virados para ouvir o "povo", senão quando ele se chega à boca das urnas, sugere-se que se lembrem da célebre frase de Heráclito, de que ninguém se pode banhar duas vezes no mesmo rio. Seria recomendável, para seu próprio proveito, que se lembrassem que os tempos são outros e que os projectos, na vida como na política, nunca se repetem da mesma forma. Mas pode até acontecer que por não se lembrarem das lições dos seus fundadores que o "povo" acabe por ganhar com isso. E, voltando às expressões populares, os faça morrer na praia.... Porque para este "povo" a praia é agora uma metáfora fulcral para o País: é o Futuro!