O presidente do Tribunal de Contas apresentou as suas críticas e exigiu ser ouvido pelo Parlamento a propósito da proposta do Orçamento do Estado para 2011, que contempla uma norma que, na sua opinião, "desresponsabiliza" financeiramente os titulares de órgãos autárquicos pelos seus actos de gestão. Trata-se da alteração ao artigo 61.º da Lei de Organização e Processo do TC que equipara, para efeitos de responsabilidade financeira, "os titulares dos órgãos das autarquias locais aos membros do Governo". Segundo Guilherme de Oliveira Martins, a norma é incoerente já que as câmaras municipais e as juntas de freguesias são órgãos que prestam contas e que a consequência directa da eventual aprovação da alteração será a ausência da efectiva responsabilização financeira dos titulares de órgãos autárquicos e a perversão do sistema de responsabilização financeira, para além de que obrigará a rever o quadro de competências dos órgãos dos municípios e freguesias, "sob pena de disfuncionalidade de todo o sistema".
A Associação Nacional de Municípios defende, através do seu presidente, que não se trata de "desresponsabilizar" os autarcas pelas suas decisões, mas sim de que os autarcas só respondam quando tomem decisões contrárias a pareceres fundamentados, supostamente vindos dos técnicos dos serviços autárquicos.
Não me vou pronunciar sobre a forma estratificada e fortemente hierarquizada do TC nem sobre a inabilidade, uma vezes, e a impossibilidade, outras, de recolha de prova pelos auditores no terreno - que, na generalidade dos casos, resulta no arquivamento dos processos em sede de apreciação da culpa pelo Ministério Público - nem sequer me pronuncio sobre as sanções incompreensivelmente baixas na proporção dos ilícitos praticados ou na possibilidade de pagamento voluntário das coimas por quantia irrisória.
Do alto do seu estamine, os preconizadores da medida ou contornam uma questão nuclear, conhecendo-a, ou simplesmente esquecem-na, por desconhecimento: quem fará os tais “pareceres” fundamentados que justificarão os actos dos autarcas e os desresponsabilizarão. Primeiro, como consultora na área da contratação pública, conheço algumas autarquias, e sei que, muitas delas, não têm pessoal técnico apetrechado dos conhecimentos para fazer um trabalho que seja uma “espécie” de parecer – razão porque são os consultores externos (lembrando que poucos advogados, à excepção dos conhecidos consultórios de especialistas em Direito Público, dominam o acervo de legislação administrativa e autárquica a que acresce a complexidade do Código dos Contratos Públicos) a elaborar tais pareceres. Já se adivinha a pressão para se escrever isto ou aquilo consoante o fim que se pretenda – o que presume que primeiro se conheça a conclusão querida e só depois se teça o raciocínio, num enviesado que vai do silogismo para a premissa – o que nem me perturba tanto como isso, desde que o se queira praticar seja um acto lícito e de interesse para a autarquia. Mas para o consultor externo nem é assim tão grave, já que tem liberdade para expor várias soluções e discutir com independência técnica as questões perante os responsáveis. Fico a pensar é naquelas autarquias em que existem técnicos a quem vai ser “encomendado” um parecer para sufragar esta ou aquela decisão e na pressão que sobre os mesmos será feita para produzirem um trabalho que legitime decisões nem sempre defensáveis à luz do Direito, a par do dever de acatar ordens e, nalguns casos, do temor reverencial, acompanhada das consequências de não fazerem o jeito às chefias, ou de, fazendo-o, e, havendo responsabilidade civil extracontratual e disciplinar sobre o acto praticado, sobre eles recair direito de regresso e processo disciplinar em conformidade.
O que me suscita uma constatação: atendendo ao número de técnicos autárquicos superiores e ao ainda menor número que detém massa critica ou liberdade para contrapor soluções e questionar ordens, a aplicação da norma agora proposta no OE pode vir a ter um efeito pernicioso – a criação de um segmento especifico de funcionários sobrecarregados e sobre os quais hão-de recair pressões e responsabilidades acrescidas. E que são dos piores pagos na Administração Pública. É como dizia Calimero: é uma injustiça!
A Associação Nacional de Municípios defende, através do seu presidente, que não se trata de "desresponsabilizar" os autarcas pelas suas decisões, mas sim de que os autarcas só respondam quando tomem decisões contrárias a pareceres fundamentados, supostamente vindos dos técnicos dos serviços autárquicos.
Não me vou pronunciar sobre a forma estratificada e fortemente hierarquizada do TC nem sobre a inabilidade, uma vezes, e a impossibilidade, outras, de recolha de prova pelos auditores no terreno - que, na generalidade dos casos, resulta no arquivamento dos processos em sede de apreciação da culpa pelo Ministério Público - nem sequer me pronuncio sobre as sanções incompreensivelmente baixas na proporção dos ilícitos praticados ou na possibilidade de pagamento voluntário das coimas por quantia irrisória.
Do alto do seu estamine, os preconizadores da medida ou contornam uma questão nuclear, conhecendo-a, ou simplesmente esquecem-na, por desconhecimento: quem fará os tais “pareceres” fundamentados que justificarão os actos dos autarcas e os desresponsabilizarão. Primeiro, como consultora na área da contratação pública, conheço algumas autarquias, e sei que, muitas delas, não têm pessoal técnico apetrechado dos conhecimentos para fazer um trabalho que seja uma “espécie” de parecer – razão porque são os consultores externos (lembrando que poucos advogados, à excepção dos conhecidos consultórios de especialistas em Direito Público, dominam o acervo de legislação administrativa e autárquica a que acresce a complexidade do Código dos Contratos Públicos) a elaborar tais pareceres. Já se adivinha a pressão para se escrever isto ou aquilo consoante o fim que se pretenda – o que presume que primeiro se conheça a conclusão querida e só depois se teça o raciocínio, num enviesado que vai do silogismo para a premissa – o que nem me perturba tanto como isso, desde que o se queira praticar seja um acto lícito e de interesse para a autarquia. Mas para o consultor externo nem é assim tão grave, já que tem liberdade para expor várias soluções e discutir com independência técnica as questões perante os responsáveis. Fico a pensar é naquelas autarquias em que existem técnicos a quem vai ser “encomendado” um parecer para sufragar esta ou aquela decisão e na pressão que sobre os mesmos será feita para produzirem um trabalho que legitime decisões nem sempre defensáveis à luz do Direito, a par do dever de acatar ordens e, nalguns casos, do temor reverencial, acompanhada das consequências de não fazerem o jeito às chefias, ou de, fazendo-o, e, havendo responsabilidade civil extracontratual e disciplinar sobre o acto praticado, sobre eles recair direito de regresso e processo disciplinar em conformidade.
O que me suscita uma constatação: atendendo ao número de técnicos autárquicos superiores e ao ainda menor número que detém massa critica ou liberdade para contrapor soluções e questionar ordens, a aplicação da norma agora proposta no OE pode vir a ter um efeito pernicioso – a criação de um segmento especifico de funcionários sobrecarregados e sobre os quais hão-de recair pressões e responsabilidades acrescidas. E que são dos piores pagos na Administração Pública. É como dizia Calimero: é uma injustiça!