domingo, 27 de fevereiro de 2011

"IRMÃO, IRMÃOS" de CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE


Não resisto a partilhar convosco um poema quase desconhecido.
"Irmão, Irmãos Cada irmão é diferente. Sozinho acoplado a outros sozinhos.
A linguagem sobe escadas, do mais moço, ao mais velho e seu castelo de importância.
A linguagem desce escadas, do mais velho ao mísero caçula.
São seis ou são seiscentas distâncias que se cruzam, se dilatam no gesto, no calar, no pensamento? Que léguas de um a outro irmão.
Entretanto, o campo aberto, os mesmos copos, o mesmo vinhático das camas iguais.
A casa é a mesma. Igual, vista por olhos diferentes?
São estranhos próximos, atentos à área de domínio, indevassáveis.
Guardar o seu segredo, sua alma, seus objectos de toalete. Ninguém ouse indevida cópia de outra vida. Ser irmão é ser o quê? Uma presença a decifrar mais tarde, com saudade?
Com saudade de quê? De uma pueril vontade de ser irmão futuro, antigo e sempre? "
Carlos Drummond de Andrade, in 'Boitempo'