domingo, 30 de janeiro de 2011

O ESTADO (DE RASTOS) DA JUSTIÇA


O estado da Justiça em Portugal está, de há muito e não como muitos pretendem fazer crer, uma lástima.
Nuno Rogeiro vem chamar a atenção de que há lugares próprios, num Estado de direito, para se julgar a mentira da verdade, ou a verdade da mentira: os tribunais. E não, como se constata, “a intoxicação da “opinião pública” e a tentativa de usar os cidadãos, a sua massa, ou grupos determinados, para pressionar a Justiça nas suas várias instâncias, do julgamento ao recurso.”
Fala-nos do caso de Carlos Castro, que passou cheio de “especulação e romance negro, muitas vezes com intenções determinadas de desculpa e ataque.” Igualmente, assim aconteceu nos já frequentes “incidentes em torno da “verdade” de um réu condenado em primeira instância, no caso dito “Casa Pia”. Os acusados foram longamente ouvidos por magistrados de instrução, juristas de formação, antes do julgamento. Não em segredo, numa cela húmida e escura, sob a ameaça de tortura de verdugos boçais, mas com garantias (há quem chegue a dizê-las excessivas), e na presença de múltiplos advogados. Houve acareações, todo o tipo de requerimentos, e possibilidades inúmeras de contraditório, impugnação, contestação, contra-interrogatório, desmontagem de falsidades, argumentos falaciosos ou armadilhas. Qualquer causídico que ouvisse um depoente - testemunha, arrependido ou réu - vir dizer, depois deste enredo processual paquidérmico, tão custoso para o erário público (e para a paciência de todos), que afinal inventou, mentiu ou foi forçado a mentir, devia sentir-se ofendido e insultado, ou agir com frieza e distância. Não se compreende o entusiasmo e o elogio, incompreensível mesmo numa sociedade que fosse tribal e primária.”
Nesta semana, um novo procurador assumiu o inquérito a suspeitas de corrupção no negócio dos submarinos, no pressuposto (público) de que as procuradoras que deixaram investigação terão posto em causa a imagem da justiça, como alega o instrutor do processo disciplinar. Correm os processos disciplinares das procuradores Auristela Pereira e Carla Dias, que, ao que afirma o inspector do Ministério Público que conduziu o inquérito, terão violado os seus deveres ao porem em causa a imagem global e a imparcialidade da justiça, com base numa relação amorosa mantida entre Carla Dias e o presidente da Inteli, que foi perito durante três meses na investigação à compra dos submergíveis e indicou os peritos no processo das contrapartidas.
Confesso que desde que, por alturas do meu divórcio, foi dado como aceite que a sentença era ditada pelo alcance monetário do “meu falecido” até uns anos passados num tribunal, estou desiludida com a (in)justiça. E não se vêem melhoras, antes pelo contrário. Os juízes assumiram um protagonismo negativo na praça pública, mais parecendo actores – e até às vezes jornalistas – do cenário judiciário. Seria bom que se revessem as regras de acesso à carreira de juiz que exige cinco anos de prática. Quem é que, de entre os melhores alunos, seja de que faculdade for, ao fim de cinco anos, arrisca uma carreira em ascensão, para começar do 0, num sistema que, entretanto, já descobriu não ser propriamente a “Alice no País das Maravilhas”? Restam pois os “desempregados” ou “mal sucedidos” na carreira da advocacia ou os desconhecedores do funcionamento da máquina judiciária. E é por aqui, precisamente, pela base, ou seja, pelas regras de acesso, que tudo deve ser revisto.
“Roma e Pavia não se fizeram num dia”, mas algum dia tem de ser o primeiro a marcar outro rumo.